terça-feira, março 29, 2016

ESTÓRIAS DA HISTÓRIA: O fim do Império Otomano, I - Do auge até à chegada da eletricidade

E muito conhecido o aforismo de Santayana, que lembra o risco de se repetir o passado àqueles que o esquecem. Porque a Turquia está a desempenhar um papel determinante na Europa atual, quer quanto aos refugiados, quer quanto ao terrorismo do Daesh - e em ambos os casos de forma mais do que censurável!  -, importa olhar para a estratégia do seu presidente, Erdogan, à luz do que foi o passado otomano. É que recorrendo à religião, ele não enjeita a possibilidade de liderar um novo Califado, seja o que foi anunciado pelos seus aliados no combate a Assad na Síria, e agora derrotados em Palmira, seja o que ele desejaria recriar se tivesse engenho e arte para ser proclamado líder de todo o mundo muçulmano.
O auge do Império Otomano aconteceu em 1529, quando o avanço para ocidente estacou às portas de Viena apesar do cerco duríssimo a que a sujeitou. Dominando todos os Balcãs, a Arménia e o Norte de África, o sultão de Istambul liderava uma das grandes potências de então. E até se elogiava a relativa tolerância que os cristãos arménios, os cristãos ortodoxos e os judeus então gozavam, o que não era tanto assim já que existiam discriminações nos impostos, pagando muito mais do que os de confissão islâmica, e estando impedidos de qualquer proselitismo.
A Revolução Francesa abalou seriamente os alicerces do Império ao fornecer argumentos para que muitos dos povos oprimidos nas suas fronteiras exigissem a sua autonomia, se não mesmo a independência. Os gregos foram os primeiros a adotar a luta armada, mas logo serviram de exemplo a todos os católicos da Península Balcânica, que contaram com o apoio da Inglaterra, da França e da Rússia.
Todas essas potências defendiam os seus interesses específicos com a assunção de tal apoio: os russos queriam uma saída para o Mediterrâneo e a Inglaterra prezava o domínio naval no mesmo mar.
Em 1829, depois de uma guerra dura e prolongada, os gregos alcançaram a independência, enquanto a Sérvia e a Roménia viram reconhecidas as respetivas autonomias.
Em 1839 Abd-ul-Medjid I sucedeu ao pai na liderança do Império e levou por diante políticas progressistas, que reconheciam a igualdade de direitos e deveres de todos os cidadãos otomanos independentemente das suas crenças religiosas. Mas já apareceu tarde, porque todos os povos começavam a organizar-se em função da sua língua e credo.
As intenções do sultão desfizeram-se quando, em 1875, os sérvios e os bósnios, maioritariamente católicos, revoltaram-se contra os latifundiários, quase todos muçulmanos, sofrendo uma repressão brutal, ativamente criticada pelas potências europeias.
Pressentindo os efeitos dessa campanha antiturca os militares fazem um golpe militar e depuseram o sultão, substituindo-o pelo irmão Mourad. Mas a doença impediu-o de cumprir as suas responsabilidades e foi Abdulhamid II  o empossado poucos meses depois, comprometendo-se com a aprovação de uma nova Constituição de cunho liberal, que criasse um parlamento e respeitasse a igualdade entre todos os cidadãos do Império.
As ilusões pouco duraram, porquanto a Rússia declara guerra em nome da sua condição de protetora dos povos eslavos. Em poucas semanas a vitória militar foi avassaladora e a Turquia foi espoliada de alguns dos seus territórios no Tratado de Berlim, onde as grandes nações europeias dividiram os despojos dos derrotados: a Sérvia, o Montenegro, a Roménia e a Bulgária ganharam a independência e a Bósnia-Herzegovina foi acolhida pela Áustria.
A espoliação humilhante de parte do Império convenceu Abdulhamid a acabar com a legislação liberal, assumindo-se como um déspota iluminado, que apostou na saúde, na educação e na eletricidade.

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