sexta-feira, fevereiro 29, 2008

Lay Lady Lay, Bob Dylan

Esta canção já corresponde à fase em que Bob Dylan deixou para trás a sua fase folk, que parecia torná-lo no herdeiro natural de Woody Guthrie e de Pete Seeger, para se assumir como o individualista descomprometido avesso a qualquer causa.
Ideologicamente é-me antipática esta fase.Mas este tema é extremamente bonito!

domingo, fevereiro 24, 2008

TOMAR COMO EXEMPLO OS MAUS ALUNOS?

Devemos imitar os maus alunos, quanto à forma como cuidam da delinquência juvenil? Foi esta a questão, que o investigador francês Sébastien Roché se colocou e para a qual procurou respostas cientificamente sustentáveis…
Desde 1978, que diversos Estados norte-americanos modificaram as suas leis para julgar adolescentes como se fossem adultos, baixando a idade da maioridade quanto ao que a questões penais diz respeito.
Uma solução, que já se ouviu partilhar por cá, quando é a direita pura e dura a propor soluções para a marginalidade cometida por jovens…
Ora os estudos comprovaram que a aplicação dessas leis - em Nova Iorque chama-se «Juvenile Ofender Law» - nada de positivo trouxeram ao analisar-se o período compreendido entre 1978 e 1982, quer na cidade em si, quer quanto a uma progressão positiva na descida da criminalidade se comparada com a de cidades semelhantes, mas sem a aplicação de tal legislação.
O estudo confirma, que os delinquentes condenados a penas de adultos, reincidem muito mais frequentemente no crime ao saírem da prisão, que os seus colegas submetidos a uma outra lógica de reinserção social.
A solução parece clara: não é um país, que tem uma taxa de criminalidade tripla da média europeia, um tráfico de droga sextuplicado e uma população encarcerada septuplicada, que serve de exemplo para o que quer que seja.
A solução continua a ser tão só a aposta na reintegração dos provisórios delinquentes numa estrutura social normalizada…

quarta-feira, fevereiro 20, 2008

GUILLERMO DEL TORO: «O LABIRINTO DO FAUNO»

Chama-se Ofélia a miúda adolescente, que chega com a mãe ao acampamento militar do capitão Vidal, que passou a ser o seu padrasto.
Está-se na primeira metade dos anos 40, quando a Guerra Civil ainda não está inteiramente apagada, porquanto subsistem bolsas de guerrilheiros nas zonas mais recônditas de Espanha. São esses resquícios de resistência, que Vidal procura aniquilar.
Mas a chegada de Cármen e da enteada tem outro objectivo: o de assistir ao nascimento do filho, que almeja como sucessor! Daí a importância de ter junto a si o Dr. Ferrero, o médico da região.
O filme de Guillermo del Toro, intitulado «O Labirinto do Fauno», não se resume, porém, a uma mera evocação de um período tenebroso da História Contemporânea. Como Ofélia é leitora voraz de livros, que a acompanham por todo o lado, o filme mostra-a atraída por um labirinto, aonde um estranho personagem lhe conta uma inesperada novidade: ela é a princesa Moanna, filha do rei do Mundo Subterrâneo e que terá um percurso iniciático a percorrer antes de a ele voltar a aceder. Para a ajudar nessa tarefa oferece-lhe o Livro das Encruzilhadas.
A primeira prova, embora complicada, é vencida facilmente por Ofélia: conseguir uma chave de um nojento sapo gigante escondido nas raízes de uma árvore moribunda.
Vai-se, entretanto, conhecendo algo mais sobre o carácter psicopata de Vidal, que mata a sangue-frio os mais inofensivos suspeitos de simpatia para com os comunistas.
A segunda tarefa mágica de Ofélia já corre pior: apesar das indicações rigorosas do Fauno para que resista aos lautos alimentos apresentados numa mesa, ela não resiste e come alguns bagos de uva. Tanto bastará para se desqualificar quanto ao objectivo de regressar à pele de Moanna.
Vale-lhe que, nessa altura, perante os problemas de saúde da mãe, ela já obtivera do estranho ser a Mandrágora com a qual garantira a melhoria significativa dos inquietantes sintomas daquela.
Só que o capitão Vidal descobre a planta debaixo da cama e destrói-a. É quanto basta para que Cármen não resista a nova hemorragia, morrendo de parto.
De nada lhe valia então o dr. Ferrero, cujas ligações clandestinas com os guerrilheiros, descobertas por Vidal, levam este a matá-lo. Ou Mercedes, a governanta, que decide-se, enfim, a fugir juntando-se aos combatentes clandestinos, e é capturada, quando levava Ofélia e o irmão consigo.
Sujeita a tortura, Mercedes consegue arranjar forças para se libertar e ferir seriamente Vidal, quando este se preparava para a torturar selvaticamente.
Perseguida pelo padrasto, quando procura refúgio no Labirinto, Ofélia encontra de novo um Fauno disposto a dar-lhe uma derradeira oportunidade: um ritual em que terá de sacrificar o bebé.
Recusando essa barbaridade, a adolescente fica à mercê do desfigurado Vidal, que dispara sobre ela, quando a vê escapulir-se com o seu ansiado herdeiro.
Desconhecia a rapariga que se tratava da expedita via para aceder ao seu mundo mágico, aonde a esperam o pai e a mãe, os reis desse acolhedor espaço. Com o Fauno, que lhe diz ter sido a correcta essa opção de recusar o sacrifício do bebé inocente.
Vidal não consegue, entretanto, livrar-se do seu destino: cercado pelos vitoriosos guerrilheiros será executado seriamente, tomando Mercedes conta da criança. Prometendo ao carrasco, que o filho nem sequer saberá alguma vez o seu nome, gorando-lhe as expectativas de deixar sucessor.
Embora com os limites próprios de quem mistura fantasia com acontecimentos dramáticos da história humana, Guillermo del Toro consegue a ponte para um público para quem a Guerra Civil é coisa quase pré-histórica, consumindo o lado mágico sem se dar conta que se incrustra em si a conotação entre os malvados franquistas e a perfídia da madrasta da Branca de Neve.
Os meios de produção são reduzidos em nada se comparando com a saga do «Senhor dos Anéis» e, por isso mesmo, a caracterização do Fauno é pouco verosímil.
Mas como quem não tem cão, caça com gato, pode-se dizer que o realizador conseguiu a arte de credibilizar a sua narrativa à conta do trabalho dos actores, de entre os quais avulta Sergi Lopez no papel de Vidal.
Só é pena que o destino deste personagem não tivesse sido o da generalidade dos oficiais franquistas, que tantos crimes cometeram em nome da sua fé religiosa e dos seus valores monárquicos. Os que continuam alimentar as forças mais tenebrosas da política espanhola.

ADEUS COMANDANTE!

Grotescas as imagens dos cubanos de Miami a celebrarem a renúncia de Fidel Castro às suas funções de liderança na Revolução Cubana.
Aquela gente, eivada de um anticomunismo primário, arroga-se de conceitos de democracia, que são no mínimo paradoxais.
Para eles, Cuba é uma ditadura, porque só os candidatos do Partido Comunista são sujeitos ao veredicto popular, não sobrando lugar para vozes alternativas.
Ora, no caso dos Estados Unidos, haverá assim tanta diversidade de alternativas? Apesar de dois partidos, em aparência alternativos, só tem acesso a ser elegível quem tem fortunas a apoiá-lo e a fazê-lo representante dos seus interesses lobbistas.
Quem classifica, de forma primária, o país caribenho como ditadura e poupa essa designação aos Estados Unidos, usa uma dualidade de critérios, que só o desqualifica como juiz justo e imparcial do que vê...

domingo, fevereiro 17, 2008

UM EQUÍVOCO IDEOLÓGICO

É claro que a notícia não surpreende: a independência do Kosovo não surpreende quem há muito a esperava, ou não fosse ela uma das peças da estratégia da Casa Branca para afrontar a Rússia de Putin. A exemplo dos apoios dados aos governos da Ucrânia ou da Geórgia para garantirem uma espécie de cerco político e militar a Moscovo.
Vive-se, assim, o estertor de uma visão imperialista, que conheceu os seus limites nos fracassos iraquiano e afegão. E que julgava alcançado um ilusório fim da História em que a pax americana vingaria à escala global. Com o omnipresente dólar a converter-se numa espécie de moeda única.
A miopia dos ideólogos norte-americanos - desde um Ronald Reagan tão incensado por alguns - foi considerar a União Soviética o inimigo principal, financiando e armando os mujahidines, que aproveitariam depois para organizar os atentados terroristas subsequentes. Em vez de entenderem, que a verdadeira guerra era entre a modernidade e os valores fundamentalistas, quiseram destruir o comunismo.
O que se passou hoje em Pristina é um dos últimos actos de um tremendo equívoco ideológico. E, infelizmente, uma grande parte da União Europeia seguirá obedientemente o que o «aliado» da NATO lhes mandar.

QUERERMOS SER DO NOSSO TEMPO É JÁ ESTARMOS ULTRAPASSADOS

O capitalismo prepara-se para uma nova crise na sequência das dificuldades de ressarcimento dos chamados créditos com o subprime.
O Governo, que precisava de algum sossego para consolidar todo o esforço produzido no saneamento das contas públicas, enfrenta agora os riscos de um arrefecimento significativo das economias para onde mais costuma exportar. Ora, as eleições aproximam-se, as campanhas difamatórias contra o primeiro-ministro continuam a ser lançadas com suspeitosa regularidade e o movimento sindical e social, mobilizado por efeitos das reformas na saúde ou na educação, dispõe-se a fazer o frete a quem mais interessado se mostra em mudar de políticas: o grande capital, que vê nos governos de direita a oportunidade de lançar as suas golpadas.
O que sucedeu com o Casino Lisboa e as trapalhadas do ex-ministro do CDS Telmo Correia para dar a privados o que deveria ser mantido na posse do Estado é só um exemplo de como ocorre o regabofe da corrupção quando a direita chega ao poder.
É claro que a desmistificação das competências governativas de tal gente aparece bem explicitado no que Sarkozy fez nestes seis meses de Presidência. Os escândalos têm sido inversamente proporcionais em relação a medidas concretas para melhorar a qualidade de vida dos franceses. As sondagens demonstram bem como depressa se fartaram de um pequeno tiranete, mais apostado em usufruir as mordomias da função em proveito próprio do que em trabalhar a sério pelo bem estar dos seus concidadãos.
Esperemos que uma vitória democrata nas eleições de Novembro traga alguma serenidade à forma dos norte-americanos encararem a sua progressiva perda de influência nos mercados financeiros internacionais.
Olhar longe é, agora, um desafio deveras complicado. Porque todas as semanas ocorrem golpes de teatro, capazes de modificarem os quadros de referência em que julgávamos possíveis as nossas conjecturas estratégicas...

sábado, fevereiro 16, 2008

A minha pateada em Newport

Se de repente me visse a viajar no tempo, aterrando no Festival de Newport em 25 de Julho de 1965, qual seria a minha atitude perante a actuação de Bob Dylan?
Estaria entre os que o apupavam ruidosamente ou entre os que o apoiavam na decisão de abandonar um som canonicamente folk para abraçar as sonoridades eléctricas do rythm & blues e do rock?
Sabendo o que sei hoje penderia decerto para a primeira hipótese porque, se num Pete Seeger respeito a firmeza das convicções, Dylan aparece-me como um egocêntrico, que namorou com as grandes causas de então (Direitos Cívicos, Guerra do Vietname), ganhando notoriedade à esquerda e, depois, se dissociou completamente desse filme.
Poder-se-á reconhecer nele uma personalidade complexa, mas nesta biografia definitiva assinada por Martin Scorcese, o que sobressai é um confessado individualismo, alheio a valores, a emoções e a lealdades.
Terá sido um enorme talento na forma de recolher as palavras do seu âmago e transformá-las em poemas com assombrosa rapidez.
Reconhecer-se-lhe-á versos, que mesmo atendo-nos à sua aversão a constituir-se como porta-voz de uma geração revoltada, se tornaram bandeira de ideais muito mais avançados do que os por ele pretendidos. Mas como não escalpelizar os múltiplos sentidos de uma canção anunciadora dos tempos em mudança?
Ele terá cruzado, igualmente, a sua arte com a do seu tempo, convivendo com Andy Warhol, com Allen Ginsberg e tantos outros artistas, que nele chegaram a vislumbrar o mensageiro de uma época muito diferente, porque em radical corte com os valores enquistados de então…
Apesar do aprofundado trabalho do realizador, fica por esclarecer o mistério Dylan. Quem terá sido ele no meio de tantas e tão contraditórias imagens de si? Que elementos de personalidade serão comuns às suas sucessivas reinvenções de si próprio?
O documentário de Scorcese vale, sobretudo, como espelho de uma época conturbada em que se chegou a pensar exequível uma outra sociedade, liberta dos egoísmos do capitalismo.
O afastamento de Dylan desse tipo de utopia acaba por ser o melhor retrato desse idealismo frustrado. Porque nenhum sonho se aguenta de pé, quando os seus supostos guias espirituais se apressam a abandonar o barco…
Se na canção de Mercedes Sosa haverá que distinguir entre os bons, os muito bons e os imprescindíveis, Dylan incluir-se-á porventura na categoria dos primeiros…

quinta-feira, fevereiro 07, 2008

Sobre a vingança em «Sweeney Todd»

Vingança, eis o tema de «Sweeney Todd», o filme de Tim Burton, que passa agora por Lisboa. E Johnny Depp assume, que é um dos que mais o interessam, porquanto toda a gente terá uma pitada de tal sentimento face a quem o humilhou ou prejudicou.
Pessoalmente não gostaria de pôr as coisas nesses termos, já que a vingança é, sobretudo, emotiva, e a idade vai-me dando vontade de racionalizar o mais possível o que se passa.
Mas, quando penso nos crimes de Franco ou de Pinochet, será possível racionalizar? Só que a grande verdade é terem morrido de velhice nos seus confortáveis leitos sem sentirem o peso de uma justiça, que seria sempre incapaz de encontrar castigo bastante para as suas malfeitorias…
Como teria sido possível vingar as vítimas de tais algozes se tivesse havido oportunidade de os confrontar com uma qualquer forma de justiça?
Pegando noutro exemplo, os condenados de Nuremberga terão mitigado, um pouco que fosse, a vontade de vingança dos crimes nazis entre 1933 e 1944?
Quando Depp enfatiza assim tanto a vingança como sentimento justificado pelas injustiças de quem a procura não estará assim a esquecer o essencial? Que o fundamental continua a ser a procura de um outro tipo de sociedade aonde se reduzam em muito as injustiças no seu todo?
É claro que se trata de uma utopia, que os socialistas e os comunistas procuraram exequibilizar em formas diferentes de governar à esquerda e que falharam rotundamente em todas essas experiências. Mas isso não implica que se aprenda com esses fracassos e se busquem novas vias de solução para uma doença incurável: a de uma sociedade humana aonde se é naturalmente egoísta, arrogante e prepotente, quando se é poder, mas aonde o projecto de um homem novo mais justo e fraterno continua a fazer sentido!

sábado, fevereiro 02, 2008

OST - 'Barry Lyndon'

Falar de aristocracia e da sua vontade em cingir poder e prebendas a quem faz parte da sua corte, leva-me de volta a Stanley Kubrick e ao maravilhoso filme, que ele fez sobre um homem inquieto disposto a desafiar a fatalidade de não pertencer ao círculo dos privilegiados.
E a música de Haendel é encantatória...

EVOCAR O HEROÍSMO DE MANUEL BUIÇA E ALFREDO COSTA

No dia 1 de Fevereiro os trogloditas saíram das suas cavernas e vieram encher de encómios a memória do rei, que os heróicos carbonários mataram fez agora cem anos.
Durante um dia os defensores da ideia de uma qualquer majestade iluminada, a quem os seus súbditos se têm de submeter durante toda a vida sem o poder correr a pontapé mediante a legitimidade democrática, encontraram veículos mediáticos de expressão desse absurdo, como se essa fosse uma ideia minimamente aceitável.
O que Buíça e Costa fizeram há cem anos foi um martírio em prol de um país mais justo. A aristocracia é o resíduo mal cheiroso de uma sociedade antidemocrática em que uns têm «sangue azul» e todos os direitos e os outros são convidados a entusiasmarem-se com as suas cenas de alcova ou de mera apologia nas revistas cor-de-rosa.
Depois, surgiu o inefável Rui Ramos: quando já nos julgávamos livres de um determinado tipo de abordagem da História por morte (eles é que ainda não deram por isso!) das múmias paralíticas oriundas do Estado Novo (Veríssimo Serrão e José Hermano Saraiva), eis que eles ressuscitam através da versão desse pseudo-historiador com assento permanente em jornais e televisões.
Autor de uma biografia hagiográfica do inspirador da ditadura cripto-fascista de João Franco (ademais apresentada como exemplo de «modernidade») esse paladino da direita ideológica teve quase tanta notoriedade neste dia quanto a do bem enterrado morto do dia.
Para um republicano, laico e socialista, este foi um dia de evocação da memória heróica dos revolucionários de há cem anos…