segunda-feira, março 29, 2010

Teatro: OIL AIN’T ALL, JR., TEATRO PRAGA

O Teatro Praga tem-nos habituado a espectáculos de grande originalidade, sobretudo pela criação colectiva de todos os seus intervenientes e a dispensa da figura do encenador.
Em «Oil Ain’t All» a radicalidade do conceito atinge uma outra dimensão em que de teatro  - pelo menos no que canonicamente o diferencia - pouco se vê e o que fica é uma espécie de performance de um número significativo de figurantes liderados por uma mão cheia de actores.
Ao entrar-se na pequena sala estúdio do CCB o cenário está envolto em fumo, pelo que só se vê o plano mais próximo (um jacuzzi, umas mesas e cadeiras) mal se distinguindo, pois, o que está por trás (as árvores de uma floresta).
Entram os figurantes e tornamo-nos espectadores de uma festa anódina com gente a beber e a dançar, uns quantos a conversar, crianças a jogar ao monopoly ou namorados em arrufos motivados pela intrusão do telemóvel.
Pode-se apreciar o relativo à-vontade com que tais figurantes reproduzem ali o ambiente de uma qualquer festa familiar em ambiente abastado ao fim-de-semana.
Mas logo surge um comando terrorista, que toma reféns e executa a maioria dos presentes. É o pesadelo de Beslan ou de outro sítio semelhante, que ali se coloca à nossa frente.
Daí em diante os terroristas vão transportando corpos de fora de cena para o pavimento do cenário.
Embora as explicações do programa sejam escassas, o que parece estar aqui em questão é a quase gratuitidade dos comportamentos violentos numa sociedade virada para um hedonismo inconsequente.
Mas parece muita parra para tão pouca uva, justificando-se o desagrado de quem acaba por optar por nem sequer bater palmas no final. Muito embora se deva saudar o carácter original da experiência e o esforço genuíno dos actores ...

quinta-feira, março 25, 2010

Documentário: GERONIMO de Sarah Colt e Dustinn Craig (2008)

O que poderemos achar de Geronimo mais de cem anos passados sobre a sua morte?
Deveremos admirar a sua bravura indomável com que resistiu anos a fio ao incontornável domínio dos colonos brancos, mesmo quando chefiava uma quarentena de rebeldes contra os mais de cem mil soldados americanos enviados à sua procura?
Ou deveremos vê-lo como o fanático apache cujas acções de guerrilha terão trazido maiores prejuízos, que benefícios aos seus irmãos de raça?
Outras nações índias tinham-se acomodado às novas reservas, mesmo obrigando-se a sobreviver miseravelmente em reservas áridas, demasiado inóspitas para a agricultura e esvaziadas de caça.
Forçoso é reconhecer que opondo grande resistência aos invasores ou aceitando-lhes os ditames, todas as nações índias da América do Norte foram violentamente dizimadas num verdadeiro genocídio, que a História pareceu absolver.
Um exemplo eloquente de como pode ser injusta a perspectiva histórica herdada dos vencedores, ou seja dos que ficaram vivos para contarem à sua maneira o que tinham vivido...

terça-feira, março 16, 2010

Livro: «MON TÉMOIGNAGE DEVANT LE MONDE» de Jan Karski

A reedição francesa do testemunho de Jan Karski, resistente polaco, que dera conhecimento a Roosevelt, em 1943, da realidade da «Solução Final» nazi tem servido de argumento para uma intensa polémica entre duas posições ideológicas absolutamente opostas.
Por um lado há os que defendem o estatuto de criminosos de guerra para Roosevelt e Churchill por terem sabido da existência dos campos da morte logo em 1942 ou 1943 sem que evitassem o subsequente extermínio de milhões de judeus.
Pode-se dizer que esta visão á assumida por fundamentalistas apostados em considerar o problema judeu como eixo central da Segunda Guerra Mundial, apesar de se contarem pelo triplo as vítimas soviéticas, normalmente tão menosprezadas. Não admira que sejam também estes os defensores da actual política de extermínio de Israel a respeito dos seus vizinhos palestinianos, naquilo que se revela um triste paradoxo em que o oprimido de ontem decide oprimir quem hoje se revela mais fraco e utilizando métodos como os que conhecera no seu dramático passado.
Temos, depois, os que possuem uma visão oposta: apesar de conhecerem a terrível realidade de Auschwitz e dos outros campos de concentração, Roosevelt e Churchill,  a par de Staline, procuravam as melhores vias para vencerem uma guerra aonde se sucediam os avanços e os recuos e perante uma retaguarda interior aonde não deixavam de reagir os germanófilos.
A quem estranha o facto de não se terem bombardeado as linhas ferroviárias, ou mesmo os crematórios, pode contrapor-se o facto de as primeiras, apesar de sujeitas a sucessivas sabotagens por parte da Resistência, serem rapidamente repostas na sua operacionalidade pela capacidade organizativa da estrutura nazi. E quanto aos segundos, o erro de cálculo para os bombardeamentos era então muito elevado e quase por certo implicariam bombas a atingir os pavilhões de prisioneiros. Com o que a propaganda nazi não deixaria de aproveitar.
Trata-se, pois, de uma polémica sem sentido histórico, porquanto, à distância, perdem-se as coordenadas fundamentadoras das decisões então tomadas pelos políticos aliados. E até mesmo Pio XII dificilmente poderia ter feito mais do que aquilo que esteve ao seu alcance, já que não devemos esquecer como até à sua residência de verão em Castelgandolfo serviu para esconder algumas centenas de judeus, de outra forma sujeitos à deportação. 
A polémica actual visa, pois, ganhar dividendos neste presente em que se procura identificar o criminoso governo de Telavive do sofrimento relacionado com a Shoah.
Nada justifica que, em nome do direito à sobrevivência de uma determinada raça humana, se procure destruir outra, espoliando-a dos seus haveres, acantonando-a em guetos e promovendo a sua destruição progressiva.
Pelo respeito que merecem as vítimas do Holocausto, os seus supostos descendentes deveriam ser muito rigorosos na aplicação de comportamentos humanistas em que imperassem o respeito pelas convicções alheias e pela propriedade alheia. Quão distante está o actual governo israelita dos que imaginaram essa terra como o espaço de eleição para uma forma utópica de comunismo em que os proventos da terra eram trabalhados e usufruídos colectivamente…
Do livro de Karski ficam alguns episódios terríveis por ele presenciados clandestinamente na sua actividade de resistente polaco contra a ocupação alemã: por exemplo o exercício de tiro assumido por jovens adolescentes alemães, fardados com as vestes da Juventude Hitleriana, contra os esfaimados sobreviventes do massacre no gueto de Varsóvia. Ou como os deportados eram amontoados dentro de vagões dirigidos a Auschwitz sem terem espaço para sequer respirarem e aonde a cal espalhada no pavimento servia para ir desidratando os infaustos passageiros até os matar em terrível agonia mesmo antes de chegarem ao seu definitivo destino.
Dois exemplos de como o nazismo significou a crueldade no seu estado mais puro, apesar de implantado naquele que era um dos povos mais cultos da Europa antes de 1933. E como nunca serão suficientes os libelos, que contrariem as indignas vozes de uns quantos negacionistas.

domingo, março 07, 2010

Filme: «O LEITOR» de Stephen Daldry

Começou por ser um romance de sucesso da autoria de Bernhard Schlink e transformou-se num projecto turbulento dos irmãos Weinstein, porquanto demorou a decisão sobre quem interpretaria o papel da protagonista (Kidman ou Winslet?), se Daldry estaria em condições de por ela se responsabilizar, dado estar ocupado com a encenação de «Billy Elliot» na Broadway ou se os produtores executivos sobreviveriam até ao final da rodagem tendo em conta que, quer Anthony Minghella, quer Sidney Pollack, morreriam entretanto. Mas, apesar de arrastado e, amiúde, mediano, «O Leitor» é uma meditação ética sobre o tema da culpa. Que também comporta outras abordagens complementares não menos interessantes: sobre a moral, a justiça, a vergonha do analfabetismo, o passado, a História e o dever.
O filme surge balizado em quatro datas distintas:
· 1944, quando Hanna deixa morrer queimadas as prisioneiras, que ajudava a transferir de Auschwitz, e se tinham refugiado numa igreja durante um bombardeamento aliado sem que ela lhes abrisse as portas por onde pudessem fugir;
· 1958, quando o adolescente Michael tem uma relação tórrida com ela num Verão em que alterna sexo com leitura de romances em voz alta;
· 1966, quando ele estuda Direito em Heidelberga e a descobre ré no processo sobre o ocorrido duas décadas atrás;
· e 1995, quando o envelhecido Michael conta à filha aquela experiência que nunca partilhara com mais ninguém.
Condenada a prisão perpétua, Hanna acaba por se suicidar na véspera da sua libertação, já que o único com quem poderia contar - esse amante efémero do seu passado - jamais se libertará do impasse entre os seus sentimentos e o nojo racional da condição torcionária dela...

quarta-feira, março 03, 2010

JEF AEROSOL


Na série de documentários dedicados à arte moderna, que o canal ARTE anda a transmitir aos domingos, Jef Aerosol também teve direito aos 26 minutos de abordagem da sua verve criativa.

Nascido em Nantes , em 1957, ele é artista de rua, semeando representações de músicos e políticos pelas paredes de vários países europeus.
Recorrendo a uma réplica da metodologia da estampilha em azulejaria, ele usa profusamente os seus sprays de pintura com o objectivo de suscitar uma emoção visual em quem se torna seu espectador.
Na sua arte de rua há sempre alguém representado: o retrato é o seu tema de eleição, não admirando que se tenha exposta em primeiro lugar enquanto seu modelo de eleição. Mas, depois transitou para os seus heróis, que vão de Léo Ferre a Gainsbourg, de Chaplin a Buster Keatõn, ou de Amália Rodrigues e Woody Allen):
Influenciado pela cultura rock, ele usa abundantemente as imagens recolhidas na sua colecção de discos de vinil dos anos 60, imbuídas de pop art.
É, no entanto, obrigatória a referência ao seu «seating boy», que figura por tantos sítios diferentes, incluindo a parede de um dos elevadores lisboetas...