domingo, setembro 30, 2007

jacques brel - les bonbons 67

Ao rever um documentário sobre Brel, surgiu este memorável tema sobre um homem despeitado depois de abandonado pela sua namorada.
Porque será que a «dor de corno» aguça a ridícula jactância dos que nada entendem do porquê de se verem rejeitados?

sábado, setembro 29, 2007

Jaime Rocha: «A Mulher que Aprendeu a Chorar»

Terá a mulher sem um braço apertado mesmo o gatilho e assassinado Carlos? Ou tratar-se-á de um processo de cura psicanalítico em que um casal se predispõe a curar a ferida entre ambos surgida e só superável mediante a aprendizagem do choro por parte dela?
O conto não é completamente esclarecedor a tal respeito, embora o que verdadeiramente estará em causa será a capacidade de nos acreditarmos ou não amados pelo outro, aquele a quem se torna mais prático «matar» por medo de sermos por ele próprio assassinados no nosso íntimo, na nossa identidade.
É a questão da auto-estima, do medo da rejeição. E caberá, então, questionar se a mulher em causa teria mesmo um braço a menos ou se essa deficiência mais não é do que a simbólica expurgação de uma parte de si…
O conto de Jaime Rocha lança todas essas pistas sem nenhuma delas conduzir a um fim clarificador.
Resta a capacidade de a mulher ter, enfim, começado a chorar. E com ela a curar-se do mal em si antes identificado…

sexta-feira, setembro 28, 2007

~Milan Kundera: «A mamã»

Que falta de sentido de oportunidade teve a mãe de Karel, quando decidiu passar uns dias em casa do filho e da nora noutra cidade situada na extremidade oposta do país. Sobretudo, quando será suposto regressar no sábado e se decide a prolongar a estadia até segunda-feira.
Ora, Karel e Markéta recebem nesse domingo uma amiga, Eva, com quem costumam concretizar os fantasmas eróticos, que os agitam: o adultério, o lesbianismo, a simples sedução de um corpo distinto do conjugalmente convencionado…
Mas qualquer deles já está saturado desses jogos, encetados há já uns anos. E vêm ao de cima outras tentações: em Karel o do corpo de Nora, uma mulher mais velha, cuja recordação resgata da infância com uma força, que não se deixa diluir mesmo após a saber agora velha e cega…
Marketa constata em si o sofrimento de saber Karel incapaz de resistir à tentação da infidelidade com outras mulheres de cuja existência se limita a suspeitar e sente crescer em si o desejo de libertação quanto a uma relação cada vez mais contraditória entre esse sofrimento e o amor ainda persistente por ele.
Eva, por seu lado, sente o prazer da perversão em que assume papel central, mas já perspectiva outra forma de triângulo: o que terá por vértices ela, o seu próprio marido e Marketa, excluindo assim Karel.
Quem acaba por se sentir mais satisfeito com o fim-de-semana é Karel: ele “sabe muito bem que em mil ou três mil actos de amor (quantas vezes fez amor ao longo da vida?) só dois ou três permanecem verdadeiramente essenciais e inesquecíveis, enquanto os outros não passam de rodeios, imitações, repetições ou evocações. E Karel sabe que o amor de ontem é um desses dois ou três grandes actos de amor, e sente uma imensa gratidão.”
Este conto inserido em «O Livro do Riso e do Esquecimento» insere-se naqueles textos do autor checo em que os impasses do quotidiano vivido em regime de partido único encontram alguma catarse numa libertinagem clandestina e insatisfatória.

quarta-feira, setembro 26, 2007

«A Dália Negra» de Brian de Palma

Confesso que entre as minhas antipatias de estimação está o escritor norte americano James Ellroy: a sua misoginia e filiação numa perspectiva musculada da política norte-americana colocam-no nos antípodas das minhas próprias opiniões ideológicas.
A história do homicídio da sua mãe, essa Elizabeth Short, que haveria de protagonizar os títulos dos principais jornais de Novembro de 1946, também só me interessa no contexto de um pós-guerra, a coincidir com o início dos famosos «trinta anos gloriosos» de que significava um contraponto.
Estavam os norte-americanos lançados num percurso politico e social, que a todos projectaria para o tal sonho de sucesso, quando a morte desta actriz fracassada vinha desmentir os tais finais felizes.
Se Elizabeth falhara a sua candidatura a uma carreira cinematográfica e acabara grotescamente desfigurada num descampado da cidade dos anjos, também muitos dos que se deixavam perturbar pela história poderiam partir os dentes perante uma aceleração dos processos capitalistas de produção da riqueza sem sequer se conseguir culpar quem quer que fosse por tal vilania.
Mas De Palma não segue essa via: escusando-se a uma mensagem política, seja a de Ellroy, seja a contrária, ele aposta o interesse do filme na abordagem de uma tese verosímil para a morte de Elizabeth. Nesse sentido, o filme só pretende constituir um entretenimento bem construído em torno da intriga policial e do carácter obsessivo da investigação para um dos detectives, que sucumbirá nessa busca da solução.
Há, contudo, um interesse acrescido no filme: uma filiação na representação, que o pintor Edward Hopper construiu a propósito do seu tempo e do seu espaço circundante. A fotografia do filme, em muitos dos seus fotogramas, quase reproduzem o universo desse emblemático pintor da primeira metade do século XX.
Quanto ao desiderato do enigma trata-se de uma tese como qualquer outra. Passados seis décadas já, há muito, terão desaparecido os que terão sabido o que se passou naquela noite de 1946. A exemplo de outros mitos - como os das mortes de Marilyn ou de John Kennedy - a morte da Dália Negra contribui para uma mitologia identitária do próprio tecido cultural norte-americano, que tão escasseado anda deles.
Num país com História ainda tão escassa tem alguma relevância a criação dos seus próprios ícones para superar aquela que foi uma inesquecível sensação de falso, quando penetrei na Catedral de St. Patrick na 5ª Avenida de Nova Iorque: o edifício tinha a forma de Catedral com algo de barroco no seu estilo. Mas aquelas pedras, com apenas dois séculos, se tanto, não tinham a patine dos tempos dos construtores das catedrais europeias...

Gershwin - Rhapsody in Blue pt.2/2

Ao continuarmos a ouvir a interpretação do tema de Gershwin por Leonard Bernstein podemos sempre recordar a velha história do encontro do compositor com Ravel, quando este passara uma temporada nos EUA.
- Mestre, como poderie vir a ser um Ravel? - questionava Gershwin?
E respondia-lhe o autor do «Bolero»:
- Para que quer ser um Ravel, quando já é um Gershwin?

Gershwin - Rhapsody in Blue pt.1/2

Neste 26 de Setembro há que recordar George Gershwin, que nasceu há 109 anos em Nova Iorque.
Se o descobri verdadeiramente através de Woody Allen («Manhattan»), nunca mais deixei de apreciar esta sábia mistura entre os sons de uma herança musical clássica e um jazz então em clara afirmação...
Se não tivesse morrido tão cedo quantas mais obras primas nos teria deixado?

terça-feira, setembro 25, 2007

«Ubik»: um surpreendente romance de Philip K, Dick

Joe Chip chega a Des Moines em 1939, quando a Segunda Guerra Mundial está no início. E vai encontrar aí os colegas com quem vivera a explosão em Luna, pela qual o tenebroso Ray Hollis terá colocado fora de serviço a maioria dos Inerciais da Sociedade de Prudência de Glen Runciter.
Recuados no tempo quase sessenta anos, os sobreviventes de tal atentado andam desnorteados a ver alguns deles definharem até se reduzirem a cinzas e sem saberem qual a melhor estratégia reactiva. Pretenderiam regressar ao seu presente, aquele distante 1992 em que combatiam telepatas e precogos apostados em se infiltrarem em organizações com propósitos ilícitos. Um tempo, também, em que tudo se paga, até o simples pedido para abertura da porta do apartamento obrigava ao pagamento de uma moeda numa ranhura.
E existe um elixir, que pode ter algum efeito na contenção dessa imparável regressão do tempo: é Ubik, o mesmo termo que aparece, transversalmente, nas várias épocas como sinónimo de vários produtos de consumo comum. E que dá nome a este título de Philip K. Dick, publicado em 1969.
Um livro estranho e imaginativo que, com uma ou outra incongruência, até vence a prova do tempo…
O maior contratempo para os protagonistas é a morte de Glen Runciter, esse líder que a todos orientava com a ajuda das opiniões da mulher, Ella, cuja morte precoce não impedia a sua intervenção a partir do seu limbo criogénico em que é mantida num Moratório suíço.
Mas a história complica-se, quando Joe Chip vai encontrando mensagens de Glen Runciter a inverter as evidências mais óbvias: ele estaria vivo e seria todo o grupo de Inerciais quem estaria morto e conservado em gelo no mesmo Moratório em que está, igualmente, Ella Runciter.
Há também Pat, a jovem inercial de grande talento, contratada pela Glen Runciter Associates para impulsionar a luta contra precogos e telepatas, mas com provável influência em tudo quanto doravante iria ocorrer.
A sessenta páginas do final do livro não se faz qualquer ideia de como Dick irá desatar os muitos nós semeados pela sua narrativa. A essa distância o leitor sente-se tão perdido no fio da história como esse Joe Chip, esse líder improvável da Glen Runciter Associates, que não consegue ver para ele um caminho de saída, quanto mais transmiti-lo aos demais.
Então sucede-se um conjunto de revelações, que clarificam tudo: Joe está, de facto, no Moratório de Zurique depois do atentado, que vitimara todos os colegas. Mas ali não é Hollis a sua maior preocupação, nem essa Pat, que era dele uma agente infiltrada. O maior desafio é resistir a um jovem adolescente, igualmente no limbo criogénico, e disposto a nele se manter alimentando-se vampiricamente do que dos vizinhos resta. Daí a intervenção exterior do seu patrão a dar-lhe as vias para essa periclitante salvação...

Colum McCann

Colum McCann é um escritor irlandês, nascido em 1965, que está a afirmar-se como um dos principais autores deste tempo ao assumir a lógica global dos seus interesses e falando sobre eles.
Numa entrevista ao programa francês «Metropolis» (do canal ARTE) ele assume a estratégia de escolher como temas o que não conhece.
A Literatura é para ele uma forma de descoberta.
No único livro seu editado entre nós - «O Bailarino» - ele fora à procura da personalidade de Rudolf Nureyev, abordando-a desde a infância nos campos russos e os primeiros anos da sua carreira de bailarino na antiga URSS até ao seu exílio ocidental, aonde a genialidade do seu talento se afirmaria em paralelo com uma existência de excessos a nível de afectos.
Agora está a enfatizar-se em França o lançamento do seu romance mais recente - «Zoli» - dedicado a uma poetisa cigana através de quem ele aborda uma cultura ostracizada numa Europa às avessas com os valores e os costumes desse povo espalhado um pouco por todo o continente, mas aqui considerado nos que vivem na Eslováquia, na Itália, na Áustria e em França.
Para criar este livro o escritor viveu alguns meses com ciganos a fim de melhor os conhecer, entrando assim no universo singular da poetisa, que lhe serve de fonte de inspiração.
No fundo ele leva até às últimas consequências o seu projecto de vida, assente na máxima «Sinto-me bem, quando estou em terras estranhas».
Num contexto em que os estímulos visuais tendem a limitar o consumo de literatura, Colum McCann está a explorar uma via interessante, que é a de compartilhar com os seus leitores os resultados das suas próprias descobertas.

domingo, setembro 23, 2007

Alice.e Franco.Battiato.-.I.treni.di.Tozeur

Em 1984 Alice e Franco Battiato apareceram no Festival da Eurovisão com este belíssimo tema.
Porque o filme do Nanni Moretti hoje dado na RTP2 mo recordou vim procurá-lo para o pôr no Blog.
Como sinónimo do que a música ligeira italiana consegue ser nos seus melhores momentos...

«O Livro do Riso e do Esquecimento»: As Cartas Perdidas

Ao iniciar a leitura deste livro de Milan Kundera a dúvida que me assiste é esta: ainda fará sentido ler um romance tão datado, porque em clara sintonia com um tempo e um espaço já completamente alterados?
Em 1978, quando ele surgiu, ainda parecia impossível que o antigo Bloco de Leste caísse com tal fragor, onze anos depois.
Para a intelectualidade ocidental fazia sentido questionar o totalitarismo pretensamente comunista ao mesmo tempo que se procurava a forma de o fazer sem uma conotação imediata com o anticomunismo primário inerente aos sectores mais retrógrados do pensamento ocidental…
Kundera era estimulante, porque a forma como contestava o regime checo não era maniqueísta, nem apelava a um totalitarismo de sinal contrário. No regime de Praga ele denunciava a mediocridade de quem se dissociara dos melhores elementos, calados à força de uma repressão violentíssima, que tivera na invasão russa de 1968 o seu clímax. Se o novo regime nascera sob os melhores auspícios e motivado pelos mais generosos ideais, depressa eles se tinham pervertido em nome de uma segurança do Estado definida por um pequeno punhado de dirigentes.
Em «As Cartas Perdidas», primeira das sete partes em que se divide o livro de Kundera, o protagonista, Mirek fora um conceituado cientista a quem o arrivismo condenara à condição de operário da construção civil.
Em vésperas de ter a casa devassada para lhe confiscarem papéis comprometedores, ele procura Zdena noutra cidade: muitos anos atrás amara-a apesar de todos reconhecerem-na como feíssima. E agora quer dela reaver a centena de cartas amorosas, que lhe escrevera com a paixão dos seus vinte anos.
Mas ela, que singrara na carreira política e se tornara numa das principais dirigentes do Partido, nega-lhe esse desejo: essas cartas jamais lhe voltarão a pousar nas mãos...

sexta-feira, setembro 21, 2007

«O pintor e a bailarina»: filme de Valeri Solomin

Não é nada fácil a vida nas margens do Lago Baikal. Pelo menos se nos ativermos na vida de uma família de meteorologistas colocada na ilha de Olchon, espaço sublime em termos de beleza, mas severo quanto às condições de temperatura e de ventania a que ela se sujeita.
Por isso Natália deprime: como o combustível não é pago pela Administração, as horas com electricidade são escassas, obrigando-a a uma contemplação entediada do estado a que chegou a sua vida. O desejo de ser bailarina é uma mera recordação e, se já lhe bastaria, que Youri a abraçasse e a rodopiasse ao som da música por ela trazida para aqueles confins, tem de reconhecer nele a falta de vontade para o fazer.
Por isso fala de divórcio, de vontade de dali se escapar para a cidade.
Irá por diante com esse projecto? Não o sabemos. Mas a teimosia de Youri em ali ficar prenuncia um epílogo definitivo para uma relação, que conheceu decerto melhores dias...

domingo, setembro 16, 2007

Maria Callas -- Habanera (1962)

No dia em que passam trinta anos sobre a sua morte, é oportuno rever Maria Callas nesta interpretação de uma das mais famosas árias da «Carmen».

«MAGNOLIA» de Paul Thomas Anderson

É um regresso a um filme de 1999, que muito me agradou na época.
Estava, por exemplo, esquecido do início, quando diversas coincidências levam a pensar que elas não ocorrem apenas nos livros de Paul Auster: o operador de casino e mergulhador nas horas livres, que acaba na copa de uma árvore, depois de retirado das profundezas pelo avião de combate ao fogo reabastecida no lago adjacente e pilotada pelo jogador com quem se indispusera na antevéspera. Ou o suicida, que acaba assassinado pela própria mãe, quando esta dispara contra o marido numa discussão em que utiliza a espingarda por ele carregada…
Depois há toda aquela gente infeliz: Julianne Moore é Linda Partridge, a desorientada esposa de um moribundo (Jason Robards)remetido a uma cama de hospital; William H. Macy é Donnie Smith, que ainda vive do seu prestigio enquanto criança maravilha dos concursos televisivos e, hoje, incapaz de segurar um emprego ou de agarrar um amante; John C. Reilly é Jim Kurring, o polícia solitário, que ambiciona fazer algo de bom em cada dia, embora saiba quão difíceis são as cenas de vida com que se depara, quando o enviam a alguma morada específica; Tom Cruise é Frank Mackey, o misógino, que ganha a vida em conferências para solteiros a contas com vidas afectivas miseráveis e a quem ensina a destratar as potenciais parceiras; Philip Baker Hall é o apresentador de televisão, a quem a notícia de um cancro convence a procurar a filha perdida nos meandros da cidade; Philip Seymour Hoffman é o enfermeiro, que engana a solidão com o consumo obsessivo de revistas eróticas.
Depois, há tantos outros personagens, que vão cruzando os anteriores e em quem se pressente o mesmo desespero, a mesma tensão…
É claro que o filme é sobre a redenção: cada um irá encontrar as vias para sair do seu estado de perturbação actual e partir para novos projectos de vida, para outros equilíbrios.
Passados estes sete anos sobre a primeira visão, esta revisitação do filme está a significar a recorrência da satisfação de então...

Léo Ferré - La Solitude

A solidão segundo Ferré expressa a distância face aos outros, os conformados com o tipo de sociedade em que vivemos.
Ao contrário de Valéry, para o qual um homem só estava sempre mal acompanhado, Ferré faz da solidão um estado criativo...

11'09"01 - um filme sobre o 11 de Setembro (1)

Era um projecto de Alain Brigand: a abordagem do atentado de 11 de Setembro através da visão distinta de onze cineastas de outras tantas cinematografias mundiais.
O resultado ficou aquém das expectativas, reiterando um princípio fundamental da matemática: nem sempre a soma das partes é igual ou acima de um todo. Aqui o resultado fica aquém do talento de tanta gente interessante.
No primeiro sketch a iraniana Samira Makhmalbaf volta aos refugiados afegãos, que vêm habitando a sua cinematografia, e põe uma jovem professora perante uma plateia de alunos muito jovens, incapazes de perceberem a dimensão global da tragédia de Nova Iorque. Para essas crianças é muito mais palpável a história dos dois homens tombados num poço ou a da tia de uma delas, morta à pedrada na sua aldeia.
No episódio da autoria de Claude Lelouch temos uma fotógrafa muda em vias de perder os encantos do seu amante nova-iorquino, até ocorrer o milagre por ela almejado: ele regressa a casa coberto das cinzas resultantes do desmoronamento de uma das Torres Gémeas aonde iria exercer nessa manhã mesmo o seu mister de guia turístico. E está prometido um recomeço afectivo…
O egípcio Youssef Chahine é assombrado pelo fantasma de um fuzileiro norte-americano vitimado por um atentado em Beirute em 1983. E resulta dessa convivência a demonstração das origens de todos os actos de terrorismo: a atitude imperialista dos norte-americanos…
O episódio bósnio, realizado por Danis Tanovic é dos mais desconcertantes, embora isso não corresponda a uma qualidade. Há um rapaz em cadeira de rodas, que arranja produtos de cosmética para a jovem Selma, depois apresentada como activista da Associação de Mulheres de Srebrenica e principal impulsionadora de uma manifestação de apoio às vítimas do atentado…
Já o pequeno filme de Idrissa Ouedraogo, do Burkina Faso, tem uma consistência muito interessante: a mãe de Adama está tão doente (Sida, provavelmente) e ele desespera em arranjar dinheiro para os medicamentos.
Quando encontra Osama Bin Laden a passear-se pelas ruas de Ouagadougou a perspectiva da recompensa norte-americana de 25 milhões de dólares afigura-se-lhe como solução milagrosa. Mas inacessível, porque o líder da Al Qaeda, ou um sósia seu, acaba por sair da cidade sem lhe dar a hipótese da captura...

terça-feira, setembro 11, 2007

Uma manipulação que enoja

Porque hoje é 11 de Setembro as televisões apresentam muitos documentários de origem norte-americana quase todos seguindo a mesma tónica: a da vitimização de que morreu nesse dia, a do heroísmo dos bombeiros novaiorquinos ou dos passageiros do avião tombado na Pensilvânia e a da diabolização dos inimigos terroristas.
A mentalidade maniqueísta dos filhos do tio Sam pode aceitar passivamente essa abordagem, mas para quem racionaliza o que vê procurando entender outras linhas de força possíveis de se detectarem na sua génese, esse tipo de discurso enoja. Porque serão mais importantes as vidas desfeitas das três mil vítimas do atentado às Torres Gémeas do que as de igual número de jovens soldados, que a estupidez de George W. Bush fez morrer no Iraque?
Serão essas oito mil vidas do que as dezenas de milhar de vítimas da invasão e da ocupação do Iraque pelas tropas comandadas pelo Pentágono?
Acaba por ser um ultraje a ostentação desse discurso de vítimas, quando ele apenas disfarça a manipulação legitimadora da acção política de uma Administração, que mereceria acompanhar os Karadzics e os Mladics dos Balcãs no julgamento por crimes de guerra no Tribunal Internacional.
O que se passou no dia 11 de Setembro de 2001 em Manhattan tem a sua génese muito atrás, quando a vitória da Guerra Fria justificava tudo, até apoiar com dinheiro e armas os militantes islâmicos, apostados em expulsar os militares soviéticos do Afeganistão.
Nenhuma agência estatal norte-americana consegue negar a ligação de Osama Bin Laden à CIA, nem o apoio político e militar aos regimes sauditas e paquistanês, responsáveis pelo financiamento da Al Qaeda e de milhentas madrassas aonde se vão preparando os fanáticos amanhã responsáveis por mais mediáticos atentados terroristas.
Embora abundem muitas teorias da conspiração em relação aos atentados de 11 de Setembro, a pergunta sacramental de Hercule Poirot às suas conhecidas célulazinhas cinzentas não deixa de suscitar algumas perplexidades. Porque entre os negócios da Halliburton e de toda a indústria militar norte-americana - responsável por tantos milhares de empregos em diversos Estados da União - passando pelas agências de recrutamento de mercenários, há muita gente a esfregar as mãos de contente por a Casa Branca ter embarcado tão lesta na história das armas de destruição maciça ou nas ligações de Saddam Hussein com o terrorismo.
A 11 de Setembro não seria mal pensado ver o outro lado da História: o que vitimou tanta gente anónima em função dos interesses particulares da clique da Casa Branca...

domingo, setembro 09, 2007

Goran Bregovic e a Orquestra de Casamentos e Funerais

Terá sido um crime, cujos verdadeiros responsáveis a História se encarregará de descortinar para juntar aos Milosevic, aos Karadzic ou aos Tujmans: quem fomentou a destruição da Jugoslávia? Foi Helmut Kohl? Foi a CIA, que ali via possível ganhar a batal~ha final da Guerra Fria?
E que papel terá tido o Vaticano, tão lesto a reconhecer uma Croácia muito lesta a anunciar a sua segregação do grande país do seu conterrâneo Tito?
A Orquestra de Casamentos e Funerais de Goran Bregovic simboliza o que foi o grande país balcânico, que tanto me sugestinou pela positiva, quando o visitei nos anos 80.
Parecia o país encantado da alegria de viver e, no entanto ... foi a tragédia absurda, que se pode ainda recordar.
Resta o abcesso Kosovo por resolver, mas fica sobretudo a esperança de ver os Balcãs regressar à alegria destes sons...

sábado, setembro 08, 2007

Recordar Luciano Pavarotti

De entre os muitos clips possíveis, escolho este como o da minha predilecção, para evocar o grande tenor desaparecido esta semana...

As Múmias do Vale Dourado

No Verão de 1999, por mero acaso, um habitante do oásis de Bahariya descobriu uma imensa necrópole da época greco-romana.
Como acontece, quando se anuncia uma nova descoberta arqueológica no país dos faraós, logo o conhecido Zahi Hawass se dirigiu para esse recôndito lugarejo a 335 quilómetros do Cairo. Para deparar com dez mil múmias arrumadas em sarcófagos policromáticos.
O evento veio demonstrar como a egiptologia está longe de estar esgotada nas suas principais descobertas: saindo das margens do Nilo, aonde outrora se haviam disseminado as urbes mais desenvolvidas, mas também onde mais facilitado se revelara a actividade dos ladrões de túmulos, existe todo um espaço coberto pelas areias do deserto aonde poderão deparar-se com palácios e túmulos faustosos… com tesouros inesperados.
Há especialistas que vêem nos oásis do deserto líbio os pontos de passagem de caravanas de outros tempos, por onde transitavam ouro, marfim, peles e outras mercadorias preciosas. Que alimentavam um pujante mercado negro cujo controle escapava aos faraós ou aos governadores romanos, que lhes sucederiam…
A descoberta de tais vestígios do passado pode decorrer do acaso, como sucedeu com a necrópole de Baharya, ou pelo facto de se acentuar a erosão nas colinas e montanhas de areia responsáveis pela sua ocultação, deixando-as a descoberto.
A verdade é que, graças ao arsenal tecnológico hoje disponível para analisar os tecidos das múmias, é possível ir muito mais além no conhecimento do estilo de vida desses distantes antepassados. Saber o que comiam, quais as doenças de que padeciam, quanto tempo de vida duravam: é uma questão de imaginação formular tantas hipótese de investigação a que estas múmias acabarão por dar resposta…
Para os escritores, para os cineastas e outros criativos, que utilizarão os dados coligidos por arqueólogos e historiadores, haverá mais matéria para se aproximarem do que, na realidade, era o Egipto do tempo dos faraós...




domingo, setembro 02, 2007

Um folhetim que tarda em acabar...

Na edição de 1 de Setembro de 2007, o «Público» volta a dar voz à Drª Dalila Rodrigues para, em página inteira, retomar os seus já conhecidos argumentos a respeito da política cultural do actual Governo para os museus portugueses.
Depois de Vasco Pulido Valente ter sido tão frontal na forma como considerou justificada a sua não renovação da comissão de serviço à frente do Museu Nacional de Arte Antiga, corroborada por posição similar do Dr. Pacheco Pereira no Blog «Abrupto», e sem contar com a esclarecedora missiva do Dr. Luís Raposo a respeito dos indicadores de desempenho dos principais museus de Lisboa, julgariamos que as opções editoriais do jornal catalogassem de não notícia esta tentativa de ressuscitar o que já está morto e enterrado.
Não é, porém, assim! E lá nos deparamos com os queixumes de quem não entende que a definição das políticas cabe a quem foi eleito para tal e, goste ou não goste, delas caber-lhe-ia como Directora de um Museu tutelado pelo Estado, cumprir essas orientações.
Ao prestar-se ao Carnaval mediático, que meteu mini-manifestações e mini-comícios, a Drª Dalila Rodrigues demonstrou sobejas qualidades para se promover num, razoavelmente bem sucedido, marketing pessoal, mas violou flagrantemente o Código do Trabalho.
Em qualquer empresa privada um director que se insurgisse contra as orientações do Conselho de Administração não conheceria outro destino que não fosse o do Dr. Paulo Teixeira Pinto à frente do BCP. O que ela não se privou de fazer durante meses a fio e em sucessivas ocasiões foi a contestação à tutela a quem deveria sempre lealdade e acatamento de orientações.
Se tivesse a verticalidade do ex-presidente da Comissão Executiva do referido Banco, a Drª Dalila Rodrigues ter-se-ia demitido, ganhando então legitimidade para contestar, de fora, o que em seu entender está a constituir uma política errada. Não foi essa a sua opção: pelos vistos pretendia manter o seu prestigiado lugar e cultivar a sua imagem pessoal numa contínua acção de sabotagem.
A decisão do Governo é, pois, lógica e não poderia tomar outra configuração. A não ser na cabeça da visada e dos seus reduzidos apoiantes...
Mas, neste enquadramento, porque se insiste em querer transformar num escândalo o que não é senão um mero «fait divers» no seio de uma organização, apenas pelo facto dele ocorrer no sector público?
É tempo de a Drª Dalila Rodrigues regressar ao anonimato donde nunca mereceria ter saído...