domingo, agosto 31, 2008

Sigur Ros - Glósóli

Enquanto eles não chegam (o concerto em Lisboa é em Novembro!) vale a pena irmo-nos aqui preparando para essa experiência.
Tanto mais que o videoclip tem imagens de um dos sítios mais bonitos, que conheci:a Islãndia!

UMA VERSÃO RECICLADA DO FIM DA HISTÓRIA

Parece não haver cura para os esforços profetizadores de Francis Fukuyiama.
Depois de errar clamorosamente com o anúncio do fim da História e a vitória incontestada da sua versão de democracia - aquela em que os órgãos de poder e de comunicação social estão concentrados na posse da classe empresarial, assim dotada dos meios julgados necessários para controlar esse statu quo - o guru da direita ocidental vem anunciar a derrota iminente dos autocratas do tipo Putin ou Chavez.
Quanto mais não seja esta nova preocupação de Fukuyiama demonstra bem os incómodos, que os novos senhores do Kremlin ou o líder venezuelano estão a suscitar nos desconsolados epígonos da defunta pax americana.
O que o ideólogo da Administração Reagan e actual professor Universidade Johns-Hopkins em Washington continua a não compreender é a completa subversão da lógica política mundial com o advento das economias emergentes e com a necessidade de garantir novos equilíbrios através de redobrados esforços de negociação.
Que a União Europeia esteja a ser arrastada por uma visão maniqueísta das realidades internacionais, com os russos a fazerem o papel de maus e os Saakashvilis de virtuosos democratas, eis uma grave tendência, que se pode vir a pagar muito caro.
Infelizmente um órgão supranacional, que tem em Durão Barroso o seu líder, não precisa de se caracterizar melhor. Essa liderança revela bem o quão distantes nos encontramos da época em que Jacques Delors personificava por si mesmo um projecto europeu, assente numa lógica federalista e unificadora capaz de transformar a União numa verdadeira superpotência capaz de contrabalançar o poderio das demais.
Impotente nas suas contradições, incompetente à conta da mediocridade dos seus principais governantes (Sarkozy, Merkel, Brown, Berlusconi e uns tantos mais), a União Europeia tenta tornar credíveis as palavras de Fukuyama na expectativa de regressar aos «good old days» em que a História parecia definitivamente escrita e os negócios dos principais oligopólios ocidentais poderiam prosseguir a recato de quaisquer grandes ameaças.
Helás! Tal qual a sua defunta, mas mediática teoria, a actual revisão dela publicada nos jornais desta semana, fará Fukuyama provar, uma vez mais, uma fama de Zandinga. Porque a Rússia veio mesmo para ficar, a China está cada vez mais forte no seu crescimento económico e militar, a Índia e o Brasil vão fazendo o seu caminho e a velha Europa, se não quiser ficar para trás só tem de rejuvenescer os seus líderes e agarrar-se à única hipótese de ser actuante no futuro, que aí vem: a de se dissociar de conceitos neoconservadores e regressar à lógica de uma grande potência entre o Atlântico e os Urais…
O que significa negociar com a Rússia em vez de a diabolizar!

terça-feira, agosto 26, 2008

SÓCRATES BEM MERECE NOVA MAIORIA ABSOLUTA

É cada vez mais notória a decepção de muitos comentadores políticos de direita em relação à estratégia comunicacional assumida pela actual Presidente do PSD.
Reconheça-se a esta uma qualidade: depois do populismo das anteriores direcções do Partido, há que considerar higiénica esta forma de estar na política, muito embora as tentações de demagogia já espreitem, como agora sucedeu com o pedido de demissão do Ministro da Administração Interna por causa de alguns casos de polícia, particularmente enfatizados pelos media a contas com a falta de notícias desta silly season.
Mas, mais do que tal poupança de palavras, o que desnorteia nesta direcção do maior partido da Oposição é o quão contraditórios se revelam os seus valores, quando têm a palavra quem a representa.
Afinal que PSD é este? Defende a Regionalização, como a reivindica Rui Rio? É pela privatização da Caixa Geral de Depósitos como propõe António Borges? Ou é contra uma e outra como parece ser a visão da líder?
A ideia, que este PSD dá é que não sabe o que quer. Pode dizer uma coisa e o seu contrário, de acordo com quem em seu nome se exprime.
Não se trata, pois, de discursos insuficientes, mas de propostas coerentes, o que mais lhe falta. E quando, pelo contrário, o partido do Governo parece saber bem por onde quer ir e que objectivos pretende alcançar, o que mais surpreenderá é se a maioria eleitoral em 2009 não for ainda mais absoluta do que a verificada nas últimas legislativas...

Poudovkine: «Tempestade sobre a Ásia»

No início dos anos 20, durante a guerra civil, o exército inglês, que ocupa a Mongólia, captura um jovem caçador de peles, Baïr, que se colocara ao lado dos guerrilheiros. Encontram nele um amuleto, que pertencera a um lama, e que continha a carta de Gengis Khan, que o faz passar por descendente do célebre conquistador tártaro.
Depois de quase o terem executado, os ingleses decidem fazer de Baïr, um rei fantoche a eles submetido…
Vsevolod Poudovkine figura entre os cineastas de vanguarda que, em prol das ambições propagandísticas do jovem Estado soviético, conseguiram, criar uma notável força lírica no ecrã. Ela é bem notória neste filme rodado em cenários naturais da Mongólia e que fora amputado de muitas das suas sequências contemplativas hoje tidas como fascinantes.
Para celebrar a virtude bolchevique e a sua vitória sobre as forças do Mal, Poudovkine filma homens e lugares com uma inspiração única, visivelmente inspirado pelas infinitas planícies e pelo magnetismo do seu actor principal, Valeri Inkijinov.
E, paradoxalmente, é quando o argumento se dedica a denunciar o peso das tradições e das crenças, a verdade etnográfica de algumas cenas rodadas, de forma documental, num mosteiro budista, que o filme mais impressiona por nos dar a ver, a um século de distância, como se vivia na Mongólia nos anos 20.

***

É uma evidência, que poucos podem contestar: na história do cinema um dos seus períodos mais gloriosos aconteceu na União Soviética de José Estaline.
Nessa época, realizadores da dimensão de um Eisenstein, de um Dziga Vertov ou de um Poudovkine inventaram o cinema e deram-lhe a gramática essencial, que ele assumiria durante todas as décadas seguintes.
Até um notório fascista como António Lopes Ribeiro não se privou de colher em tais realizadores muito do seu saber, depois por ele investido em glória de Salazar.
A oitenta anos de distância os propósitos propagandistas de um filme como «Tempestade na Ásia» deixaram de ter a importância de então, embora sejam elucidativos quanto à forma como era então encarado o marketing político numa lógica de agitação e mobilização de quem deveria construir o novo regime. Mas, mesmo para quem torça o nariz a uma tão evidente defesa dos ideais comunistas, a beleza estética do filme de Poudovkine não pode deixar indiferente. Porque se trata de um monumento sob a forma de imagens em movimento. E as mais básicas preocupações culturais deverão sugestionar o potencial espectador para se render ao prodígio estético das imagens colhidas nos cenários naturais da Mongólia durante a primeira década da Revolução de Outubro.

segunda-feira, agosto 25, 2008

Catherine Sauvage - Special

É outro dos nomes quase esquecidos da música francesa da época de ouro dos anos 60 e 70.
Catherine Sauvage bem merece ser recordada como uma das grandes vozes dessa época.

No desaparecimento de António Charrua

Gostaria de ter sido mais consagrado, mas morreu quase no anonimato. Era o pintor António Charrua e dedicava-se sobretudo a temas abstractos.
Numa das suas convicções ele reconhecia que «toda a pintura dita moderna apela a uma nova construção do espaço que tem a ver mais com o que sabe do que com o que se vê».
É, de facto, uma constatação com que não posso deixar de concordar: quando me deparo com peças contemporâneas não se me coloca normalmente um gosto estético ligado á sua expressão, mas o quanto ela se interliga com outras referências culturais ou sociais, que lhe conferem o seu verdadeiro sentido.
Não se gosta de tais peças pela sua beleza, mas pelo seu significado.

domingo, agosto 24, 2008

Rubem Fonseca: «A Festa»

O início lembra «Mrs. Dalloway», a excelente novela de Virgínia Woolf sobre uma mulher de estatuto social elevado que organiza uma festa em sua casa e, através dela, compreende não só o quão vazia foi a sua vida, como o quanto ela poderia ter sido diferente se, num passado distante, houvesse seguido as inclinações do seu coração.
Mas Maria Clara Pons, a personagem do conto «A Festa» de Rubem da Fonseca, depressa perde protagonismo, entregando-o aos vários convidados da sua festa. Que têm a futilidade esperada em quem frequenta ocasiões sociais apenas ditadas pela obrigação de aparecer e de partilhar conversas estereotipadas com quem rivalizam em afirmação de sucesso.
O inesperado surge pela morte súbita de um dos convidados. Mas nem esse corpo sem vida perturba a convivencialidade instituída. Quem estava a dançar, a beber copos ou a conversar, continua a fazê-lo sob o álibi de se tratar assim de o homenagear como se ele continuasse a partilhar toda aquela fingida animação.
No entanto, que mais perturbador para aquela gente, do que a morte enquanto elemento perturbador das suas certezas. A morte, que desarticula todas as vaidades e transforma em nada o tremendo vazio daquelas vidas.
Mas todos os convidados da festa iludem esse íntimo receio de se confrontarem com a sua inevitabilidade enquanto partilham uma experiência colectiva.
Quando se coloca a possibilidade de participarem no funeral de Casemiro todos desaparecem apesar das promessas em comparecerem.
Tão solitária quanto terá sido a sua passagem pela vida, também o corpo do conviva baixa à terra na maior dos desamparos.
O conto de Rubem da Fonseca acaba por constituir uma crítica mordaz a uma classe social abastada, mas tão gelatinosa de personalidade, quanto ausente de genuínos sentimentos...

sábado, agosto 23, 2008

RUBEM FONSECA: «A CONFRARIA DOS ESPADAS»

O primeiro conto do livro é elucidativo sobre o conteúdo misógino de alguns textos de Rubem Fonseca. Através das cartas de um assassino de mulheres para a sua provável vítima seguinte questionamo-nos sobre as razões psicológicas assumidas por algumas pessoas para quem a sua morte, através de um qualquer ritual, corresponde a uma certa forma de realização.
Sacrifícios religiosos houve-os em diversas civilizações ao longe de toda a História da Humanidade. Ainda hoje, sob a forma de terroristas suicidas persiste essa forma extrema de dar sentido à vida, nem que seja em prol de uma causa política ou religiosa, já que se prometem recompensas indizíveis num mirífico Além.
Mas, mesmo nas nossas sociedades menos fanatizadas, dominadas pelo racionalismo cartesiano, que razão poderá levar um homem a dar-se a outro a comer literalmente como sucedeu ainda não há muitos anos na Alemanha?
Não posso, pois, compreender esta forma de livre arbítrio, que motiva as vítimas do narrador do conto do mesmo nome a se tornarem cúmplices da sua obsessão. Tanto mais, que terão passado pelas exigentes provas de pré-selecção a que ele as terá submetido e que comprovou o quanto elas prezavam a vida e a quanto nela se sentiam felizes.
É o absurdo sob a forma mais incompreensível. Ainda que o conto sirva igualmente para confirmar o domínio superlativo do autor quanto ao uso da nossa língua.

Serge Gainsbourg - Les Feuilles Mortes

Começo aqui a evocação de um dos discos mais memoráveis que, em tempos, conheci.
Estava em 1975 e em França o meu ex-cunhado dava-me a conhecer um album com 20 canções de ouro. Esta era uma das canções aí presentes. Tendo a peosia de Jacques Prévert como estímulo e a voz do imenso (em talento) Gainsbourg...

terça-feira, agosto 19, 2008

Casa das Penhas Douradas (6)

O maior obstáculo a uma eventual vontade de mudança para a Serra é a distância a que fica do litoral.
Não é impunemente que se nasce e cresce junto ao mar, que durante anos nele se mergulha para ganhar o sustento e, mesmo depois, já dele perdidas as graças, que não se o deixa de pressentir bem perto no voo cauteloso das gaivotas sobre o tecido urbano, quando se lhe adivinha grossa tempestade.
Por razão fundamentada se passou a designar por Beira Interior o que antes nos ensinaram como sendo Beira Alta ou Beira Baixa.
O que distingue estas terras de grandes contrastes entre montes e vales é esse divórcio da orla maríima. Mesmo que para ela lhe envie as águas dos rios, que brotam das suas nascentes!
Não lhe faltam, pois, essas águas aqui e ali recolhidas em represas, que simulam vastos espelhos azuis à volta dos quais balem as ovelhas e os carneiros.
Mas são espelhos com fronteiras bem demarcadas, que nunca dão azo à sensação de infinito colhida nas praias atlânticas. Se nestas se pode metaforizar a liberdade sem entraves, nas paisagens serranas colhe-se o pressentimento claustrofóbico de sobrarem limites. E a própria cor do granito evoca uma austeridade luterana, feita de medos e preconceitos.
É por isso que não acederia facilmente a uma vida na Serra. Por muito que se revelem agradabilíssimos os dias de férias aí vividos.

domingo, agosto 17, 2008

Um bispo como presidente do Paraguai

Enquanto a Europa vai elegendo governos de direita, que não conseguem trazer quaisquer soluções para a crise económica nela em curso, a América Latina vai enterrando de vez o seu passado recente manchado por ditaduras execráveis e elegendo novos líderes assumidamente de esquerda.
Que pese embora o incómodo causado a neoliberais de pacotilha, vão aprofundando as suas bases de apoio nos respectivos países.
Hugo Chavez continua a liderar o maior produtor de petróleo do continente sem que a burguesia de Caracas o consiga apear.
Lula demonstra com indicadores económicos o quão positiva tem sido para a maioria dos brasileiros a sua governação.
Na Bolívia o índio Morales superou com distinção a tentativa golpista da burguesia em vergá-lo e venceu o recente referendo com mais 10% de votos do que ocorrera no anterior escrutínio para a Presidência.
E há que contar ainda com o Equador ou com a Nicarágua, aonde governos de esquerda vão secundando esta viragem à esquerda, que poderá até ter consequências em Cuba, aonde Raul Castro experimenta via de afirmação do regime, aligeirando-o das suas características mais contestáveis para melhor defender o projecto de quem com ele esteve heroicamente na Sierra Maestra.
Cabe agora a vez a Fernando Lugo no Paraguai de quem se espera o sucesso, que está a ocorrer com alguns dos seus colegas latino-americanos.
E, enquanto antigo bispo, ele vem imbuído de uma filosofia cristã, que se julgaria marginalizada: a de uma Igreja orientada para a valorização dos mais pobres, dos mais desprotegidos face a uma classe cuja visão capitalista a transforma na cúpida e pecadora representação do que de mais diabólico deveria ser estigmatizado pelos servidores do Vaticano.

Casa das Penhas Douradas (5)

O que representa a Serra da Estrela no nosso subconsciente colectivo?
Em meninos ouvimos falar da bravura de Viriatos e Sertórios, capazes de darem a volta ao miolo dos bem organizados romanos, impedindo-os, anos a fio, de aqui cumprirem a sua colonizadora ideia de civilização.
Já então esta gente era tão teimosa quanto rude. Como se a rijeza dos granitos forjasse os tecidos de que são feitos os seus ossos e as suas carnes e o rigor das invernias acentuasse essa tendência para se fecharem entre as cumeadas, vendo com desconfiança quem a elas aportava.
E, no entanto, grandes eram as riquezas aqui produzidas: já na sua «Tragicomédia Pastoril da Serra da Estrela» Gil Vicente punha uma personagem - Serra - a listar a profusão de animais e produtos deles derivados com que poderia obsequiar os reis de então em preito de vassalagem pelo nascimento da infanta D. Maria.
Em anos mais próximos de nós radicava-se aqui uma forte indústria de lanifícios, que transformou em operários, quem só tinha até então os campos para trabalhar.
E, depois, foi o inevitável apelo das lonjuras. Primeiro para as promessas de vida fácil da cidade que, tão só esfumadas, deram origem a um fluxo de gentes daqui para tantas diásporas.
A Serra ficou ameaçada de abandono. Tanto mais que nem a altura dos seus cumes possibilitava a espessura das neves procuradas por turistas de Inverno para os seus tombos nos esquis.
A Serra tornou-se, assim, o local de atracção estival das excursões de fim-de-semana de grupos de pelintras ou de episódicas visitas de uma pequena-burguesia aí apostada em pisar, por uma vez, o proclamado sítio mais alto do país.
E, no entanto, a tal como o resto do planeta, também a Serra se move. E torna-se mais atractiva mediante investimentos destinados a um mercado mais abonado, capaz de sustentabilizar uma ocupação contínua dos seus equipamentos hoteleiros…
Há dias, na televisão, dizia-se que a Serra está com muitos mais visitantes neste Verão. Que as camas de hotéis estão quase esgotadas!
Prémio merecido para quem nos convida a descobrir cenários que nos tolhem a respiração, tão belos são.
E que valem a pena ser explorados mais do que episodicamente numa vida, que se quer preenchida...

Bartali - Paolo Conte

É um dos cantores, que sempre aprecio.
Há dias passou pelo Algarve, mas de pouco se soube desse concerto destinado a aligeirados veraneantes pouco dados às subtilezas da poesia do cantor.
Pena não ter subido até Lisboa, aonde outro público de apreciadores o poderia consagrar...

sábado, agosto 16, 2008

Shara Worden: March 2008

Uma voz a descobrir? Até agora Shara Worden era-me completamente desconhecida. Num jornal leio que a sua presença é anacrónica de perfeição e profundidade. Será?

Don't Go Down to The Quarry - Peter, Paul and Mary

Kings of convenience - Winning a battle, losing the war

Esta dupla norueguesa anda por estes dias a actuar no nosso país.
Não é que o seu estilo melódico e delicado me agrade por aí além. Mas fica aqui um exemplo do que costuma caracterizar as suas canções...

The Corrs-Dreams

Num DVD com os Chieftains encontrei um tema de colaboração desse mítico grupo irlandês com este conjunto pop.
Porque não tem sido frequente dar aqui espaço no blogue a um tipo de música mais ligeira, aqui fica «Dreams» só com as Corrs.

domingo, agosto 10, 2008

A VACUIDADE DOS ANTICHINESES MILITANTES

O artigo de Orville Schell publicado no The New York Review of Books, e agora traduzida na edição dominical do Público, é bastante elucidativo sobre o estado das idiossincrasias chinesas neste momento de exaltação nacionalista relacionado com os Jogos Olímpicos. Sobretudo, porque explica a vacuidade dos esforços de alguns activistas tontos, apostados em campanhas pró-Tibete ou pró-Direitos Humanos (embora se preocupem muito pouco com os mesmos objectivos nas sociedades ocidentais donde emergem!), que só conseguem aumentar a ligação dos chineses ao seu Governo.
Não foi preciso ter vivido em Xangai durante mês e meio em 1998 para sentir uma profunda admiração por esse povo extremamente voluntarioso, capaz de mover montanhas para chegar aos seus objectivos. Características muito preferíveis às desses monges oportunistas, liderados pelo Dalai Lama, e que aproveitando crenças religiosas, levam pobres camponeses a partilharem com eles o exíguo resultado do seu labor.
Entre os dirigentes chineses e esse sacerdote budista, a minha simpatia vai indubitavelmente para os primeiros. Não por serem comunistas que, decerto, não são. Mas, sobretudo por terem tido a arte de conjugar os vastíssimos milhões de pessoas para um objectivo fundamental: o de conseguirem melhorar de forma significativa os seus padrões de consumo mediante um crescimento económico capaz de atemorizar seriamente os ocidentais.
Os Jogos Olímpicos, que estão a decorrer, confirmam o sucesso de um país, capaz de reinventar uma antiga citação de Mão Zedong: ao suscitar uma Grande Desordem debaixo dos céus, a China está a subverter os fundamentos do capitalismo ocidental. E isso é excelente: talvez se assista ao nascimento de algo de novo. De revolucionário!

sábado, agosto 09, 2008

O DESESPERO DE UM ANÃO

Mikheil Saakashvili não é flor que se cheire. Só daqui a uns anos saberemos das suas ligações à CIA e à óbvia tentativa norte-americana de, com o conluio da NATO, cercar a Rússia com regimes hostis à sua volta.
Durante um par de anos, o actual presidente georgiano conseguiu iludir o seu povo prometendo-lhe uma clara melhoria dos seus padrões de vida à conta da sua proclamada amizade com os norte-americanos e, sobretudo, com George W. Bush.
No entanto, à medida que essas promessas iam sendo denunciadas como vãs ilusões, Saakashvili ia ficando cada vez mais nervoso. Começou a reprimir manifestações oposicionistas. Para já não falar do candidato, que contra ele concorrera nas eleições presidenciais e que foi liminarmente assassinado…
Agora que antevê mudanças na Casa Branca e um mundo cada vez mais influenciado no seu curso pelo ressurgimento da Rússia de Putin, ele sabe terminado o tempo de vida da sua carreira política. Tentou, pois, o desesperado salto em frente, esperançado que a NATO acorresse em seu socorro.
Ao avançar para territórios, que têm tanta (falta de) legitimidade para se tornarem independentes quanto o Kosovo, o resultado está à vista. A derrota adivinha-se e a Rússia não deixa de mostrar o quão energeticamente dependente está a Europa da sua boa vontade.
O bombardeamento de um oleoduto no Caúcaso funciona como óbvio aviso a quem tiver veleidades em se imiscuir no quintal das traseiras de Moscovo...

quarta-feira, agosto 06, 2008

AS LIÇÕES DE RANDY PAUSCH

Esta foi a semana em que morreu Randy Pausch, o professor universitário norte-americano saído da pior maneira do anonimato no ano transacto, quando, já anunciado o estado terminal do seu cancro no pâncreas, proferiu a sua derradeira lição, plena de sabedoria sobre o que é relevante na vida de cada um de nós.
Das suas citações mais celebrizadas pelos media, escolho duas, que me parecem particularmente felizes. Numa delas, Pausch definia argutamente o que é experiência: «é o que se consegue, quando não se alcança o que se desejava».
E, de facto, a vida está recheada de tiros desviados dos alvos para que se apontou. Se não se acerta na «mouche» de cada vez que se tenta mais sabedoria se tem para aferir a pontaria e aproximá-la tanto quanto possível do que se pretende.
Como lembrava Joseph Conrad (citado por Lobo Antunes na sua crónica semanal na «Visão») «tudo o que vida nos pode dar é um certo conhecimento dela que chega tarde demais».
Mas a outra citação de Randy Pausch não deixa de ser igualmente elucidativa da sua filosofia de vida: «Os obstáculos existem por alguma razão. Não para nos afastar, mas para que possamos mostrar em como queremos algo.»
E, de facto, um dos grandes argumentos diferenciadores sobre o carácter de alguém reside na sua determinação: são os teimosos, os que não baixam os braços perante as dificuldades, quem maior probabilidade possuem de alcançarem o outro lado do arco-íris. Porque, aos pusilânimes, aos que passam o tempo a ver o mar mais alto do que a terra, nem um bambúrrio de sorte os poderá guindar ao sucesso.

terça-feira, agosto 05, 2008

Casa das Penhas Douradas (4)

A sala de refeições esclarece que tipo de pessoas deverão ser cativadas para o projecto. Quatro mesas pequenas encostadas à parede das traseiras, aquela de cujas janelas se vêem as serranias distantes. Mesas, que se destinam aos casais aqui à procura de reviver cenários de excepção para reacender chamas esmorecidas nas rotinas do dia-a-dia.
Para quem escapa a tal regra, sobra a mesa grande do centro da sala, destinada a grupos mais heterogéneos.
Depois há a comida confeccionada segundo os preceitos da nouvelle cuisine adaptados aos sabores nacionais num resultado desigual, ora surpreendente pela novidade, ora repetitivo pelo recurso, dia após dia, a uma mesma lógica de recurso a produtos de custo moderado decorando-os de forma a épater le bourgeois.
Que resulta não duvidemos: numa das refeições deu para ouvir enfáticos elogios aos cozinheiros, como se deles só surgissem ágapes divinos, daqueles que até seriam capazes de assombrar o próprio Deus.
De elogiar sim o profissionalismo de quem nos serve, um homem de singular polivalência, pois cumpriu as mais diversas tarefas de apoio aos residentes enquanto ali estivemos.
De nome Paulo, ele desiludira-se com a sua passagem de vários anos pelas Pousadas de Portugal, antes de ali vir a aterrar como verdadeiro anjo da guarda de quem ali se recolheu, ciente de assentar arrais no Purgatório com vistas para o prometido Paraíso...

domingo, agosto 03, 2008

UM PARTIDO EM ESTADO CATATÓNICO

«Mero fenómeno de refracção da luz». É assim, que Emídio Rangel classifica o actual CDS, algo assimilado a uma inexistência de per si.
E, no entanto, não está muito afastado no tempo esse passado em que a chegada de Paulo Portas ao cargo de primeiro-ministro parecia uma inevitabilidade mais ou menos óbvia, tanto mais que a passagem do seu émulo no PSD, Santana Lopes, se denunciava a sai mesma como sinónimo de incompetência.
Agora são muitos os sinais de desagregação do partido, que ameaça regressar à dimensão do táxi com que, em tempos, os seus escassos deputados chegavam à Assembleia da República.
Em Setúbal, Carlos Dantas demite-se e arrasta consigo muitos dos militantes, que acreditavam na democracia interna para a escolha das futuras listas eleitorais. De férias no Algarve, Celeste Cardono espanta-se por ainda sobrarem algumas dezenas de militantes nesse distrito. E Narana Coissoró não se exime de proferir mais umas quantas farpas por conta das comparações entre o que valia o partido no tempo de Ribeiro e Castro e o que hoje valerá.
Parece, assim, condenado o futuro político do antigo director do «Independente». A quem já nem se consegue encontrar no discurso outra estratégia, que não passe pela contradição entre a defesa dos mais pobres pensionistas e reformados e a condenação xenófoba de outros não menos desvalidos a quem a sociedade empurrou para guetos sem cuidar da sua inserção social…
Um discurso vazio de quem já está em estado politicamente catatónico...