domingo, julho 31, 2011

Old Joy (theatrical trailer)

Filme: OLD JOY de Kelly Reichardt (2005)

Não se assemelha em nada a um filme norte-americano, mas é-o e data de 2005. E, não o explicitando, remete para uma estética conhecida no tailandês Apichatpong Weerasethakul quanto à paisagem luxuriante, ao papel dos sonhos e ao erotismo homossexual.

A história pode-se resumir a muito pouco: apesar do desagrado da companheira, que está no fim da gravidez, Mark aceita o convite do seu amigo Kurt para irem acampar na floresta, num sítio maravilhoso aonde existem nascentes termais.
Pelo caminho perdem-se, são obrigados a dormir longe de tudo e só chegam ao objectivo no dia seguinte. Aí tomam banho, Mark recebe uma massagem de Kurt (e é nessa sugestão erótica, que se justifica a ambiguidade do relacionamento entre ambos!) e regressam. Sempre acompanhados pela cadela Lucy!
É, pois, um filme em que quase nada se passa, mas evocativo da amizade e do tempo que passa… e com nuvens, que remetem, igualmente, para uma citação fotográfica inevitável: os trabalhos de Ansell Adams...

sexta-feira, julho 29, 2011

A Scandal in Bohemia Part 6 of 6 (Sherlock Holmes)

Conto: UM ESCÂNDALO NA BOÉMIA de Conan Doyle (1891)

O misógino Sherlock Holmes seria superado por uma mulher no conto «Um Escândalo na Boémia». Chamava-se Irene Adler, fora cantora de ópera mais ou menos conhecida e uma aventureira capaz de arrebatar corações dos mais inusitados amantes.
Um deles fora o herdeiro do trono da Boémia, que sucedera, entretanto ao pai e pretende agora casar com uma princesa sueca, tão devota quanto virtuosa. E que poderia negar o consórcio se descobrisse as fotografias comprometedoras com que Irene Adler ameaça agora impedi-lo.
Bem o rei procurara apossar-se dessas provas mediante dinheiro, roubos e outros estratagemas, que só lhe resta contratar Sherlock. E este não desmerece da sua fama, utilizando, sobretudo, os seus recursos histriónicos.

Mas, antes que o veja alcançar o que pretende, Irene zarpa de Inglaterra com o seu novo marido, deixando uma carta em que promete nada mais fazer contra o antigo amante. Até porque o actual se revelava bem mais bem dotado para o seu contentamento…
Caberá a Sherlock reconhecer a derrota perante uma mulher admirável… que passará a designar por «a mulher». Como se fosse única no seu modelo...

segunda-feira, julho 25, 2011

Conto: HUBERT E MINNIE de Aldous Huxley

A literatura está bastante enriquecida com romances, novelas e contos sobre amores frustrados. A fórmula A ama B, que está em vias de se apaixonar por C é um bom esquema para explicar esta história curta de Aldous Huxley.
Neste caso A é Minnie, uma rapariga quase trintona, pouco atraente (com o cabelo baço, as maçãs do rosto muito vermelhas e corpulenta) e a viver as carências hormonais com tal evidência, que é a própria amiga Helen Glamber a sugerir-lhe sexo puro e duro com o namorado. Até porque esta última terá descoberto que as fêmeas dos furões morrem se não fornicam de vez em quando.

Só que o namorado, o B desta história, é Hubert, um rapaz acabado de sair da adolescência, bastante mais novo do que ela e em vias de descobrir a inconstância dos afectos. Até porque lhe aparece no horizonte a ruiva Phoebe por quem se passa a interessar com outro entusiasmo.
E é precisamente no encontro em que está disposta a oferecer-lhe a virgindade, que Minnie desperta para a súbita falta de interesse de Hubert: e então foi o silêncio apocalíptico, o silêncio sem um único som tomou o lugar do outro silêncio que era um som ininterrupto. Abismos sem fim abriram-se em volta dela; estava só. Através do vácuo sem ruídos, uma abelha retardatária arrastou o seu fraco zumbido; os pardais chilrearam; e através das águas chegou o som de vozes e risos longínquos. Como se tivesse despertado de um sonho, Minnie pôs-se a olhar e a escutar amedrontada, voltando a cabeça de um lado para o outro.

segunda-feira, julho 18, 2011

rouxinol e a rosa

Conto: O ROUXINOL E A ROSA de Oscar Wilde

Pobre rouxinol o desta história trágica de Oscar Wilde: embora goste tanto da vida, aceita morrer com um espinho cravado no coração para que o seu canto e o seu sangue produzam o milagre da mais bela das rosas vermelhas criadas ao luar. Será essa a flor através da qual um pobre estudante acredita chegar ao coração da sua amada a quem sonha levar ao baile da noite seguinte.
Mas à rosa tão arduamente criada ela preferirá as jóias do sobrinho do camareiro a quem efectivamente acompanhará no evento dessa noite.
A rosa acaba esmagada pelo rodado de um carro na poça de água para onde o desiludido estudante a atirara, concluindo: que coisa estúpida é o amor. (…) De nada serve a lógica, porque nada prova: conta-nos sempre coisas que nunca sucederão e faz-nos acreditar em coisas que não são verdadeiras.

Conto: AMOR de Anton Tchekov

Sabe-se como Anton Tchekov não terá sido particularmente feliz nos seus amores, particularmente com a actriz Olga Knipper com quem esteve casado vários anos. Por isso mesmo a perspectiva do narrador a respeito do seu noivado e posterior casamento com a frívola Alexandra não deixa margem para dúvidas: incapazes de sentimentos profundos, as mulheres guiam-se muito mais pelas aparências, pelo estatuto que a condição de noivas ou de casadas lhes garantem.
Comparando Alexandra com um rapaz da mesma idade, o narrador imagina o quão aprofundadas seriam as conversas e a partilha de conhecimentos possíveis neste último caso.
Com Alexandra, pelo contrário, imperam as trivialidades.
Conclui-se que Tchekov tem uma perspectiva assaz misógina dos sentimentos femininos.

Conto: O ENIGMA DE REIGATE de Arthur Conan Doyle

Holmes acaba de resolver um mediático caso no continente e, a convite de um croronel amigo do seu companheiro Watson, vai descansar uns dias para o campo. Mas um roubo numa propriedade vizinha e a morte violenta do cocheiro noutra, vai pôr à prova os seus dotes histriónicos já que fingirá crises de nervos para se apossar das provas esclarecedoras da culpabilidade de uns nobres locais, os Cunningham, quer na tentativa de roubo, quer no homicídio do seu próprio empregado.
Em causa estava uma disputa por terras, que os colocara na condição de chantageados pelo morto quanto ao primeiro daqueles delitos em que bscavam documentos passíveis de lhes garantirem o sucesso em tribunal.

Sherlock Holmes - The Case of the Cunningham Heritage (1954)

Conto: O PACIENTE INTERNADO de Arthur Conan Doyle

Neste caso Trevelyan, um jovem médico de Brook Street, recorre a Holmes para apurar o que se passa com o seu senhorio e associado cujo quarto terá sido devassado por um acompanhante de um dos seus pacientes durante duas consultas consecutivas.
O caso agudiza-se, porém, quando esse Blessington surge enforcado no tal quarto. E Holmes acaba por deduzir ter sido ele o elemento traidor de uma conhecida quadrilha de larápios, salvando-se da prisão ao entregar os cúmplices, agora decididos a vingarem-se quinze anos depois, tão só saídos do cárcere…

Sherlock Holmes: Funny bits from The Resident Patient

domingo, julho 17, 2011

Conto: O PROBLEMA FINAL de Arthur Conan Doyle

Comecemos pelo fim: a morte de Sherlock Holmes perto da aldeia alpina de Meiringen, precipitado no abismo pelo temível Moriarty cuja quadrilha desmantelara em Londres.
A descrição de Watson mostra a obsessão paranóica do amigo por esse criminoso tão arguto quanto ele e capaz por isso mesmo de antecipar os passos dados pelo detective.
Curiosa, igualmente, a condição de casado do narrador, que não desmente a lógica homossexual da sua relação com o protagonista por quem os sentimentos expressados são muito mais evidentes do que pela sua quase ignorada esposa.

Sherlock Holmes: The final problem part 1

terça-feira, julho 12, 2011

Filme: RIEN QUE LES HEURES de Alberto Cavalcanti

O que é hoje o filme «Rien que les heures» não será propriamente o que Alberto Cavalcanti concebeu e filmou em 1926: sem uma cópia fiel do que ele fora na origem, coube às cinematecas possuidoras de algumas bobinas de tal filme recriar a partir daí o que ele poderia ter sido. Assim, embora atribuível a Alberto Cavalcanti, este filme acaba por ser a montagem de várias bobinas por ele rodadas para o projecto de sequenciar impressões sobre o tempo que passa.
Sem uma história, que ligue todas essas imagens - embora aqui e ali se vão sucedendo alguns casos particulares (por exemplo o da ardina, a quem sai a carta da morte numa previsão, e é depois assassinada por um proxeneta apostado em a roubar) - Cavalcanti capta ricos e pobres como se cada fotograma merecesse o esforço de composição de uma fotografia artística.

O realizador não omite essa ligação às artes visuais aproveitando para mostrar alguns dos quadros de alguns dos seus contemporâneos na cidade-luz. Mas não deixa, por isso mesmo, de olhar para a realidade concreta das parteiras ou das sopas dos pobres, por muito que se lhes sucedam as de beijos apaixonados de pares precursores da célebre fotografia de Robert Doisneau.
Estamos num mundo que já desapareceu, feito de muita pobreza e de um crescente fascínio pela velocidade, que a tudo iria varrer.
Apanhado nesse limiar da mudança, Cavalcanti usa as estratégias experimentalistas mais avançadas do seu tempo. Conseguindo um resultado, que ficará aquém do de Vertov ou de Ruttman, mas igualmente interessante.

segunda-feira, julho 11, 2011

JERICHOW trailer

Filme: JERICHOW de Christian Petzold (2009)

A morte da mãe de Thomas, depois de uma luta inglória contra o cancro no estômago, trá-lo de volta à cidadezinha natal situada no antigo território do leste-alemão. Abandonando o serviço militar, após uma missão no Afeganistão, ele está decidido a remodelar a casa e a aí viver. Mesmo se tem de perder todas as suas economias para um gangue mafioso, que começa por o agredir a propósito de dívidas antigas.
O emprego que ele arranja é o de motorista de um turco, Ali Oezkan, particularmente venerável à bebida e como tal impossibilitado de conduzir a viatura, que lhe permite fazer a ronda das quatro dezenas de snack-bars sob a sua gestão.
Além de motorista, Thomas serve-lhe também de guarda-costas, quando o perigo se anuncia na forma de empregados apanhados em flagrante delito de trapaça dos rendimentos suscitados pelo negócio.
Mas Ali está casado com Laura, a quem impôs um draconiano contrato matrimonial antes de se conjugalizarem: em caso de divórcio ela permanecerá ameaçada pela dívida de 142 mil euros contraída junto de bancos numa época em que também passara dois anos encarcerada numa prisão estatal.
Será que a paixão crescente entre Thomas e Laura é genuína? Pode-se duvidar, quando se descobre que ela tem um caso com um contabilista, com quem montara um esquema para enganar o marido. E, sobretudo, quando ela convence Thomas a assassinar Ali como forma de se libertarem da sua presença e ficarem livres para o que se seguir.
Mas, Ali está muito doente a só lhe restam dois meses de vida. Assim, desmascara o plano dos dois amantes e atira-se, ele mesmo, do alto de um precipício para a praia
Ficamos sem saber as respostas para as nossas dúvidas quanto à genuinidade ou não dos sentimentos expostos.
Mas será que essas respostas teriam assim tanta pertinência? O que está em causa é o desfasamento dos sentimentos entre personagens…

Livro: VOO NOCTURNO de Antoine de Saint-Exupéry

Saint-Exupéry publicou Voo Nocturno em Dezembro de 1930, ganhando o Prémio Fémina no ano seguinte e tornando-se um dos primeiros romances a integrar a conhecida colecção dos Livres de Poche (é o nº 3).
A acção passa-se na América do Sul, quando se vivem os tempos heróicos da aviação comercial. Saint-Exupéry conhecia bem essa realidade, porquanto fora, no ano anterior, o director da Aeropostal da Argentina, de alguma forma o mesmo posto cumprido por Rivière, o protagonista da história.
O principal objectivo de Rivière é o de provar que o avião é um meio de transporte mais rápido do que o comboio para o transporte do correio desde que os seus pilotos voem durante a noite, ganhando-se assim o tempo eventualmente perdido durante o dia.
Fabien, um desses pilotos, voa entre o extremo sul do país e a capital, quando é apanhado por uma violenta tempestade, que o impedirá de alcançar o seu destino. O seu sacrifício é o preço do sucesso da estratégia de Rivière, que incute nos seus homens o arrojo perante as vicissitudes, não temendo a morte e levando até aos limites o cumprimento da sua missão.
Eles deverão agir como se ela tivesse mais valor do que o da própria vida humana: o correio é sacralizado e deve sempre chegar a horas ao seu destino. É essa a responsabilidade dos pilotos, o sentido do que fazem.
Para Rivière é indiferente, que considerem ou não justa essa perspectiva. Por isso é inflexível com o velho mecânico a quem despede após vinte anos de bom desempenho por ter cometido um erro na montagem de um motor ou arrogante para com o piloto, que chegou a vacilar no meio de uma tempestade.
Mas o confronto com a mulher de Fabien, que lhe vem exigir notícias sobre o seu desaparecido marido, perturba-o, mesmo se nada lhe chega a dizer de concreto. Mas ela sai dali a compreender quão vã é a mitigada esperança com que ali chegara.
Para Rivière existe uma incompatibilidade entre o amor e o dever por muito que, um e outro, façam sentido. E, apesar da perda de um aparelho e da respectiva tripulação - o que para ele constitui dolorosa derrota - ele não suspende nenhum voo para que a causa dos voos nocturnos não seja equacionada.


O testemunho de Saint-Exupéry sobre a vida dos pilotos de linha regular está despojado de qualquer literatura, retratando uma experiência de vida e como ele e os colegas estavam prontos a renunciar aos interesses individuais em nome de uma causa legítima.
A obra serve para definir dois tipos de homens: o chefe que forja vontades e o indivíduo incumbido de cumprir ordens aceitando os riscos inerentes à sua actividade. Entre uns e outros não existem relações de patrão e de escravo, mas de homem para homem, consistindo a liberdade em cada qual se mostrar submetido ao seu conceito de dever. É no respeito por esse constrangimento que tomam consciência da grandeza e através da acção, que estão em condições de a interligar a esse sentido do dever. Essa é a conclusão lógica do livro e que anuncia os princípios em que Saint-Exupéry fundamentará a sua ética tão presente nas suas obras posteriores.

sábado, julho 09, 2011

Documentário: SEM LUTA NÃO HÁ VITÓRIA de Jeanine Meerapfel (2008, 52 min)

Pode ser uma antevisão do que será o nosso país depois do delírio liberalizador de Passos Coelho: vivia-se bem na região argentina de Mosconi, aonde a industria petrolífera e mineira têm relevância económica.
Graças à aplicação dos princípios do Estado-Providência a escola e a saúde eram gratuitas e o pleno emprego uma realidade.
Depois das privatizações dos anos 90 do século passado, o desemprego massificou-se e o ambiente sofreu danos gravosos para a saúde das pessoas. Fecharam escolas e hospitais e as novas doenças, até então desconhecidas, resultam de picadelas de mosquitos, que surgiram quando a desflorestação desertificou a paisagem.
São accionistas estrangeiros quem explora essas riquezas sem pagarem quaisquer impostos, quer para a região, quer para o próprio país. Trata-se de uma autêntica extorsão das riquezas nacionais por parte de multinacionais estrangeiras, suportadas por políticos corruptos e ideologicamente rendidos a modelos desastrosos.
A realizadora acompanha os militantes da UTD, organização de desempregados, nascida em 1996, que tenta inflectir o curso dos acontecimentos. E empresta-lhes a máquina de filmar para que sejam eles a captar os testemunhos da sua luta.

Que ora se orienta para bloqueios de estradas e confrontos com a polícia de choque, ora para a construção de residências comunitárias ou para a criação de empresas colectivas.
Resolver o emprego para tantas pessoas quanto possível, eis o propósito de uma organização, que não baixa os braços e encontra formas criativas de resistir. Mesmo sem qualquer apoio do Governo: pelo contrário juízes, polícias, grande patronato, todos se conjugam para reprimir este movimento que, na origem, só exigia trabalho para todos…
Temos, pois, aqui um exemplo de uma luta que vale a pena conhecer até pelo exemplo de coragem dos líderes da UTD, alvos sistemáticos de tentativas de atentados.
É que, como lembrava Mao, a revolução não é nenhum convite para jantar. E quem vai à guerra, dá e leva!

Nigel Kennedy - Bach - BWV 1042 - I - Allegro

domingo, julho 03, 2011

A Morte de George W Bush (Death of a president, 2006) - TRAILER OFICIAL

Filme: MORTE DE UM PRESIDENTE de Gabriel Range

Em 19 de Outubro de 2007 o presidente George W. Bush chega ao aeroporto O’Hare, em Chicago, para um encontro com empresários e políticos republicanos no Hotel Sheraton, aproveitando a ocasião para um sério aviso à Coreia do Norte a respeito da sua estratégia nuclear.
Estando em maus lençóis nos teatros de guerra por si escolhidos (Iraque e Afeganistão), conta com a firme oposição de uma fatia importante da opinião pública, que aproveita a ocasião para se manifestar.
Bem podem os Serviços Secretos e a polícia local preparar uma protecção inexpugnável, que um atirador solitário alveja-o com dois tiros a partir de um prédio em frente à entrada do edifício.
Nas horas seguintes, aquelas em que ele permanece em coma no Northwest Hospital, são capturados diversos suspeitos, a começar por um activista particularmente bem informado sobre o programa da visita, um veterano negro drogado e um sírio a trabalhar há poucos dias no edifício em causa.

Quando Dick Cheney já foi empossado como 44º presidente dos Estados Unidos, a polícia conclui ter no referido sírio o culpado do crime: Jamal Zikri teria estado em treino militar no Afeganistão e as impressões digitais encontradas no parapeito da janela donde haviam sido feitos os disparos assemelham-se às suas. O principal objectivo das autoridades é apresentar um culpado credível para a opinião público, e que surja ligado à Al Qaeda. Se, ademais possibilitar um ataque militar à Síria tanto melhor, já que um dos opositores de Assad afiança a responsabilidade desse presidente na preparação e ordem para executar tal operação terrorista.
Enquanto Bush é enterrado em Arlington, Cheney não perde tempo: faz aprovar pelo Congresso e pelo Senado uma Lei Patriótica 3, ainda mais restritiva das liberdades e dos direitos dos cidadãos do que as anteriormente implementadas.
Em Maio de 2008, Zikri é condenado á morte por um júri, que vota por unanimidade a sua culpabilidade. Mas não tarda que o negro Casey denuncie a verdadeira autoria do homicídio: teria sido o próprio pai, Aloysius, orgulhoso militar indignado com as mentiras de Bush, responsáveis pela morte do filho mais velho em Mossul, quem preparara e executara o crime antes de se suicidar no próprio carro.
Quando o filme se conclui, Zikri continua preso no corredor da morte e a Lei Patriótica 3 tornou-se lei permanente e não de excepção.
Ao estrear-se, «Morte de um Presidente» constituiu um verdadeiro escândalo com os apoiantes de Bush a considerarem-no um apelo cinematográfico ao seu assassinato. Mas, embora se trate de uma excelente ideia de base (uma ficção política baseada em imagens reais de manifestações e de discursos de Bush sincopados por «testemunhos» de supostos intervenientes nos acontecimentos), o seu desenvolvimento entedia e priva-o de ser tão eficiente quanto mereceria o seu conceito. Porque está aqui bem explicita a responsabilidade de George W. Bush por políticas criminosas, que mereceriam colocá-lo perante os juízes do Tribunal de Haia.

Livro: NA SÍRIA de Agatha Christie

Ao concluir-se a segunda guerra mundial, Londres estava em ruínas e os seus habitantes bastante necessitados de superarem anos a fio de medo e de carência na satisfação das necessidades mais básicas. Para a conhecida escritora de livros policiais, criadora de Poirot ou de Miss Marple, a catarse passará por reviver os seus tempos de grande felicidade, quando partilhara com o marido arqueólogo as vicissitudes das campanhas de prospecção na Síria. Daí que pegue nos seus diários de então, e, à distância de alguns anos, se ponha a escrever sobre tudo quanto vivera nessa experiência.
«Esta crónica inconsequente foi iniciada antes da guerra. Depois foi posta de lado. Mas agora, após quatro anos de guerra, dei por mim a pensar cada vez mais naqueles dias passados na Síria, e por fim senti-me impelida a tirar os meus apontamentos e os meus toscos diários para fora e a completar aquilo que começara e pusera de lado. Pois parece-me que é bom recordar que esses dias e esses lugares existiram, e que neste preciso instante a minha pequena colina de calêndulas está em flor, e que os velhos de barbas brancas que se arrastam atrás dos burros talvez nem saibam que existe uma guerra.»
Estão lá as idiossincrasias de árabes, curdos ou de arménios a par das que ela testemunhara nos companheiros de aventura saídos da Europa. O que lhe garante muita graça na forma como as descreve, fazendo lembrar o comportamento da sua mais célebre personagem feminina. Há um motorista, que não sabe conduzir ou um cozinheiro, que nunca vira uma cozinha. Há o encarregado do aprovisionamento, que causa verdadeiros desastres com o seu peculiar sentido de economia (não interessava se as laranjas estavam podres, desde que fossem uma pechincha!), ou o capataz apaixonado por cavalos e que não mede a capacidade para percorrer longas distâncias num deles montado. Ou o sheik ávido de prendas, mas muito displicente nas palavras de acolhimento dos recém-chegados.

Existem também as mulheres, muito recatadas as árabes, mas muito afirmativas as curdas, capazes de extorquirem a féria dos maridos sem nada lhes deixarem.
Esquecendo por algum tempo os seus casos policiais, Agatha Christie ajuda Max a etiquetar e a fotografar as peças encontradas, tornando-se mais uma colaboradora eficaz das escavações feitas em colinas, aonde outrora terão existido povoamentos pré-românicos, aqueles que verdadeiramente lhes interessam.
A leitura de mais esta obra inserida na colecção de relatos de viagens editados pela Tinta-da-China constitui uma experiência muito agradável e demonstrativa da capacidade da escritora inglesa para outro género literário, que não aquele em que ganhou merecida fama.
Importa ainda, e a concluir, considerar que o tempo terá mudado muito a relação entre ocidentais e as populações do Médio Oriente: no livro sente-se uma aceitação e um respeito mútuos, que o advento do terrorismo islâmico estilhaçou. Hoje, já não será tão fácil repetir experiências de vida como as que Agatha Christie aqui relata...