segunda-feira, março 28, 2016

LEITURAS AVULSAS: Cientistas, deuses e filósofos

Ao sabor das leituras do fim-de-semana encontro algumas abordagens menos estereotipadas de alguns assuntos habitualmente cristalizados em interpretações tidas como definitivas. Ora a Ciência demonstra-nos que uma Verdade é-a até se provar a sua falência em proveito de uma outra hipótese mais convincente quanto à sua identificação com o que se investiga.
É assim que o historiador Henrique Leitão dá-nos no «Expresso» desta semana uma explicação muito interessante para se compreender como a Europa conseguiu dar um salto científico na época dos Descobrimentos, que deixou para trás as demais regiões do mundo, algumas das quais (a China, por exemplo) tinham-se-lhe antecipado em muitos domínios do saber até então: “o contacto entre níveis académicos altos, relativamente fechados e níveis de artesãos e de práticos”. Ou seja a concertação entre o saber fazer e o saber teórico!
Então “académicos, matemáticos, universitários, confrontaram-se com problemas da prática. E os homens práticos, por sua vez, começaram a perceber que havia um contexto teórico muito importante para aquilo que faziam”.
Foram, assim, as atividades náuticas a estarem na origem de uma Revolução Científica, que impulsionou o Renascimento e projetou a Europa para a modernidade.
Noutro texto de uma edição atrasada do mesmo semanário, Ricardo Marques lembra-nos o grande impacto teológico do Terramoto de Lisboa de 1755. Um acontecimento que fez estremecer toda a Europa das Luzes, porque acabou com a ilusão de haver um Deus eminentemente bom. Os que duvidavam da existência de tal tipo de transcendência encontraram nessa tragédia um bom argumento para concluírem da justeza da interpretação do mundo sem a interferência de qualquer divindade.  A negação, em suma de qualquer Paraíso ou Inferno.
Ora, nem mais! A propósito do que está a acontecer nesta altura na política brasileira, o jornalista Plínio Fraga recorda esta semana no mesmo jornal uma injustamente esquecida peça de Jean Paul Sartre («Huis Clos») onde o escritor francês dá a sua própria versão do que é realmente esse Inferno: um narcisista, um masoquista e um covarde chegam ao sítio onde se julgam condenados a prestar contas pelos pecados de toda a vida e veem-se trancados num quarto mobilado com antiguidades feias, sem espelhos, livros, escovas de dentes ou quaisquer  distrações. Depressa concluem que “cada um de nós é um carrasco para os outros. O inferno são os outros!”.
Concluo esta ronda por momentos de leitura mais estimulantes nestes dois dias com a evocação feita por Plutarco do diferendo entre Alexandre da Macedónia e Diógenes.
Em «Vidas Paralelas», o escritor romano relatou: “Reunidos no Istmo, os gregos decidiram declarar guerra à Pérsia e elegeram Alexandre chefe dos exércitos; e, como fossem muitos os homens de Estado e os filósofos que o visitavam e felicitavam, esperava ele que também o fizesse Diógenes, o de Sínope, que residia em Corinto. Mas este, sem dar importânáa a Alexandre, passava tranquilamente os dias no bairro de Craneto.
Alexandre foi procurá-lo. Diógenes, tranquilamente recostado, apanhava sol; e apercebendo-se da chegada de gente grada, fixou a vista em Alexandre, que o saudou, perguntando-lhe se precisava de alguma coisa.
‘De muito pouco”, respondeu Diógenes, “apenas que saias da frente do sol”.
Conta-se que Alexandre, perante tal  desinteresse, experimentou admiração pela grandeza de alma do filósofo; de tal modo que, ao afastar-se, quando os que o acompanhavam começaram a rir e a fazer troça, disse-lhes: “Pois eu, não sendo Alexandre, de bom grado seria Diógenes!”

Sem comentários: