domingo, fevereiro 18, 2018

(DL) «Um antissemitismo banal, Vichy e os advogados judeus» de Robert Badinter


A fotografia - tristemente célebre - foi reproduzida em dois jornais da época: lado a lado viam-se sete dos mais conhecidos advogados parisienses com uma expressão grave. O comentário, por certo controlado pela censura alemã, evoca “esses judeus milionários, outrora célebres na barra parisiense e internados num campo próximo da capital”. Era o tristemente célebre campo de Drancy, no qual eles foram aprisionados, juntamente com outros trinta e cinco colegas, todos capturados nas rusgas comandadas pelos ocupantes alemães com a colaboração da polícia francesa entre os dias 20 e 23 de agosto de 1941.
A imagem também está inserida num dos anexos do livro de Badinter, que denuncia o papel do regime de Vichy na exclusão dos judeus das funções públicas e das profissões liberais.
Trata-se de um relato apaixonante e riquíssimo pelas fontes a que recorreu, seja de arquivo, seja de estudos mais recentes, seja, sobretudo, de testemunhos dos sobreviventes. Denuncia a forte xenofobia do período que antecedeu a guerra e as mistificações posteriores dos que tentaram branquear o então sucedido. Fica evidenciada o papel das instituições francesas na exclusão antissemita, mas também na execução das tarefas planeadas para a «Solução Final».
A ostracização iniciou-se contra os que a extrema-direita designou como os «metecos», ou seja os que tinham nascido de pai não francês. Esse ódio ao estrangeiro  veio a traduzir-se na lei de 14 de setembro de 1940 relativa aos advogados e que enunciava a impossibilidade de os judeus poderem ser assimilados pela sociedade francesa. Viria a seguir o primeiro Estatuto dos Judeus, datado de 3 de outubro de 1940, revisto em 3 de junho do ano seguinte, que os designava como franceses de segunda.
Inútil aprofundar a constatação do sofrimento nesses homens que se julgavam bem integrados na sociedade francesa e viam ruir tudo quanto tinham amado. O mais revoltante é, porém, a negação absoluta dos princípios republicanos. Os Conselhos da Ordem dos Advogados ficaram incumbidos de transmitir ao tribunal superior a lista dos membros judeus. Com base nessa informação foram expulsos 221 advogados em 13 de fevereiro de 1942.
Se Xavier Vallat, comissário geral das questões judaicas, advogado de profissão e membro do conselho da Ordem em Paris, aceitou cinco derrogações a título excecional, o sucessor, Darquier de Pellepoix, cuidou de concretizar essas expulsões por ordem de Laval. Estava-se em setembro de 1942 e o governo de Vichy acabara de assinar o compromisso com os alemães para dar novo impulso ao projeto de aniquilamento dos judeus no território por si controlado.
Apesar de terem sido formados nos princípios da Declaração dos Direitos do Homem, os demais advogados, os professores de Direito ou os funcionários judiciais não esboçaram qualquer resistência à  violação de tal cultura. Por anestesia perante a recente derrota relâmpago? Pelo efeito de seguidismo perante um ainda então prestigiado Pétain?
Badinter não dá a resposta, mas coloca questões pertinentes quanto ao comportamento humano em situações limite, aquelas onde em que testadas as suas qualidades e defeitos.

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