quinta-feira, fevereiro 15, 2018

(AV) O refúgio de um expressionista


Em 1933, com a chegada de Hitler ao poder, muitos artistas, como Paul Klee ou Kandinski, decidiram fugir do país. Otto Dix decide o contrário: ficar, mesmo que alterando o estilo de vida, que tivera até então. Refugia-se no sudoeste da Alemanha, nas margens do Lago Constança, para continuar a pintar incessantemente. Aproveita para tal o castelo de Hegau, que pertencera ao primeiro marido da esposa.
Pintor da miséria social e da depressão, até mesmo da guerra, Dix sabia-se ostracizado por um regime, que não tardaria a incluir as suas telas entre as que considerava «degeneradas». Foi para se sentir relativamente a salvo das pressões nazis, que, juntamente com a mulher e os três filhos, muda-se para aquela periferia com a Áustria e, sobretudo a Suíça, ao alcance de uma viagem de barco.
A paisagem aprazível daquela terra de acolhimento reorientou a expressão plástica da obra, estimulando-lhe uma pintura mais serena, pelo menos em aparência. Porque viu-se num paraíso onde a Natureza expressava uma beleza, que quase lhe fazia esquecer tudo o resto, mesmo que se sentisse desorientado por se tratar de algo de tão diferente em relação ao que caracterizara toda a sua vivencia citadina. Mas, sendo um pintor, que não podia prescindir do motivo escolhido para ser ilustrado nos seus quadros, Dix não pode passar ao lado da paisagem que o rodeia. Por isso forçou-se a integrá-la na obra. Só que, depressa as montanhas ou as nuvens ganham ressonâncias dramáticas na representação. A fortaleza milenar em ruínas, que domina toda a paisagem no topo do cume vulcânico, tornou-se-lhe simbólica: na época medieval constituíra um obstáculo intransponível contra as forças francas, que pretendiam invadir a região. Só Napoleão conseguiria pôr cobro a esse mito de invencibilidade.
Em 1936 a família mudou de casa para ficarem com o lago à porta e acautelarem uma cada vez mais premente fuga. A margem suíça passou a figurar com frequência crescente na obra. Essa residência ganhou uma tal importância no íntimo do artista que, após a derrota alemã na guerra, ele já dali não quis sair apesar de ter passado a ter outra liberdade de movimentos. Vivia então uma conversão religiosa, que explorou na criação dos vitrais de uma igreja da região, já a morte se fazia previsível nos seus dias crepusculares. 


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