segunda-feira, outubro 30, 2017

(DL) «Ventos da Quaresma» de Leonardo Padura (1994)

Em 1994 Leonardo Padura ainda tinha o seu personagem Mário Conde a exercer a função de tenente da polícia de Havana apesar de o frustrar a perdida vocação de escritor. Admirador confesso das novelas e romances de Salinger só parece ganhar asas para criar algo de estimulante quando se apaixona. O que acontece com frequência. No caso desta novela - «Ventos de Quaresma» - a eleita é uma bela ruiva, que o espanta por nunca ter chamado a sua atenção.
Enquanto vive a paixão assolapada, que indicia a vontade de a tornar mais séria do que qualquer outra até então, ele e Manolo, seu adjunto, investigam a morte de uma professora de química do liceu onde ele próprio estudara quando adolescente, e que fora encontrada morta num apartamento com vista para o Malecón.
A realidade com que Conde contacta é a de uma Havana ameaçada pela profusão das drogas vendidas e consumidas, com a complacência dos escalões mais elevados da administração pública e da polícia.
Não admira que, nas conversas com os amigos, particularmente com Flaco, que ficara paraplégico na guerra de Angola, perpasse a sensação de pertencerem a uma geração perdida, sem a capacidade de se iludirem com a retórica da Revolução, mas sem ilusões quanto às alternativas que contra ela se organizassem.
Aproxima-se a Quaresma e os ventos característicos da quadra varrem as ruas sujas, onde a violência coexiste com formas imaginativas de resiliência. Para Conde a desilusão coincidirá com a descoberta do autor do crime: quando deveria festejar o sucesso com a nova namorada ela dissuade-o, porque o marido de que se dizia separada, estará para chegar no dia seguinte, vindo de uma comissão de serviço no estrangeiro, e a amizade colorida terá de ter um fim. Razão para Conde entregar à aleatoriedade dos ventos do título a dispersão de mais um romance, que fora incapaz de levar até ao fim.

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