segunda-feira, outubro 30, 2017

(DL) «A Voz do Violino» de Andrea Camilleri (1997)

Dos escritores italianos, que se têm dedicado ao policial, Andrea Camilleri é o mais interessante pela forma como consegue complexificar uma situação inicial, obrigando o protagonista, o comissário Salvo Montalbano, a dividir a atenção por diversos focos de preocupação.  Ademais, a escolha dos cenários sicilianos constitui motivo maior de atenção, ou não seja ele território de eleição das atividades mafiosas, por muito que vão passando relativamente ao largo dos casos de homicídio normalmente congeminados pela imaginação do autor.
No quarto volume da série (que já vai em mais de duas dúzias de títulos) ele investiga o crime de uma belíssima mulher encontrada assassinada em casa, com vestígios de ter feito sexo consenual antes de se ver asfixiada no próprio colchão da cama onde fora encontrada.  Mas Montalbano também conta com a pressão do novo Comandante, que não esconde a antipatia, que lhe dedica a ponto de retirar-lhe o caso, quando parece tardar na sua resolução. Há também o relacionamento complicado com a namorada, sobretudo porque o miúdo que ambos iriam adotar, decidiu ficar, entretanto, com a família junto de quem estivera hospedado nos últimos meses.
A Máfia aparece a oferecer ajuda a Montalbano, já então afastado do caso, numa altura em que Panzacchi, o chefe da Brigada Móvel para quem fora transferido o caso, depressa lhe dá rumo aparentemente definitivo: mata Maurizio De Biasi, um retardado mental obcecado pela morta, e que se escondera numa gruta, a quem se imputa ter levado a atração até à violação assassina como confessara antes de quase ser cortado ao meio pela rajada de metralhadora dos polícias, que o cercavam.
Claro que Montalbano não se conforma com um tão oportuno bode expiatório para que o Comandante e o seu dileto subordinado ficassem bem nos telejornais.
A resolução só acontece nas últimas páginas trazendo até nós um violinista especialmente talentoso, mas a quem uma forma incurável de lupus, escondera definitivamente dentro de casa, um antiquário de Bolonha, viciado no jogo clandestino, e o marido da vítima, um médico conceituado, mas impotente, e como tal complacente com as alternativas amorosas encontradas pela mulher.
Há também uma velha senhora com quem Montalbano gosta de discutir os seus casos, e uma outra bem mais jovem, e amiga da assassinada, com quem ele vive breve idílio amoroso.
Quando tudo se esclarece dá para concluir que Camilleri encontrou explicação engenhosa para não se ter dela suspeitado precocemente.  O que só revela a maestria de um escritor para quem, a exemplo de um Simenon, este tipo de estórias constituem a oportunidade para denunciar os disfuncionamentos das instituições e fazer estudo de caso de algumas camadas sociais italianas.

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