quarta-feira, outubro 22, 2014

PALCOS: Let's Dance: uma história inovadora da dança contemporânea

Nos últimos três domingos o canal franco-alemão ARTE esteve a mostrar uma história inédita da dança do século XX a partir do corpo dos bailarinos: um panorama em três tempos centrados no pé, na nudez e nos corpos atípicos.
Pôde-se assim comprovar como a dança foi vivendo revoluções  políticas, morais, estéticas ou técnicas, que se traduziram, por exemplo, em despir-se no palco, mostrar a pele e o sexo, dançar com um corpo nada conforme com os cânones ou mandar ás malvas o dançar em pontas dos pés.
A dança acompanhou a forma como os corpos evoluíram em cena, na rua, no cinema, na publicidade, na moda, etc.
Desde os pés descalços de Isadora Duncan aos sapatos de saltos altos Louboutin, da discriminação racial à conquista do direito a um corpo diferente, é um século de dança, que passou diante dos nossos olhos.
Infelizmente perdi o primeiro episódio, pelo que entrei no tema quando estava já em causa a nudez na dança, algo que se tornou muito comum nos nossos dias. Ela não é, porém, um fim em si, mas uma ferramenta de que dispõem os coreógrafos e os bailarinos para abordarem temas como a moral, a política, o sexo, o pudor, a provocação, ou seja, a revolução.
O terceiro episódio intitulou-se «Este é o meu corpo» e teve a ver com o facto de, durante muito tempo, a dança e o seu público só autorizavam corpos jovens, esbeltos e musculados, quase irreais na sua perfeição e graça. Mas, pouco a pouco, outros corpos conquistaram o seu direito a expressarem-se em palco, apostando nas suas diferenças para conseguirem criar danças impressionantes e belas: corpos negros nos EUA excluídos dos palcos durante a segregação racial; corpos de transexuais a reinventarem-se em Nova Iorque nos anos 80 com o “voguing”; corpos feios, sujos e maus do muito admirado “May B.” de Maguy Marin; corpos velhos, gordos, amputados ou mesmo representados por hologramas - todos eles passaram a surgir na dança contemporânea...
Ir ao bailado já não passa obrigatoriamente por adotar aquela atitude burguesa de quem espalha pelos amigos, que se foi à Gulbenkian ou ao Camões para ver bailarinas em tutus e os seus partenaires em collants a repetirem os sobejamente conhecidos movimentos há décadas inventados e desde então sem qualquer outra originalidade.
Será possível ainda alguém ser estimulado pela banalidade, mesmo que de excelência, do ballet clássico tradicional? Essa não é decerto a minha onda! Troco mil «Lagos dos Cisnes» ou «Quebra-nozes» por um único da dupla Helvieu-Montalvo ou da belga Anne Teresa De Keersmaeker. Terei decerto mais saudade de Pina Bausch do que de mil Nureyeves ou margotfonteynes.
A exemplo de qualquer outro espetáculo, a dança deve surpreender-nos, mexer connosco e, se possível, deslumbrar-nos. Por isso mesmo, quando a coreografa de Wuppertal pegou num clássico como «A Sagração da Primavera», por muito que não pudesse ignorar a forma como os Ballets Russes a haviam criado originalmente, o resultado final sairia completamente diferente. 

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