Um homicídio anda a alimentar a imaginação dos entediados lisboetas dada a notoriedade da vítima, Miguel Ruiz Fernandes, cuja libertinagem era pública.
O inspetor Moura Prata vê-se com cinco suspeitos para interrogar: quatro mulheres e um homem, que integravam o clube onde o defunto mentor dava asas à sua imaginação erótica influenciada pelos jogos sadomasoquistas inspirados na filiação em Bataille.
Mas, mais do que a vertente policial, o inspetor interessa-se sobretudo pela personalidade daquelas mulheres, três delas casadas, questionando-se sobre as razões que as terão enredado numa teia de sedução, que as conduzira a inesperada escravidão. Porque se Miguel lhes começara por parecer um anjo anunciador do acesso ilimitado ao prazer sexual, depressa se convertera num ser perverso capaz de utilizar as chantagem para as manter submissas aos seus ditames.
O outro homem presente nessas orgias, Leopoldo Fialho, depressa fora catalogado como desprezível pelo inspetor. Tal como ele oriundo do Alentejo profundo, descendia da aristocracia rural que lhe legara a sua genética preguiça intelectual e física, e o deixara na posição confortável de apenas ser o comparsa do morto.
As mulheres, todas engenheiras de profissão, são bem diferentes umas das outras. Três delas mais velhas, deixavam à jovem Cátia o papel ingrato de se sujeitar aos jogos eróticos mais complicados: ser fechada num caixão, deixar-se crucificar. Mas tendo procurado sacudir o tédio conjugal ou apostar na aventura dos sentidos, também elas tinham sentido crescer em si o ódio por Miguel. Por isso mesmo qualquer delas poderia ser a assassina.
Moura Prata compreende como a violência progressiva de cada orgia tendia a causar a explosão de violência bastante para se cumprir a velha ligação entre Eros e Tanatos. Sem que necessariamente a luxuria significasse algo de subversivo, muito menos de revolucionário. Nos seus jogos de prazer à custa das quatro mulheres e do amigo, Miguel Ruiz revelava a malignidade fascista que poderíamos igualmente detetar nas personagens hediondas de «Salô» de Pasolini.
Publicado em 2005, «O Eterno Efémero» constitui um romance crepuscular na bibliografia de Urbano Tavares Rodrigues, mas mantendo as principais características de toda a sua obra anterior: personagens de um elevador social, que para uns tende a subir e para outros toma o sentido contrário, gerando incómodos, desejos de redenção.
O erotismo está sempre presente, bem como a permanente indagação do que se esconde por trás do mistério feminino, bastante mais complexo e inacessível do que possa aparentar. No fundo em paralelo com uma sociedade, cujos potencial de transformação é bastante superior à da inércia de repouso em que parece assentar. Algo que as pequenas histórias deixadas por Urbano nalguns capítulos sem imediata relação com a história principal, apenas confirmam!
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