segunda-feira, outubro 13, 2014

ÉCRANS: «Exit through the Gift Shop» de Banksy (2010)

O filme já tem quatro anos e a notoriedade de Banksy só tem aumentado desde então, tornando-o num dos mais consagrados artistas da nossa contemporaneidade, mas «Exit through the Gift Shop» nada perdeu da frescura e da capacidade de surpreender com que marcou a entrada dele na linguagem cinematográfica. Porque aquilo que, à partida entenderíamos como uma abordagem à evolução da street art converte-se inesperadamente num questionamento pertinente sobre o que é a arte e qual o seu sentido nos dias de hoje.
Sobretudo porque Banksy depressa se limita a ser o realizador do projeto transformando um impostor em protagonista: Thierry Guetta, que se intitula Mr. Brainwatch.
Quando o começamos por conhecer ele conseguia viver uma brilhante carreira comercial em Los Angeles. Comprava roupa por atacado por 50 dólares e vendia cada peça em separado como se fosse modelo de autor por dez vezes mais.
Numa visita à família em França, descobre um familiar apaixonado pelo graffiti, que se designa como Space Invader. Ora, Thierry cuja súbita morte da mãe, quando tinha nove anos, causara um trauma psicológico incurável, andava a filmar obsessivamente tudo quanto vivia como se quisesse conservar a mulher e os filhos em película para o caso de os vir a perder. O mesmo carácter obsessivo vai levá-lo a captar imagens dessas ações efémeras de street art acompanhando artistas dos dois lados do Atlântico. Mas, para sua frustração, não conseguia contactar com o mais prestigiado de entre eles: o inglês Banksy.
Um dia, este aterra em Los Angeles para executar um dos seus trabalhos clandestinos e sugerem-lhe Thierry como assistente. Nasce aí uma enorme amizade entre os dois, com o francês a seguir continuamente o artista britânico durante a estadia na Califórnia e até visitando-o quando ele regressa a Londres.
Sempre protegendo a sua identidade facial, Banksy alterna com Thierry na revelação perante a câmara dos trabalhos partilhados, nomeadamente a preparação da exposição do britânico num grande hangar de Los Angeles que se converteu num enorme acontecimento cultural capaz de suscitar filas ininterruptas de gente interessada.
Nessa altura já Banksy era reconhecido como um descendente dos situacionistas, capaz de expor ilegalmente algumas das suas obras na Tate Gallery ou de assumir compromissos políticos inequívocos com as imagens afixadas no muro de separação entre Israel e os territórios palestinianos.
Com este filme, nomeado para os Oscares, Banksy fez uma entrada brilhante no cinema com uma iniciativa concetual na linha de Duchamp ou Warhol.
Trata-se de uma obra híbrida entre o documentário e a comédia em que a questão central será: «Quem é Thierry Guetta?» Porque, convencido da sua própria capacidade para imitar o mestre, o francês enceta um projeto megalómano destinado a provar a possibilidade de alguém, sem experiência nem particular talento artístico, conseguir transformar-se num fenómeno capaz de replicar o mesmo interesse mediático e público de alguém para quem aquelas características eram evidentes.
No final somos obrigados a questionarmo-nos se os nossos padrões de apreciação da arte atual serão consistentes ou, se pelo contrário, mais não temos sido do que vítimas de um enorme embuste criado por quem possui as qualidades para suscitar modas efémeras e rapidamente olvidáveis. 

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