sábado, novembro 18, 2017

(I) A Sociedade do Espetáculo segundo Guy Debord

Desaparecido em 1994, Guy Debord continua a ser filósofo de referência no pensamento crítico contemporâneo. Passando agora um quarto de século sobre a reedição do seu «A Sociedade do Espetáculo», importa lembrar a intenção assumidamente crítica com que o escrevera esperançado em que pudesse prejudicar de alguma forma uma tendência que sentia cristalizar-se nos comportamentos coletivos.
Analisado a assinalável distância, o texto continua a resistir às leituras redutoras, que o davam como exclusivamente orientado para a crítica do poder dos media: O que, mesmo fosse esse o seu único fim, já o justificaria tão notória é a incompatibilidade dos atuais órgãos de comunicação de massas com o direito dos seus consumidores em serem honestamente informados.
Debord partiu de uma crítica da representação restrita para outra de cunho mais alargado. Progressivamente já não é a obra de arte que deve ser criticada como espetáculo, mas a cultura no seu todo. E, aprofundando as teses de Karl Marx, é a sociedade capitalista, que para ele deverá ser contestada.  A sociedade do Espetáculo é aquela em que todas as atividades - políticas, económicas, culturais - são modos de representação do indivíduo e do coletivo sem que ele participe ativamente, pois passa a só dedicar-se à contemplação passiva das coisas de que se viu desapossado.
Alexander Neumann, um dos comentadores atuais da obra de Debord, tem duvidas quanto à perspetiva cética, pessimista de Debord nos tempos de hoje, tendo em conta a multiplicação de alternativas, de movimentos, que extravasam esse quadro analítico e vão semeando grãos de areia na poderosa engrenagem tão temida pelo filósofo. Poderão parecer-nos demasiado minoritários, incapazes de moverem uma montanha do sítio onde parece estacionar-se, mas conhecemos o suficiente da tectónica das placas para percebermos que também as grandes estruturas geológicas estão condenadas a movimentarem-se.
Quando Debord reeditou «A Sociedade do Espetáculo» tinha em conta que Mitterrand trabalhara bastante esse lado da representação, quer com a ajuda do cineasta Serge Moati, quer com o publicista Jacques Seguela, como se o poder em si importasse mais do que o conteúdo das políticas, que pretendia implementar.
A contemplação das representações, dissocia o individuo da sua identidade para o integrar numa «massa» informe, condicionada pelas mensagens eficazmente nelas inculcadas. Por isso Debord analisa este tempo como o do primado de um movimento de banalização, que reduziria tudo a mercadorias apresentadas nas suas mais diversificadas variantes a fim de dar a ilusão da pluralidade da oferta, mas todas a convergirem pata o mesmo propósito de reduzir os cidadãos ao seu estado abúlico. Sacudi-los de tal passividade constitui o maior desafio de quem milita no sentido transformador de uma realidade insatisfatória...

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