sexta-feira, novembro 24, 2017

(AV) Quando Léger descobriu o que quereria vir a ser

Fernand Lèger chegou à Córsega em 1906, quando tinha 25 anos e uma tuberculose por curar. Os invernos na Normandia eram demasiado húmidos e frios para a fragilidade dos seus pulmões, e os médicos vaticinavam-lhe estadias em climas mais amenos. Nada mais natural, pois, do que fazer estadias de alguns meses na ilha mediterrânica.
Integrando-se no quotidiano da aldeia onde se alojou, tudo lhe interessou para reproduzir nas telas onde se ia distraindo sem ter a certeza de querer vir a ser pintor. Se é que a saúde lhe permitiria vir a ser alguma coisa…
Provavelmente não adivinhava que as espaçadas temporadas seriam de crucial definição para o que virá a ser o seu futuro: o de constituir-se como um dos máximos expoentes do movimento cubista. A paisagem da Ilha de Rousse irá fascina-lo quer pelas cores das rochas, quer pelos efeitos de luz nelas produzidos. É ali que opera aprofundada reflexão sobre tudo quanto trazia de Paris enquanto memória do que ali via ou ouvia.
Se no início o olhar ainda era marcado pela estética impressionista de que vinha imbuído - evidencia-o quadro de 1907 em que representa rapazes a banharem-se na praia - sentia desconforto por ainda se ver identificado com quanto ia reproduzindo nas telas.
Dois anos depois quando, curado, regressa a Paris, Léger já vai convicto quanto ao que doravante fará: os quadros de Picasso e de Braque tinham-no fascinado e estimulado para seguir-lhes as pisadas e encontrar o seu estilo. Vivendo-se, então, uma pujante confrontação entre as vanguardas e as abordagens canónicas da representação artística, Léger começa por saber o que não quer. Por isso mesmo queima ou destrói quase todos os quadros anteriores - salvar-se-ão os que já constam de coleções particulares - e decide começar tudo de novo.
Nas quatro décadas seguintes ele confirmar-se-á como um dos principais vultos artísticos da primeira metade do século XX.



Sem comentários: