domingo, novembro 26, 2017

(DIM) Ando rendido à superlatividade da versão de 2017 de «Twin Peaks»

Coisa gigantesca, brilhante, explosiva, enorme, incomensurável - eis alguns dos epítetos, que a crítica internacional está a dedicar à versão de 2017 de «Twin Peaks» sobre a qual só me atrevo a escrever, quando já vi doze dos dezoito episódios. Porque, horas a fio, tenho estado desconcertado, que é uma das melhores reações a ter enquanto espectador de um qualquer objeto artístico usufruído.
Há também quem diga que, na sua monumentalidade, David Lynch terá decidido criar uma proposta testamentária, e se havia quem o já dava como artisticamente esgotado, a sua resposta, sob a  forma desta série, é tão entusiasmante como a que, décadas atrás, sucedera com Léo Ferré a quem a crítica musical ousara dizer o mesmo e ele, em poucos meses, cuidou de a desmentir com um memorável triplo-álbum.
Audácia é característica que Lynch cola a cada um dos episódios onde não faltam motivos de surpresa. Há cenas longas em que os personagens parecem expectantes a aguardarem que os interlocutores lhes respondam ao que indagaram, ou comentem algo que os preocupa, e o realizador deixa o tempo fluir, com eles estáticos, o silencio a interpor-se-lhes até, finalmente, vir uma reação excêntrica na sua banalidade.
Há igualmente a excitação de ali ver sucederem-se tantos atores e atrizes, que credibilizam os seus pequenos papéis com toda a arte do seu conhecido talento: Harry Dean Stanton, Naomi Watts, Tim Roth, Miguel Ferrer, Ashley Judd, James Belushi, Laura Dern, entre muitos outros, que quase parecem ter encabeçado uma longa fila de gente conhecida e disposta a participar nesta que será, doravante, uma obra de arte, perdurável muito para além da sua efémera presença no pequeno ecrã.
Reencontramos igualmente muitas das estranhas personagens de vinte cinco anos atrás como a singular  e visionária senhora do tronco, que se intercalam com outras não menos singulares como essas donzelas de cor-de-rosa com um comportamento próximo do dos robôs.
Temos, pois, o fio da narrativa a ser continuamente sabotado pelo estilhaçamento de todos os limites que se quisessem colocar à imaginação. Trata-se de uma viagem através dos sonhos e dos pesadelos, que tem particular expressão no já aclamado episódio 8: mais do que um objeto televisivo é em si mesmo uma notável peça de videoarte.
Conclua-se esta primeira abordagem com um enorme elogio ao desempenho de Kyle MacLachlan, ora dividido na faceta de apático manga-de-alpaca, ora na de crapuloso delinquente, e a excelente banda sonora, mormente nos temas que acompanham o genérico final de cada episódio.

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