terça-feira, novembro 21, 2017

(DL) Estórias de um presente desencantado

Um livro sobre a miséria, a falta de dinheiro. Num pequeno apartamento de Lyon, por cujas frechas das janelas o frio enregela, Sophie dedica-se a escrever um romance como paliativo para a condição de desempregada, que teme vir a tornar-se irreversível.
A sua condição é a de muitos jovens: tão-só concluído o curso não arranjou colocação, subsistindo precariamente de subsídios demasiado espaçados para todas as suas necessidades. A fome é uma realidade, que não consegue evitar.
Há quem dê mostras de generosidade e solidariedade, ajudando-a, mas também não lhe faltam os que só lhe complicam a vida, nomeadamente o namorado, Hector, apenas obcecado pela satisfação sexual, ou o demoníaco Lorchus.
No meio de tanta provação manter a sanidade mental é uma proeza, que tem dúvidas se conservará por muito tempo. Por isso sente-se tentada a optar pelas vias mais desesperadas (a prostituição ou o roubo), sem que a alternativa enfim encontrada de um emprego precário e mal pago num restaurante, a console minimamente.
O romance de Sophie Divry, com muito de autobiográfico, também retrata uma sociedade marcada pela islamofobia, que se deixa seduzir pela argumentação da Frente Nacional. Às tantas a única alternativa a uma realidade marcada pelos contínuos conflitos é o recurso à imaginação. Até porque resulta num livro como este, onde a comicidade acaba por ser encontrada ao virar de muitas das suas páginas, porque já Albert Memmi nos ensinara que, não havendo outra solução, o desesperado ri.

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