domingo, agosto 13, 2017

(DIM) Geiranger sem tsunamis

Nos três anos, que estive no paquete «Funchal» devo ter ido mais de vinte vezes ao fiorde de Geiranger, muito justamente reconhecido como Património da Humanidade devido à beleza indizível da paisagem. A navegação pelas águas tranquilas rodeadas de altas montanhas donde se despenhavam abundantes cascatas («As Sete Irmãs»), constituía um dos pontos altos dos cruzeiros até ao Cabo Norte. E quase sempre o navio tinha como passageiros os noivos e os seus convidados, que aproveitavam as horas de estadia ali para celebrarem esponsais junto ao hotel, que tinha uma cachoeira a desaguar ali perto.
Por muitos anos, que ainda viva, esse é dos postais colhidos ao vivo, que nunca deixarão de me acompanhar. Compreende-se, pois, que tenha alimentado por «Bolgen» uma natural curiosidade, mesmo considerando as críticas negativas assinadas por gente respeitável a propósito de um filme-catástrofe, tido como seguidor acrítico do modelo norte-americano. Ou seja com famílias muito unidas em risco de se desagregarem, mas que se salvam todos no fim, e com alguns exemplos sacrificiais para incrementarem a vertente dramática da intriga. Quanto aos efeitos especiais, embora não deslumbrem, também não deslustram, embora a verosimilhança não seja a sua maior preocupação.
Constatamos nele todos os habituais estereótipos, que levaram Hollywood a integrá-los numa espécie de cânone do género. Mas, no entanto, tem Geiranger e isso faz toda a diferença, porque podemo-nos abstrair da estória  e concentrarmo-nos na paisagem. Para quem a não conhece ao vivo a bidimensionalidade bastará para se deixar entusiasmar. Mas para quem resgata da memória o seu registo tridimensional, a experiência ainda consegue ser mais grata.
Há, porém, um efeito perverso no filme: eu que gostaria de ali voltar, nem que fosse por mais uma vez, vi-me a considerar se seria boa ideia tendo em conta a possibilidade levantada pelos argumentistas. E, por certo, se fosse norueguês, e ali vivesse, talvez me apressasse a procurar subsistência noutro qualquer local que não aquele.
Desconhecendo se o Turismo norueguês contribuiu para o financiamento da produção, diria que a tal ter acontecido, significaria um clamoroso tiro no pé. Seria algo semelhante a imaginar que Paulo Branco produzisse uma grande produção do Joaquim Leitão, em que o tema fosse uma réplica do terramoto de 1755 nos dias de hoje, e o levasse a concurso aos principais festivais de cinema com distribuição garantida nos principais mercados europeus, asiáticos e americanos. Em tempo de grande boom turístico não me lembraria de tão evidente ato de sabotagem...


Sem comentários: