domingo, novembro 02, 2014

LEITURAS: «1Q84» de Haruki Murakami (2º volume) XI - Um vórtice incontornável

O 13º capítulo deste segundo volume de «1Q84» é inteiramente dedicado à dúvida de Aomame quanto a dever ou não prosseguir com a decisão de matar o líder da Vanguarda. Por um lado ele confirma-lhe ter violado sucessivas raparigas ainda impúberes, incluindo a própria filha, que não é outra senão Fuka-eri. Mas, por outro lado, é ele quem lhe explica que deixaram de viver em 1984 para terem entretanto transitado para essa nova dimensão do tempo, 1Q84, onde existem duas luas no céu e um antagonismo entre as forças representadas pelo Povo Pequeno e as dos que se lhes opõem: Tengo e a referida Fuka-eri. E o dilema de Aomame é este: segundo ele lhe diz, se matar o líder ela poderá ser morta, embora salve Tengo. Se não o matar será Tengo quem morrerá.
Já só no 15º capítulo é que Aomame decide levar por diante a morte do líder enquanto decorre uma violenta tempestade, escapulindo-se depois do hotel, onde os dois guarda-costas ainda esperariam um par de horas pela recuperação do patrão dos supostos efeitos benéficos do treino, que lhe prodigalizara. A partir daquele momento ela passou a ser uma foragida dos que quererão vingar o seu ato.
Fuka-eri tinha-se, entretanto, escondido em casa de Tengo oriunda sabe-se lá de onde. Desde o conhecimento com o Povo Pequeno até à sua forma de se expressar, tudo nela é estranho como se se tratasse de uma criatura com algo de não-humano.
Desta feita ela trouxera um alerta para o aprendiz de escritor: por terem colaborado na publicação do livro, ambos incorrem em perigos indizíveis. No fundo os mesmos que Tengo pressente relacionados com a recusa da oferta de uma bolsa generosa por Ushikawa a mando dessas mesmas forças obscuras. Até mesmo o fim abrupto das visitas da sua amante deverá ter tido origem na mesma fonte…
Enquanto ocorre a mesma tempestade medonha concomitante ao assassinato do líder da Vanguarda, e como se uma vontade exterior os comandasse, Fuka-eri aparece em transe a montar-se nele e a provocar uma descontrolada ejaculação. Quando a vê sair de cima de si, Tengo não pode sentir-se mais desconcertado com tudo quanto está a viver, mas algo o faz recordar Aomame e o incita a ir procura-la.
Existiu, pois, uma consonância nada ocasional entre a relação sexual de Tengo com Fuka-eri e o que Aomame estava a fazer nesse mesmo momento.
Em simetria com Tengo, Aomame sente ter-se aproximado dele com o desenrolar dos acontecimentos mais recentes, e algo lhe diz estarem ambos atraídos para um mesmo vórtice. Por ora, escondida num apartamento, entretém-se a ler um dos romances aí deixados por quem lho preparara como refúgio: «A Crisálida de Ar», ou seja aquele que resultara da colaboração de Tengo com Fuka-eri.
Não tarda que compreenda a sua condição de interveniente naquela história, que é bem mais do que uma ficção: Fuka-eri fora castigada e encerrada por dez dias com uma cabra morta nas instalações da Vanguarda. À noite, pela boca da cabra, tinham saído os liliputianos membros do Povo Pequeno, que a convidavam a construir a Crisálida onde ia nascendo uma réplica dela mesma. Seria através dessas sombras, que o Povo Pequeno ganharia passagem para este mundo onde pretenderiam exercer o seu poder. Eram essas sombras que o líder era instado a fornicar a fim de lhes gerar um sucessor seu.

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