Nos anos 30 do século passado Raymond Aron propunha que o historiador não se contentasse com o papel de espectador, olhando para os acontecimentos do passado com capacidade para se dissociar da contaminação suscitada pelos do presente.
Mas o filósofo deverá equacionar até que ponto será possível escapar a um ponto de vista e aproximar a História de um método quase científico. Será possível que o historiador se consiga afastar das suas próprias convicções?
Algo é aceite quase unanimemente: não existem verdades absolutas pelo que a objetividade é falsa. A História é uma disciplina que se vai construindo progressivamente, nunca se conseguindo transmitir o passado tal qual ele efetivamente aconteceu.
Existe uma célebre fotografia de Martin Heidegger num comício nazi em Leipzig, em 1933, que é bem reveladora da frequente intenção dos governos em impor aos filósofos ou aos historiadores aquilo, que eles deverão pensar ou defender.
A História não se consegue isolar do mundo onde é estudada. Por isso mesmo, na época em que aquela fotografia foi captada, os programas de ensino foram nazificados por razões de propaganda. Existe, pois, um conflito potencial entre a disciplina em si e os que a querem utilizar em proveito da sua agenda ideológica. O historiador tem de se questionar continuamente sobre o que está a fazer.
Outra fotografia interessante é a de uma tribo do Estado do Acre vista de um helicóptero, quando ainda nunca fora contactada pelo homem moderno. Uma das curiosidades que este tipo de sociedades primitivas suscita é como vivem e no que acreditam, tendo em conta a sua total ignorância quanto ao que afetou os seus vizinhos contemporâneos. Pode-se dizer, nesse sentido, que toda a sociedade convive com vários tempos. Não há uma História absoluta.
Ela coloca outra questão relacionada com a História: toda a sociedade tem uma relação com o seu tempo. Ora algumas sociedades não se interessam pelo seu próprio passado. Por exemplo os Achuares - que vivem na fronteira do Brasil com o Perú - rejeitam qualquer importância do passado, vivendo assumidamente no presente.
Nietzsche dizia que a relação com o tempo é feita com aquilo que se esqueceu.
O primeiro esforço do historiador deverá consistir em ser crítico e criar distância entre si e o documento que analisa, porquanto até nos países mais democráticos os arquivos são filtrados de acordo com a perspetiva de quem os gere.
Àqueles que questionam se viveremos mesmo em democracia, quando deixamos reconstruir o nosso passado, podemos argumentar que nenhuma sociedade consegue ser verdadeiramente livre a respeito do seu passado.
O passado não é fácil de gerir. Não deixa de ser uma contínua construção.
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