quinta-feira, junho 01, 2017

(DIM) Quando um suposto garanhão passa à reforma

À primeira vista não se trataria de um filme, que colocasse como uma das primeiras escolhas para nele despender um par de horas. Mas «Rocco» consegue ser mais interessante do que tratar-se de uma homenagem a uma das grandes estrelas do cinema pornográfico europeu, protagonista de 1500 filmes nos quais terá feito sexo com 5000 parceiras.
O projeto do filme de Thierry Demaizière e Alban Teurlai era o de acompanhar o ator e quem o rodeia (a família, o irmão realizador, os produtores, os amigos, etc.), quando está iminente a rodagem do último título, aquele que constituirá o último título da sua vastíssima filmografia. Porque está lá a paradoxal oposição entre a vida familiar o mais pequeno-burguesa possível nos seus valores e a explicita revelação de uma sexualidade revelada na mais ampla variedade dos fantasmas masculinos: parceiras quase adolescentes, mulheres maduras, gordas, magras, bonitas, feias, brancas, negras, orientais, etc. - com todos esses estereótipos básicos Rocco cumpriu escrupulosamente o métier fazendo do pénis a sua ferramenta de trabalho.
Impressiona a perversidade de o ver considerar, como se se tratasse de axioma cientificamente comprovado, que a mulher só pode atingir o orgasmo se tratada com violência, se se sentir dominada pelo macho que a penetra. Muito embora uma das atrizes, com um ar pós-punk trate de o colocar no seu devido lugar.
Pouco a pouco os realizadores começam a infiltrar-se incisivamente na personalidade do indivíduo, detetando-lhe as relações equívocas por ele manifestadas pela idolatrada “mamma” e ganham-se fortes suspeitas de se tratar de quem Freud não desdenharia fazer uma aprofundada análise, porque elucidativa quanto ao tipo de neuroses passíveis de gerar tanta infelicidade pessoal com reflexos no ambiente social circundante.
O que fica evidenciado é um retrato nada idílico da indústria do cinema pornográfico: dirigida por homens libidinosos, com conceitos estéticos do mais kitsch possível, corresponde à moderna expressão de um tipo de esclavagismo do mais infesto que se possa conjeturar.

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