segunda-feira, junho 19, 2017

(AV) Os perturbantes significados da agulha de cozer

Na 13ª Trienal de Escultura, que está a decorrer em Bex, localidade suíça com vista privilegiada para o Lago Leman, uma das trinta e três obras expostas ao ar livre tem sido  objeto de particular atenção: trata-se de uma gigantesca agulha de 8 metros de comprimento enterrada no solo da autoria da Nicole Dufour.
A primeira tentação interpretativa do seu significado poderia levar-nos para a mítica Excalibur, a espada que faria de Artur o rei dos Bretões.
A artista confessa ter uma atração fetichista por esse objeto tão comum: porque é ambivalente, ora fazendo sangrar, ora curando ao permitir o tratamento de uma ferida aberta. Por isso tanto pode assassinar como reparar.
Não constitui, pois, motivo de espanto que a visita ao seu atelier permita encontra-lo com muitas outras esculturas subordinadas ao mesmo tema. Ademais, e quem o refere é a blogger Agnés Giard, a agulha também simboliza a bissexualidade, porque tanto penetra no tecido como é penetrada pela linha.
Avançando ainda mais nas conotações simbólicas da agulha, não deixa de ser perturbadora a ideia de, no passado, as meninas aprenderem a cozer, quando tinham próxima a puberdade: os sangramentos propiciados pelas agulhas, desajeitadamente manipuladas, permitiam-lhes aceitar mais facilmente o sangramento do corpo, levando-as a não se perturbarem ao surgirem as primeiras regras.
Compreende-se, pois, que os contos infantis - cuja inocência deixou de fazer sentido depois de analisados pelo psicanalista Bruno Bettelheim! - contenham tantos episódios de meninas picadas por objetos perfurantes, como era exemplo clássico o fuso da roca.
Por todas essas razões a obra em exposição da artista suíça comporta códigos de interpretação, que não se  lhe adivinhavam à primeira vista.


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