sexta-feira, junho 23, 2017

(DIM) Os equívocos de um discurso ideológico “irreverente”

Comecei a ver «Nunca Desistas» mais pela oportunidade de ver atores e atrizes, que aprecio - Maggie Gyllenhaal, Viola Davis, Holly Hunter ou Oscar Isaac - do que propriamente pelo tema, cujo conteúdo desconhecia.
A princípio fui-me deixando levar na onda: motivada pela má qualidade do ensino propiciado à filha, cuja dislexia a impede de saber ler numa idade em que isso já deveria ser dado adquirido, Jamie decide lançar-se num desafio tenaz: tomar de assalto a direção da escola. Compromete nesse objetivo uma professora ansiosa pela redenção, que a devolva ao idealismo da juventude, e possibilite ao filho, igualmente com problemas de aprendizagem, o ensino especial de que ele carece.
Enquanto tudo se cinge à luta de duas pasionarias , apostadas em sacudir o conservadorismo vigente, ainda ia dando o benefício da dúvida, muito embora já fosse evidente o primarismo da abordagem.
Eis, porém, que surge a denúncia de quem não pretende a mudança por mero interesse corporativo: o sindicato dos professores, mais interessado em salvaguardar os direitos dos associados do que em alinhar na transformação de uma realidade feita de manutenção de gritantes desigualdades entre os mais ricos e os mais desvalidos.
Tendo a experiência de estar sindicalizado há mais de quarenta e dois anos e de pertencer a corpos gerentes da minha associação de classe há trinta e muitos, sei bem como as organizações representativas dos trabalhadores não são perfeitas. Nelas tenho conhecido alguns caciques, mais apostados em defenderem os seus próprios interesses do que os de quem representam. Mas esses são casos de polícia, que mereceriam uma intervenção mais proactiva de quem é prejudicado e pactua com essa realidade. Mas o facto de haver a perversão dos princípios, que devem nortear os movimentos sindicais, não nos deve impedir de valorizar e exigir o seu respeito, sempre que eles são objeto de tratamento literário ou cinematográfico. Porque aí, mais do que se mostrar o que são, devem-se enfatizar os comportamentos que deverão ter.
É isso que não acontece neste filme de Daniel Barnz, exemplo típico do produto feito para vender gato por lebre. Algo em que as direitas mais conservadoras se têm especializado, muitas vezes se confundindo com discursos de esquerda radical. Com sucesso, como se tem visto em França ou em Itália, onde antigos eleitores comunistas se têm mudado, de armas e bagagens, para as extrema-direitas fascistas. Porque, em aparência, pouco os pareceriam distinguir.
A confirmação desta suspeição decorre da própria influência no argumento do filme de um conhecido propagandista do Tea Party, Philip Anschutz, conhecido por  campanhas populistas destinadas a dissociar os trabalhadores norte-americanos dos sindicatos.
Há, pois, que ter muito cuidado com o tipo de propaganda, que aceitamos subscrever: é que não foram poucos os meus amigos de esquerda, que começaram por entusiasmar-se com os discursos de Nigel Farage no Parlamento Europeu a invetivar Durão Barroso. Quem o via até parecia um clarividente militante das esquerdas! Até que se foi denunciando, mais e mais, na sua ardilosa essência de refinado canalha.

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