domingo, julho 30, 2017

(DL) Porque devemos ler os clássicos?

Num texto de 1981, que haveria de servir de título para um dos seus livros póstumos, Italo Calvino constatava dizer-se de um clássico, “que se anda a reler”, sendo raro encontrar quem confesse estar a conhecê-lo pela primeira vez. Esta ilação vem ao encontro de uma das minhas intenções mais caras ao chegar à condição sexagenária.: reler alguns romances, que muito gostei na adolescência e não voltei a revisitar desde então—«Moby Dick» ou «Dom Quixote» - mas investir igualmente tempo de qualidade  nalguns que franquearei pela primeira vez, dos quais os mais óbvios serão o «Ulisses» de Joyce e «Em Busca do Tempo Perdido» de Proust.
Confio que sentirei o prometido por Calvino, quando afiança que “ler pela primeira vez um grande livro em idade madura é um prazer extraordinário:  é diferente (…) do que se tem ao lê-lo na juventude. A juventude comunica à leitura (…) um sabor e uma importância muito especiais; enquanto na maturidade se apreciam (…) muitos mais pormenores, níveis e significados”.
Espero livrar-me de um dos pecados maiores da imaturidade enquanto leitor: o querer consumir tudo o mais depressa que se puder como se a quantidade não excluísse a possibilidade de apreciar devidamente o que se vai descobrindo folha a folha.
Quão pueril me parece agora o interesse, que cheguei a desenvolver por técnicas de leitura em diagonal, que possibilitasse uma abrangência maior das bibliotecas ao meu alcance: a própria e as municipais. Nessa altura sentia inveja dos islandeses que, pelo menos nos dois anos a fio ali passei o meu aniversário, se orgulhavam de serem leitores bulímicos.
Não é que enjeite os romances e ensaios, que se vão publicando pela primeira vez. O único problema é serem tantos e tão apetecíveis, que põem à prova os critérios de escolha. Mas privilegiarei cada vez mais os clássicos, ou eles não fossem, sempre na opinião de Calvino, o tipo de livros que nunca esgotam o que nos têm a contar: “Os clássicos são livros que quanto mais se julga conhecê-los por ouvir falar, mais se descobrem como novos, inesperados, e inéditos ao lê-los de facto.”  Tendem a facilitar-nos o conhecimento de nós mesmos e como aqui chegámos. E indo ao encontro do permanente desejo de aprender. A exemplo de Sócrates de quem Cioran contava a estória de ter começado a aprender uma nova ária para flauta enquanto os carrascos lhe preparavam a cicuta.
“Para que te servirá?», perguntaram-lhe os algozes.
“Para saber esta ária antes de morrer”, respondeu-lhes.
Ler sempre, aprender sempre, eis uma boa máxima para definir um frutuoso sentido da vida.

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