quinta-feira, maio 31, 2018

(DL) «Scherbius (et moi)» de Antoine Bello


Em 1977, o jovem psiquiatra Maxime Le Verrier acabara de inaugurar o consultório, quando o prestigiado professor Monnet lhe envia um paciente em que importava discernir se as suas propensões para as imposturas teriam uma origem mental ou se o moviam apenas propósitos crapulosos. É que a sua mais recente ousadia quase criara um problema diplomático ao primeiro-ministro, que o julgara efetivo representante de um país estrangeiro. Ao encontrar-se com o proponente de tal caso, Maxime fica surpreso, quando ele despe o disfarce e se apresenta como Scherbius, o paciente em pessoa.  Inicia-se aí a relação terapêutica entre os dois com o psiquiatra apostado em estabilizar o funcionamento psíquico de quem adivinha à beira de conhecer imprevisível explosão.
Só entre outubro de 1977 e abril de 1978 foram setenta e uma as sessões concretizadas no consultório, dando o ensejo a Maxime de publicar sucessivas obras sobre o caso até culminar na sexta, em 2004, intitulada, tal como neste romance de Antoine Bello, «Scherbius et moi».
Ficamos assim a saber do início da carreira de Scherbius como impostor desde a adolescência, recorrendo às mistificações para se livrar do complexo contexto socioeconómico que era o seu. Passaria depois por um convento como monge e experimentaria sucessivas profissões sem se fixar em nenhuma. Entre o consultório e a prisão de Sainte-Martin culminando em Hollywood, Máxime segue o percurso do cliente de forma obsessiva, revelando a evolução conhecida pela Psiquiatria nesse período. Mas torna-se evidente a contínua tendência do paciente em enganar o médico, cada vez mais perdido entre a verdade e a mentira, entre a razão e a loucura.
Maxime vai-se mostrando medíocre no seu saber, apesar de convencido do contrário, o que acaba por o tornar ridiculamente cómico.  Às tantas fica a pergunta: quem é o verdadeiro impostor, aquele que disso era acusado, ou o suposto detentor do conhecimento, que afinal bem ignorante se mostra para conseguir sequer adivinhar quem é, de facto, Scherbius.
Na desaprendizagem do que julgava saber, Máxime acaba por se converter no verdadeiro protagonista da história.

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