sexta-feira, janeiro 02, 2015

DIÁRIO DAS IMAGENS EM MOVIMENTO: As ascensões de Werner Herzog

Um dos filmes que mais gostei antes do 25 de abril foi «Aguirre, o Aventureiro» de Werner Herzog.
Era a época em que a censura ainda decidia o que podíamos ou não ver nos ecrãs de cinema e o Instituto Alemão nos possibilitava contornar tal bloqueio dando-nos a conhecer os cineastas da nova geração germânica então no auge da sua criatividade: Fassbinder, Wenders, Syberberg e Herzog entre mais uns quantos.
Desde então, nos quarenta anos que se seguiram, o cinema de Herzog tem-me dececionado tantas vezes quantas as que me têm motivado satisfação. Mas uma característica se lhe associa inevitavelmente: ele é o cineasta do impossível, protagonizando filmagens caóticas com atores psicóticos - dos quais Klaus Kinski foi o caso mais notório - ou abalançando-se a projetos de uma sensatez mais do que discutível.
Lançado há cerca de um mês em França «Les Ascensions de Werner Herzog» associa duas média-metragens com um tema comum: a inquietação e o perigo do imprevisível perante situações extremas na natureza.
A primeira foi rodada na ilha caribenha de Guadalupe em 1976, quando o vulcão La Soufrière ameaçou entrar em erupção obrigando a evacuar toda a população de Basse Terre.
Ao saber pelos jornais que todos os habitantes  dessa zona da ilha tinham acatado a ordem exceto um deles, decidido a morrer sem se desligar do sítio onde sempre tinha vivido, Herzog dirigiu-se para ali com dois operadores de câmara a fim de captar imagens do momento da erupção e de conhecer o rosto e as motivações daquele assumido rebelde, que ficara sozinho num cenário de apocalipse onde as ruas vazias, apenas eram percorridas por animais abandonados.
Não é que Herzog consiga compreender a lógica desse homem, mas não deixa de registar a serenidade e total ausência de medo com que encara o rumo dos acontecimentos.
A segunda média metragem data de 1984, quando acompanhou os alpinistas Reinhold Messner e Hans Kammerlander na conquista de dois cumes dos Himalaias situados acima dos oito mil metros, sem recurso a campo fixo, nem oxigénio, nem rádio.
Perante a radicalidade daquela aventura Herzog procura respostas para perguntas tão óbvias como: o que levará alguém a pôr-se à prova em tal desafio? Porque não temem as dores nem a morte, apesar de parecerem tão prováveis quanto a de alcançarem o projetado sucesso?
O que ambos os filmes testemunham é a existência de quem se desvia sem estados de alma de uma tendência maioritária para agir de acordo com as maiores probabilidades de conforto e de sobrevivência. 
Se quase todos nós escolhemos comportamentos capazes de nos conduzirem a uma vida tão duradoura quanto a medicina permitir, também existem uns quantos a não hesitarem pôr tudo em causa com decisões ou desafios, que nos fazem olhá-los nuns casos com admiração, noutros apenas com incredulidade... 

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