quarta-feira, janeiro 22, 2020

Diário das Imagens em Movimento: «A Festa» de Blake Edwards (1968)


Logo à tarde, quando foram três e meia, pressinto que os espectadores deste filme de Blake Edwards darão fartas gargalhadas  na sala principal da Cinemateca com as vicissitudes por que passa Peter Sellers no papel de um figurante indiano nos filmes de Hollywood, convidado por engano para uma das suas festas elegantes.
Estreado em 1968, no mesmo dia em que Martin Luther King foi assassinado, «The Party» é influenciado pelos filmes de Tati, havendo óbvias semelhanças entre a chegada de Hrundi V. Bakshi à mansão californiana e a do senhor Hulot ao hotel onde vai passar as férias de verão. Mas Sellers também se cita nos papéis anteriormente desempenhados em «The Millionaires» (1960), onde já assumia um papel de médico indiano) ou nos diversos títulos da «Pantera Cor-de-Rosa  em que era o desajeitado inspetor Clouseau.
Mas se o protagonista dá mostras reiteradas da sua inadaptabilidade a um ambiente de todo alheio aos seus valores e costumes, pior ficam os demais convivas, que vão sofrendo os efeitos das suas ações. Ora ficam com o cheiro de peixe agarrado ás mãos, ora perdem as perucas, ora são surpreendidos em flagrante perante portas abertas desprevenidamente, ora caem na piscina - em suma, todo o filme é um rol de vicissitudes onde o olhar se perde em múltiplos focos de atenção sem a todos conseguir abarcar.
Não admira que esta torrencial sucessão de gags tenha-se convertido num filme de culto e sugerido muitas referências cinéfilas, a mais pertinente das quais é a do personagem de Apu nos Simpsons, por estes dias muito na berra por ser denunciado como exemplo de preconceito racista para com a população indiana. O que, convenhamos, tem o seu quê de absurdo. Porque, pelos mesmos motivos, os que censuram os desenhos animados em causa, também não hesitariam em pôr este filme no seu índex.

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