quarta-feira, março 28, 2018

(DL) Hemingway no Quilimanjaro


“Em África nunca acordei de manhã sem me sentir feliz” escreveu Ernest Hemingway a propósito das suas experiências africanas. O seu primeiro safari aconteceu em 1933, para que satisfizesse a paixão pela caça. A Tanzânia era então uma colónia britânica chamada Tanganica, por ele escolhida como seu destino  providencial. Tinha 34 anos e já conhecera o êxito literário com «Fiesta» (1926), romance sombrio marcado pela experiência de jornalista durante a Primeira Guerra Mundial.
Pretendia distanciar-se de tudo quanto testemunhara embrenhando-se numa África ainda bastante selvagem. Os três meses aí passados com a mulher tornaram-se-lhe uma forma expedita de pôr um definitivo ponto final na tormentosa experiência bélica e reencontrar o sentido da vida.
Graças aos guias hadzabés que eram competentes pisteiros nas planícies, que tinham o maior pico africano como referência dominante na paisagem, Hemingway dispôs-se a testar a coragem na caça ao que designou como «big five»: elefantes, rinocerontes, búfalos, leões e leopardos.
Além dos troféus que levou para os Estados Unidos colheu vivências bastantes para escrever «As Verdes Colinas de África» onde ganha particular interesse a descrição da obsessão em apanhar um antílope antes do amigo Karl, com quem estabelecera uma rivalidade viril.
Lido a oitenta anos de distância, o romance arrisca a classificação de datado, porque os valores aí defendidos nada têm a ver com os atuais. Se hoje não falta quem exacerbe a adrenalina em experiências extremas, já não se intenta com elas provar as capacidades varonis, até pela frequência com que nelas se veem as mulheres a competirem com os homens. Ademais o respeito pela vida selvagem exige a sua preservação e não tanto a sua exibição em troféus pendurados nas paredes de vastas mansões.
A região serviria, porém, de exemplo para a capacidade da paisagem mudar algo no íntimo de quem dela se imbui com a vontade de se transformar.

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