domingo, março 25, 2018

(AV) O quase esquecido Frantisek Kupka


No dia 21 de março inaugurou-se no Grand Palais de Paris uma retrospetiva de Frantisek Kupka, pintor irreverente dotado de intuições revolucionárias injustamente subestimado na História da Arte do século XX. E, no entanto, a par de Malevitch, Kandinsky e Mondrian, também ele deveria ser considerado como um dos pioneiros da abstração.

Nascido na Boémia em 1871 foi o primeiro dos quatro a expor, em 1912, uma tela não figurativa, abrindo a via a uma obra fascinante feita de ruturas e de inovações, concluída com a sua morte em 1957.

Anarquista virulento e hábil desenhador na imprensa satírica e contestatária, portou-se sempre como um franco-atirador genial com lugar garantido nas vanguardas da primeira metade do século, avesso ao fascínio do dinheiro e à sede de reconhecimento manifestada por muitos dos seus pares.

Dos três quadros aqui apresentados o primeiro - «Estudo para Amorpha, fuga a duas cores» - data de 1911-1912, mas relaciona-se com os estudos por ele concretizados em 1908 a partir do seu quadro da «Rapariga com uma bola», nos quais andou a investigar a decomposição do movimento. A bola, o corpo e o rosto iam desaparecendo à medida que multiplicava as curvas e as trajetórias . A figuração ia-se apagando, a força circular tornava-se um motivo primitivo a expandir-se em formas distintas.

Apaixonado por Bach, o pintor quis compor o quadro replicando o compositor na criação das suas fugas. O azul e o vermelho impunham-se como notas dominantes numa profusão de linhas.  O quadro ficaria para a História como a primeira obra abstrata a ser exposta.


Do ano anterior «Planos para Cores (Mulher nos triângulos») surge no cruzamento da figuração com a abstração: o modelo feminino ora parece sobressair, ora diluir-se. Os efeitos de transparência e de esbatimento das cores conferem-lhe um aspeto espectral  Vivendo-se na altura em que a cronofotografia e os raios X estavam a desenvolver-se, Kupka inventava um novo olhar para um real mais complexo do que até aí era apreendido.

Inspirados na Arte Nova, que descobrira na Escola de Viena, os planos verticais ritmavam a leitura horizontal do quadro, acentuando a passagem do tempo e da luz da penumbra até à claridade, suscitando um efeito mágico.


Datado de 1919-1920, «Conto de Pistilos e de Estames, nº 1» é uma síntese impressiva de uma série de pinturas relativas à sexualidade através da fecundação floral. Sugerem-se formas femininas  através da composição das cores e dos turbilhões de curvas. “Pinto conceitos, sínteses, relações”, reivindicava quem assim se predispunha a inventar formas. A pintura emancipava-se dos canones através do fruir das cores e dos movimentos.

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