segunda-feira, março 19, 2018

(DIM) A Sicília ancestral de Francis Ford Coppola


Sicília nos anos 70. Uma equipa de Hollywood instala-se numa pequena aldeia isolada no lado oriental da ilha, onde fica a província de Messina. Lidera-a Francis Ford Coppola que vai encontrar colinas pejadas de oliveiras e limoeiros, de cujo topo se consegue ver o Mediterrâneo. E, porque daí tinham vindo tantas invasões ao longo da História, as famílias haviam criado estreitas cumplicidades e erguido autênticas fortalezas.
O filme, o segundo da série, apresentava aquele território como o do refúgio do filho do padrinho Corleone, que sobrevivera à guerra entre os diversos clãs mafiosos em Nova Iorque. Não é fácil a integração de Michael Corleone num ambiente onde apenas radicavam as suas raízes familiares. Nascido do outro lado do Atlântico desconhecia muitos dos códigos, que aí deveria respeitar.
Para encontrar o cenário mais próximo do que pretendia para credibilizar uma história, que se situasse nos anos 50, Coppola percorreu muitas aldeias até se fixar em Motta Camastra, que converteu na Corleone da estória, o sítio donde proviera a família, que tanto sucesso obtivera do outro lado do Atlântico. Era uma aldeia medieval situada a 400 metros de altitude aonde as tradições rurais continuavam bem vivas. Religião, culto da morte e patriarcado: o realizador não tinha de forçar a realidade para que ela se ajustasse à que pretendia representar.
Cinquenta quilómetros a norte, em Savoca, Coppola rodou uma das principais cenas do filme, aquela em que Michael pede em casamento a mão da filha do dono do bar local. Entrecruzavam-se aí os temas da família, da honra e do poder - valores fundamentais das famílias sicilianas. Mas não só, porque há o papel crucial da morte, indissociavelmente associada ao da vida. Na saga de Coppola há muitas cenas de assassinatos e de funerais. O culto da morte é uma das componentes que faz da religião um talismã para vencer o medo.
Os muitos conventos e igrejas, que se disseminam por toda a Sicília testemunham esse papel crucial da religião na vida siciliana. Mais ainda do que os monges e os padres a organização social foi-se consolidando ao longo dos séculos em torno de diversos clãs feudais a partir dos quais se criou a partir do século XVI a organização que viria a designar-se por Mafia.
No Castello degli Schiavi, situado mais a sul de Savoca e pertencente a uma dessas famílias ancestrais foi onde Coppola decidiu considerar como a mansão aristocrática dos Corleone na ilha natal. É aí que ocorre uma das cenas mais dramáticas do filme, quando o carro de Michael explode num atentado, que lhe vitima a jovem com quem acabara de casar.
Reencontrando as suas próprias origens, Coppola conseguia com esse regresso à Sicília  um dos momentos culminantes da sua obra.


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