sexta-feira, setembro 01, 2017

(DIM) As religiões como fomentadoras das desigualdades

O modelo é universal e mantém-se atual desde os alvores da Humanidade: para além de todas as crueldades, de que se fizeram portadoras, todas as religiões foram criadas para garantir a divisão social entre quem explora e quem é explorado.  Isso mesmo se conclui da apreciação do filme «Chavin de Huantar: o teatro do Mais Além», que o documentarista espanhol José Manuel Novoa rodou no Peru e tendo por objeto a civilização aí criada há 3200 anos nas encostas dos Andes.
Ao mesmo tempo que a civilização egípcia conhecia o ímpeto unificador de Menés, surgiam na América do Sul os primeiros santuários liderados por sacerdotes apostados em imporem um regime teocrático aos que conseguiam atrair para os seus cultos. O maior interesse do filme reside em ilustrar a encenação criada em Chavin para credibilizar a capacidade do diálogo de quem geria o espaço com os deuses. A construção fora criada de forma a envolver os peregrinos, que vinham de longe para prestarem tributo às divindades ali “presentes”, como o indiciavam os sons vindos das profundezas da terra, os odores e os efeitos de luz. O maior contributo para a rendição dos crédulos ao culto proviria, porém, dos catos alucinogénios, que eram instados a ingerir desde que ali chegavam. Desde o primeiro momento os habilidosos sacerdotes cuidavam de alterar as perceções dos visitantes, doravante convencidos a prodigalizarem-lhes tributos cada vez mais elevados para se manterem nas boas graças de quem tudo vigiava e definia.
John Rick e Luis Lumbreras, dois dos arqueólogos envolvidos no resgate do passado, depreenderam que tipo de cerimónias iniciáticas eram ali cumpridas, nomeadamente as que envolviam os sacrifícios humanos. Provas de canibalismo, ali encontradas, parecem ser irrefutáveis, mas não espantam por se tratar de uma das práticas mais transversais a nível geográfico depois da sedentarização ter criado a agricultura.
Embora possam ter existido outros santuários semelhantes por essa mesma altura, o de Chavin de Huantar pode representar aquele onde o principio da desigualdade e do desequilíbrio social se afirmaram no subcontinente americano.: durante oito séculos, sem terem de recorrer a qualquer exército, a casta de sacerdotes mantiveram-se no topo da pirâmide social. O que parece ainda inexplicável é a decadência, que o tornou obsoleto face a outros cultos, entretanto afirmados com revigorada expressão na sua área de influência.


Sem comentários: