domingo, setembro 17, 2017

(DIM) Um antifascista injustamente esquecido

Há histórias trágicas, que merecem ser conhecidas, quanto mais não seja para darmos merecido crédito a quem tanto fez para o justificar. Há no entanto uma diferença entre a morte de Neruda e a de Victor Ramos: enquanto o primeiro terá exalado o último suspiro quando lhe doía a sinistra ditadura, estabelecida dias antes, e que matara o seu amigo Allende, o exilado português viveu uma semana de inesgotável entusiasmo até um aneurisma o prostrar em 2 de maio de 1974.
Uma semana antes, no dia do seu 54º aniversário, o Movimento dos Capitães libertara o país do regime por ele combatido durante toda a vida, primeiro na condição de militante clandestino do MUD Juvenil, depois já como exilado, porque de outra forma acabaria preso como tantos camaradas, ou mesmo morto como ocorrera a um dos seus melhores amigos: José Dias Coelho.
Tivesse sido poupado a tão precoce fim e teria, provavelmente, desempenhado papel importante no Portugal de Abril: como amigo de Agostinho Neto, Marcelino dos Santos ou Mário Pinto de Andrade teria, porventura, participado no processo negocial das descolonizações africanas. Ou poderia ter tido o agravo de boca de um Jorge de Sena ou de um José Rodrigues Miguéis, que tanto ambicionavam participar na construção do Portugal novo e tão indecentemente foram marginalizados por quem, os desconsiderando como exilados cumulados de mordomias pelos países onde se tinham abrigado, se sentiram com direito a não se verem por eles ultrapassados na distribuição dos lugares de poder do novo regime democrático.
E, no entanto, Victor Ramos - que a História injustamente esqueceu! - tinha lutado ativamente nas lutas estudantis, no apoio às empreendidas pelos operários contra a ditadura e participara ativamente no Movimento pela Paz no pós-guerra. Mesmo, à distância, primeiro em França, depois no Brasil onde constituiu família, nunca desistiu de mudar os destinos dos compatriotas sujeitos a tão odiosa opressão. Por isso mobilizou e organizou os exilados, assegurando-lhes um veículo de comunicação fundamental para a compreensão dessa época: o «Portugal Democrático«.
Quando a doença súbita precocemente o vitimou estava a ultimar os preparativos para, terminado o ano escolar na Universidade de São Paulo onde lecionava Português e Francês, pegar nas malas e voltar a Lisboa. Como não o conseguiu a filha Guimar decidiu seguir-lhe os passos quarenta e um anos depois, percorrendo os sítios onde vivera, quer em Lisboa, quer na Beira, e falando com quem fora seu cúmplice nas mesmas lutas.
Em principio «Por Parte do Pai» é uma homenagem de uma filha para com o pai de quem desconhecera muito do que vivera, mas é também uma oportunidade para revisitarmos um tempo, que nunca deveremos esquecer. Porque o fascismo continua a ser uma ameaça permanente, que temos de rechaçar nos seus furtivos ataques, venham eles através de candidatos a autarcas assumidamente racistas, venham de eurocratas e técnicos do FMI apostados em negar a vontade dos povos para os coagir a cartilhas destinadas a torná-los mais infelizes.

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