domingo, setembro 10, 2017

(DIM) «Raving Iran» ou há sempre alguém que diz não!

A única vez em que estive no Irão, ainda o xá se iludia com a submissão do povo, acautelada pela CIA, e Khomeini esperava pelo seu momento no exílio em França. Já então a experiência de ali sequer ir ver um filme ao cinema - na época foi uma coisa de série B com um Peter Fonda irreconhecível em relação ao então bem amado «Easy Rider» - implicava significativas dificuldades com as autoridades a mostrarem uma arrogância prepotente, que o atual regime dos ayattollahs só terá agravado.
O interesse do filme de Susanne Meures sobre a cena techno em Teerão e a organização de animadas raves no deserto tinha a ver com a confirmação do que fomos conhecendo através do filmes de Jafar Panahi ou  Abbas Kiarostami: que até mesmo nas maiores expressões de intolerância e de opressão continuam a não faltar corajosos capazes de dizerem não.
O projeto de «Raving Iran» iniciou-se na cabeça da realizadora suíça, que pretendia satisfazer uma curiosidade idêntica á minha e tinha meios para a apurar: entre abril e setembro de 2013 voou por cinco vezes entre o seu país natal e Teerão para aí entrar em contacto com os protagonistas da clandestinidade musical. Foi assim que chegou a Anoosh e Arash, que tinham criado um grupo musical, os Blade & Beard, com os quais organizavam concertos não autorizados nas barbas dos mollahs.
Recorrendo, amiúde, às câmaras de telemóveis a realizadora conseguiu criar uma ficção dentro do documentário, porquanto os dois foram-se misturando intrinsecamente à medida que o projeto evoluía.
O grande momento do filme acontece quando os dois rapazes são convidados por um Festival de Zurique para apresentarem o seu trabalho e aproveitam para conseguir exilar-se, mesmo que o reconhecimento de tal condição só se tenha verificado dois anos depois, em 2015.
O que mais se explicita no documentário é o paradoxo de uma oposição entre o faz de conta repressivo do regime e a vida paralela, que o contesta nos mais pequenos gestos. Nas interações que os dois rapazes vão tendo com autoridades e pequenos comerciantes - muitos deles com as expressões convenientemente protegidas pelo seu desfoque de forma a evitar-se-lhes aborrecimentos com a polícia secreta - comprova-se o amplo desagrado com as imposições ditatoriais dos autocratas, mesmo se elas vão sendo incontornáveis. Ou não … porque há sempre alguém a sugerir a forma expedita de contornar a lei. E tenha-se em conta que o filme foi rodado já com Rohani no poder. Imagine-se como era no consulado do bem mais fanático Mahmoud Ahmadinejad!
Pelos exemplos que se vão sucedendo - e por estes dias está em foco a crise com os rohingyas do Myanmar! - sempre que se permite a intromissão das religiões na política o resultado é calamitoso.


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