segunda-feira, setembro 04, 2017

(DIM) Não haver crime significa utopia ou distopia?

No regresso às sessões da quinta-feira à noite no Cineclube Impala teremos como proposta «Relatório Minoritário», uma obra de 2002 com que Steven Spielberg quis consolidar a ideia de não ser realizador apenas de filmes para adolescentes e mostrar-se capaz de dirigir-se a um público mais adulto, que não será indiferente a esta questão: uma sociedade sem crime será uma utopia ou uma distopia?
Somos assim convidados a mudarmo-nos para Washington, em 2054, quando aí decorre uma experiência-piloto há seis anos, que permite identificar com antecedência quem está prestes a ser assassinado e por quem. O sistema apenas não responde a uma questão fundamental: aonde ocorrerá tal crime. Por isso, e mediante as imagens recolhidas pelos três seres mutantes, que estão mergulhados continuamente numa piscina do edifício, os agentes da PreCrime têm de identificar o local e a ele acorrerem antes que aconteça o previsto.
O chefe dessa unidade é John Anderton, interpretado por Tom Cruise. A pouco e pouco vamos identificar uma das razões essenciais para que ele sinta motivação no que faz no dia-a-dia: o filho desaparecera-lhe seis anos atrás, mais ou menos por altura do início desta experiência, e se ele já dispusesse dos seus meios, teria evitado o desenlace, que tanto o fazia sofrer a posteriori.
A confiança no sistema ficará, porém, abalada, quando identifica o caso de um dos primeiros homicídios evitados, o de uma tal Anne Lively, que se enquadrou naquilo que uma das inventoras designa como Relatório Minoritário: casos em que os crimes não decorreram da precognição dos três seres mutantes, porquanto só um ou dois deles os haviam visualizado.
Ao confiar ao seu superior hierárquico essa singular disparidade em pelo menos treze casos, desconhece o que lhe irá acontecer logo a seguir: ele próprio vê-se acusado da autoria de um homicídio na pessoa de um tal Leo Crow daí a trinta e seis horas.
Não vendo razão para cometer tal crime foge julgando-se alvo de uma cilada por parte de um funcionário do Ministério da Defesa, que parece demasiado interessado em tomar-lhe o lugar. Na sua perspetiva alguém fizera-o protagonista de um desses Relatórios Minoritários. De perseguidor passa a perseguido, dando o ensejo para aquilo que muitos apreciam - as cenas de ação! - mas que são das que mais me enfadam. Pelo meio ele obriga-se a uma operação de emergência junto de um cirurgião clandestino: é que vive-se numa sociedade em que todos os cidadãos estão facilmente localizáveis pelas retinas, pois é através da sua gestão à distância, que se lhes impõe a omnipresente publicidade.
É no recobro que Anderton evoca em nosso benefício de espectadores apostados em perceber-lhe a psicologia, a forma como o filho desaparecera junto de si, quando ele mergulhara numa piscina em apneia, enquanto ele contava o tempo. Temos, pois, um filme em que as piscinas tanto surgem como espaços de revelação como de sonegação. E não tardará que o polícia compreenda que, sem o ter suspeitado, existem nele pulsões homicidas, que não enjeitará satisfazer. 

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