quarta-feira, setembro 20, 2017

(DIM) O cinema português a testemunhar o que significaram os anos da troika

Se o 25 de abril e a guerra colonial não têm sido objeto de tão grande abordagem no cinema nacional quanto mereceriam ser revividos, reequacionados e reanalisados, o negro período entre 2011 e 2015 - quando as direitas viram a oportunidade de empurrarem os portugueses para o abismo a cuja beira tinham sido acossados pela crise dos subprime (por muito que no-lo tentem impingir foi o bater de asas de uma enorme borboleta, ou seja a falência da Lehman’s Brothers em Wall Street, a fustigar-nos com violento furacão!) - vai-nos chegando sucessivamente aos ecrãs.
Depois de «Os Gatos não têm Vertigens» de António Pedro Vasconcelos, «As Mil e uma Noites» de Miguel Gomes, «São Jorge» de Marco Martins e «Índice Médio de Felicidade» de Joaquim Leitão, eis que estão aí a chegar «Colo» de Teresa Villaverde e «A Fábrica do Nada» de Pedro Pinho.
Por muito que seja experiência difícil para quantos sofreram gravemente os efeitos das políticas danosas do governo anterior, as duas propostas fílmicas também comportarão algo de catártico para quanto de doloroso restou desse passado ainda tão recente.
Em «Colo» temos a crise e as suas sequelas à escala de uma família, quando ficar sem trabalho é um violentíssimo murro no estômago e se sabe não existir outro a que se possa aceder. Daí a angústia que paralisa, deprime e isola. O desempregado vê-se envergonhado perante os outros, que costumavam girar à sua volta, e sobretudo perante a família de que se habituara a ser  esteio económico.
Após a vitimização cresce a sensação de se ter tido culpa, que impede a energia de se tentar compreender a causa do sucedido. A partir daí é a curva sempre descendente, traduzida na destruição da unidade familiar, ferida de morte pela impossibilidade de comunicação. Mas é quando se chega ao fundo do poço, que a redenção volta a ganhar algum alento…
O desemprego também está presente em «A Fábrica do Nada», porque, logo de início, anuncia-se o encerramento de uma fábrica. Oportunidade para alguns ponderarem na possibilidade de arregaçarem as mangas e lançarem por diante um projeto de autogestão. O efeito é o de, em vez de concentrarem os seus agravos nos patrões, que os tinham conduzido a esse impasse, os operários digladiarem-se entre si, uns apostando na ousada possibilidade de agarrarem o futuro por si mesmos, os outros a dissuadirem-nos como se fossem quixotes a terçarem com irrelevantes moinhos.
Na mistura entre documentário e ficção, também aqui se representa o sentimento de impotência e de humilhação ou a dificuldade em entenderem-se quem tinham motivos de sobra para o fazerem e acabam desavindos. No fim ficam muito mais perguntas que as respostas, porque estas só proviriam da opção pelos artifícios do cinema militante e Pedro Pinho escusa-se voluntariamente a seguir por aí.
 

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