sábado, setembro 06, 2014

LITERATURA: a propósito do livro «Os Interessantes» de Meg Wolitzer

O tema de «Os Interessantes» de Meg Wolitzer - publicado em português pela Teorema - faz-me reencontrar os tempos do liceu de Almada, nos primeiros anos da década de 70, quando o padre Sobral nos fazia intuir o fim próximo do fascismo.
Ele próprio autor de ruturas drásticas - ai o ódio que as beatas de sacristia lhe devotavam! -  dava o corpo ao manifesto quando, de vez em quando o sabíamos em apertos junto da Pide.
Na altura, também nós nos sentíamos muito interessantes, sempre prontos para as tais conversas importantes, que significariam visões inovadoras para tudo quanto estava a ocorrer. Ouvíamos os Doors e Bob Dylan e devorávamos os livros do Wilhelm Reich sobre sexo e revolução. Aos sábados reuníamo-nos em roda no areal da Costa para compormos o ar mais sério possível e emitir as ingenuidades, que a idade justificava.
Quando, durante a semana, nos cruzávamos no pátio do barracão - era assim que tínhamos crismado aqueles pavilhões provisórios, que se tornaram definitivos durante tantos anos -  olhávamo-nos com a convicção de que, daí a não muitos anos, todos seríamos famosos no afã de transformarmos o mundo.
Ir à guerra era projeto, que não passava pelas nossas mentes. Pudera pois se às escondidas espalhávamos panfletos dos próprios movimentos de libertação!  Mas íamos ponderando nas alternativas possíveis, entre a emigração ou a marinha mercante.
Muitos anos depois, e a exemplo das personagens da escritora americana, também faríamos um balanço ao que viria a fazer a nossa geração. O que chegou mais longe foi quem pior se portou e reivindica-lo só nos pode encher de vergonha. Porque nunca esperaríamos que um dos nossos servisse de mordomo a bush, a blair e a aznar e fosse depois premiado com tão lamentável sinecura. Houve uns quantos que se dedicaram à música, um deles com carreira meritória nos gaiteiros alfacinhas. Mas, no geral todos os demais se anonimizaram nas suas azáfamas profissionais e afetivas.
Teriam sido aqueles os melhores anos das nossas vidas? Tal como Paul Nizan, nunca aceitaríamos que disso nos convencessem!


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