Bergmaniano militante nunca tive este «Mónica e o Desejo» na short list dos que mais me agradam na obra do realizador sueco. E, no entanto, nesta abordagem foi forçoso ficar fascinado pela qualidade estética da fotografia a preto-e-branco, que acompanha fielmente a evolução dos estados de alma por que vão passando os seus personagens.
Quando o realizou, em 1952, Bergman tinha 34 anos e estava a assinar o seu 12º filme. Era um encenador teatral reconhecido, mas a carreira cinematográfica andava a marcar passo com sucessivos fracassos comerciais, que lhe criavam angustias sobre a possibilidade dela se poder vir ou não a prolongar.
«Mónica e o Desejo» vai merecer-lhe um empenho criativo, que passa por uma história ousada, uma belíssima fotografia difícil de esquecer, sobretudo quando alia aos enquadramentos rigorosos as imagens dos céus nublados, dos lagos e das florestas, e a opção explícita pela nudez da atriz principal.
Para Bergman a estética deveria suscitar emoções no espectador, suscitando-lhe empatia com a evolução sentimental dos protagonistas, esse casal em fuga ao quotidiano para viver a perfeição do amor no breve espaço de um verão.
A história em si dá alguma razão a quem aponta a misoginia como um dos aspetos determinantes da obra bergmaniana: Harry e Monika encontram-se fortuitamente num café e começam a namorar. Nas confissões, que fazem um ao outro, comungam do desagrado pelos respetivos empregos, ele como ajudante numa vidraria e ela numa mercearia. E por isso sonham fugir dessa amarga rotina quotidiana.
Um dia, quando o pai chega a casa embriagado e lhe dá uma bofetada, a rapariga encontra o alibi necessário para libertar-se das correntes familiares, impelindo Harry para passarem algumas semanas em deambulação pelo arquipélago em torno de Estocolmo no barco do pai dele.
Na ilha de Orno vivem o sonho de liberdade, amando-se e nadando nas águas aquecidas pelo calor estival. Quando o dinheiro acaba já Monika está grávida e o regresso á cidade torna-se inevitável.
Casam e têm uma filha, mas a paixão já passou e as prosaicas vicissitudes do dia-a-dia impõem-lhes uma distância, que se cava como um abismo insuperável.
Entregando-se a outros homens Monika acabará por sair de casa deixando a filha aos cuidados de um Harry, que ganhou com a experiência um amadurecimento feito de sentido de responsabilidade.
Godard, que foi na época um dos maiores defensores do filme atribuía a Harriet Andersson numa das cenas derradeiras um dos mais tristes olhares da História do Cinema.
Mas, apesar do entusiasmo suscitado nos futuros cineastas da «Nouvelle Vague», «Mónica e o Desejo» suscitou não pouca polémica na altura com a abordagem explícita do desejo sexual. É que estava-se perante um filme de sensações, de tremores na pele, de empolamento da textura da carne, do movimento do peito com a respiração, do tempo que passa, do sol nos corpos e do vento a soprar.
É certo que não tardariam a surgir as obras admiráveis pelas quais Bergman se veria universalmente consagrado, mas «Mónica e o Desejo» já constitui um título, que não desmerece das razões justificativas desse sucesso.
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