segunda-feira, agosto 11, 2014

DOCUMENTÁRIO: «Viagem ao centro do tráfico de órgãos» de Ric Esther Bienstock

São muitos os doentes com disfuncionamento renal, que se viram para o mercado negro a fim de conseguirem-se fazer operar no estrangeiro. Foi o caso do canadiano Raul Fain, que gastou dezenas de milhares de dólares para conseguir a transplantação de um rim no Kosovo.
Apesar de ter conseguido salvar a vida, viu-se metido com uma das piores redes de traficantes de órgãos a nível mundial. Um cirurgião turco e um eminente nefrologista israelitas participavam nela sendo hoje procurados pela Interpol.
Os riscos de quem acorre a estas mafias não intimidam muitos dos candidatos decididos a receberem um órgão de cuja proveniência nem querem sequer  saber. Nas Filipinas, por exemplo, os «doadores voluntários» iludem a lei nacional sob o argumento de estarem a agir desinteressadamente muito embora se saiba o valor da compensação irrisória, que efetivamente recebem para remunerar a inevitável degradação física e mental subsequente a essa operação. Para muitos a venda desse rim permite-lhes ganhar algum dinheiro para iludirem a miséria onde vivem durante algum tempo. Muito embora arrisquem muitas complicações de saúde daí em diante.
A verdade é que não é difícil encontrar propostas de rins nas colunas de pequenos anúncios nos jornais de todos os países ocidentais.
O filme de Ric Esther Bienstock, datado de 2013, constitui um mergulho impressionante e muito bem documentado sobre esse tráfico internacional. A investigação dá a palavra a todos os atores desse comércio muito rentável entre o Norte e o Sul: desde os doentes ocidentais desesperados e os doadores de órgãos explorados devido à sua miséria aos cirurgiões já incriminados ou profissionais de motivações bastante ambíguas.
Quando o liberalismo cruza com a moral, as reflexões éticas são perturbadoras: até onde se poderá ir para salvar novas vidas?  Porque torna-se muito fácil arranjar alibis morais para justificar aquilo que não o é: os mafiosos julgam estar a cumprir uma tarefa meritória ao colocar em ligação alguém que tem o órgão pretendido e precisa de arranjar melhor sustento para si e para a família, e os endinheirados doentes internacionais decididos a quererem acreditar na bondade do seu contributo para que uma família miserável do Terceiro Mundo alcance um patamar de conforto de outra forma inalcançável.
Este tráfico mais não reflete do que uma ordem económica internacional onde tudo é mercadoria sujeita a ser negociada. Mesmo que, pelo meio surjam pruridos religiosos ou outros tipos de valores.
Vivemos tempos singulares onde tudo quanto de pior se poderia imaginar está a transformar-se num aceitável padrão de comportamento...



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