segunda-feira, agosto 13, 2018

(DIM) «O Quê» de Roman Polanski (1972)


Perante as primeiras cenas deste filme de Polanski confesso o meu desconcerto: não só desconhecia, que o realizador polaco rodara-o em 1972 numa mansão de Carlo Ponti na Riviera, como não esperava uma comédia soft porno, em que todos os motivos são aproveitados para que Sidne Rome ostente os seus atributos para gente estimável como Marcello Mastroianni ou Adriano Celentano.
Começa-se com uma violação quase consumada, quando Nancy, uma norte-americana a viajar à boleia por Itália, vê-se assediada por três energúmenos, dois dos quais no seu entusiasmo quase se sodomizam entre si. Escapando-lhes, mesmo sem resgatar a bagagem, faz-se acolher numa luxuosa vivenda à beira-mar, onde os hóspedes rivalizam em bizarria. Poderia ser uma situação bunuelliana, mas Polanski não arrisca ir tão longe na lógica disruptiva da estória, mesmo não tardando a apresentar-nos Mastroianni vestido com uma pele de tigre e a fazer-se açoitar por um chicote empunhado pela bela de serviço com alguma timidez.
Há um proxeneta reformado, um bigodaças excessivamente nervoso, um priapo capaz de sucessivas ejaculações na namorada, um casal de lésbicas a passearem-se nuas, mas ostentando enormes chapéus, um padre, e outros figurantes ocasionais. Pelos corredores, quase sempre meio-despida, Nancy vai fazendo figura de uma Alice caída num universo, que não sendo o das maravilhas, não deixa de, incessantemente, a surpreender, na elucidativa exibição dos principais delírios fantasmáticos dos machos latinos. Às tantas somos levados a crer que a frequência com que os personagens desses anos 70 se drogavam, contaminou o argumento de Gérard Brach que, ao contrário de Polanski, muito se deliciava com esta sua criação.
No clímax desta viagem singular - mesmo que cingida ao espaço da vivenda e suas adjacências - Nancy foge completamente nua, perseguida por todos os convidados do anfitrião, o velho Joseph Noblart a quem causara fatal apoplexia com a exibição dos seios e, sobretudo, da sua «origem do mundo».
Polanski aterrou neste projeto, quando a rodagem de »Macbeth» ficara a marcar passo, e antevia a possibilidade de ganhar algum dinheiro com uma coisinha ligeira e erótica. Jack Nicholson esteve quase a vir de além-Atlântico para participar, mas reservar-se-ia para o filme seguinte do realizador, esse «Chinatown» de bem mais grata memória. O resultado foi pífio, muito menos interessante do que «Por Favor Não me morda o Pescoço», em que o realizador já testara as competências na comédia.

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