terça-feira, agosto 07, 2018

(DIM) À descoberta de dois títulos de Steven Soderbergh


Desde «Sexo, Mentiras e Video», em 1989, tenho acompanhado grande parte da filmografia de Steven Soderbergh, porventura o realizador mais interessante de quantos habitam o mainstream cinematográfico norte-americano. No entanto, por circunstâncias várias, que não vêm ao caso, perdera a oportunidade de ver dois filmes da década transata, agora descobertos em poucos dias: «Solaris» (2002) e «Che» (2009).
Sobre o primeiro confirmo o que antevia: gosto tanto da versão realizada por Andrei Tarkovski em 1976, que nenhuma outra me poderia convencer. A de Soderbergh é um bom filme, trata com competência a capacidade do oceano do planeta exacerbar os complexos de culpa dos astronautas presentes na sua órbita, mas sem alcançar a dimensão de grande obra de arte atingida pela abordagem do realizador soviético. Ainda assim, quem quiser refletir sobre o que Soderbergh sugere, encontra muitos dos aspetos mais interessantes levantados pelo romance de Stanislas Lem, que lhe esteve na origem: o que somos? Uma projeção de nós mesmos ou aquela que outros criam ao entrarem no nosso círculo social ou afetivo? Como é que um oceano extraterrestre encontra a chave para abrir a porta dos nossos mais escondidos pensamentos? E o que se torna preferível: viver numa realidade dolorosa ou numa existência virtual porventura localizada dentro do nosso próprio cérebro?
Com «Che» a desilusão assume outra natureza, porque tem a ver com a expetativa frustrada de ver a gesta revolucionária cumprida entre a Sierra Maestra e Havana colorida num tom épico. Ora não gostei de ver parte significativa do filme gasta em combates confusos, muitas vezes deixando-nos à deriva entre quem pertence a um ou outro lado da contenda. Nesse sentido, mais do que um biopic, cumpre os preceitos do filme de guerra. Podemos considerar engenhosa a opção narrativa de alternar a evolução da guerra civil, que se saldaria com a vitória dos «barbudos», com a intervenção de Che nas Nações Unidas em dezembro de 1964 e as entrevistas por ele facultadas nesses dias a vários órgãos da comunicação social norte-americana, mas embora nada ponha em causa a sua grandeza, também nada lhe acrescenta. De qualquer forma Benicio del Toro, que também produziu o filme, teve nele o mais impressivo papel da sua carreira.
Num e noutro título, Soderbergh não terá encontrado o doseamento mais acertado entre o cinema de grande espetáculo, que foi obrigado a respeitar para cumprir as expetativas dos produtores, e a ambição artística de os tornar mais do que produto rapidamente consumido  e logo esquecido, como são quase todos quantos provém da indústria cinematográfica do outro lado do Atlântico. Foi pena, porque, quer noutros filmes, quer nas séries televisivas em que se vem empenhando, sabemo-lo capaz de bem melhor.

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