quinta-feira, dezembro 14, 2017

(EdH) Catalunha em vésperas de uma eleição decisiva (III)

A constituição de 1978 definia a transição democrática do pós-franquismo e recriava o estatuto de autonomia bem como a Generalitat da Catalunya, que Franco suprimira. A saúde, a educação, a polícia, a cultura e uma parte da fiscalidade passaram para as competências dessa instituição. O presidente da Generalitat passava a dirigir e coordenar as ações do governo catalão composto por um Conselho executivo, organizado em quinze departamentos investidos de poderes administrativos. Por seu lado o Parlamento catalão representava doravante o povo, legislando, controlando a atividade do Conselho, aprovando o orçamento e elegendo o presidente da Generalitat.
Desde então o estatuto da autonomia sempre foi debatido quanto à sua natureza, extensão e aplicação, relativamente a Madrid.
Barcelona, a sede do poder da Generalitat e de outras instituições públicas ou privadas (estruturas comunitárias, câmaras de comércio, organismos profissionais, etc.) desempenhou um papel primordial nas lutas pela conquista da autonomia regional. No contencioso com o Estado central persiste o sentimento de ser-se subalternizado em relação a outras regiões periféricas mais pobres. Os Catalães consideram tratar-se de um constrangimento ao seu próprio desenvolvimento. No início do milénio a Catalunha contribuía com 20% para o orçamento espanhol e só recebia 12% dos investimentos públicos, que privilegiavam bem mais a região de Madrid, o País Basco e a Navarra. Daí o desejo catalão de alargar as competências regionais para tudo quanto tinha a ver com as grandes superestruturas  (aeroportos, portos) e recuperar as receitas fiscais até então colectadas a partir de Madrid. 
No debate em causa não têm faltado as comparações entre a riqueza da região, o dinamismo, o potencial para servir de motor à economia europeia. Os discursos políticos passaram a incorporar mais frequentemente conceitos como os de «nação catalã», que fundamentariam a crescente aspiração á independência. A posição geográfica da Catalunha  e o seu poder económico permitem-lhe associar-se a outras regiões europeias, que se reivindicam como as mais dinâmicas do continente: a Lombardia italiana, a Rhône-Alpes francesa e o Bade-Wurtemberg alemão.
O novo texto estatutário aprovado pelo parlamento catalão foi alterado em Madrid, que só permitiu a palavra «nação» no seu preambulo a pretexto de respeitar a Constituição de 1978 no que ela refere a “unidade indissolúvel da nação espanhola”. O alargamento das competências fiscais e administrativas só foi aceite em parte, pois metade das receitas obtidas dos impostos sobre rendimentos e o consumo continuaram a ficar retidos pelas autoridades madrilenas.
O referendo de 2006 ainda revelava uma Catalunha pouco mobilizada para as aspirações dos seus mais arreigados independentistas: só 48% dos eleitores acedeu a ir às urnas. Mas o Partido Popular já se revelava tão rigidamente antagonista da mais dilatada autonomia catalã, que Rajoy apenas lhe vai mantendo a inflexibilidade, mesmo perante condições que vão a contracorrente da sua conceção de Espanha. Amiúde vêm dos setores mais aparentados ao franquismo o agitar dos fantasmas da guerra civil dos anos 30.
Independentemente do que acontecer no escrutínio eleitoral de 21 de dezembro, pouco se definirá  quanto ao essencial: o respeito mútuo entre a mentalidade catalã e a enfeudada ao centralismo castelhano. A luta por uma Catalunha livre e independente ainda promete muitas batalhas até à vitória final... 

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