sábado, março 16, 2019

(DIM) A inigualável personalidade de Marceline Loridan-Ivens


Notável personalidade a de Marceline Loridan-Ivens, que viveu muitas vidas, mas não mais pôde esquecer uma das primeiras, aquela que a converteu numa das raras sobreviventes dos campos de extermínio. Mesmo partilhando depois, com Joris Ivens, grandes epopeias da luta anti-imperialista!
Marceline Loridan-Ivens morreu há seis meses, em 18 de setembro de 2018 e, desde então, temos acedido a algumas homenagens na forma de entrevistas ou documentários destinados a abordarem a sua vida extraordinária. Semanas depois da Cinemateca nos ter propiciado um filme rodado no derradeiro ano da sua existência, vimos agora «La Vie Balagan de Marceline Loridan-Ivans» de Yves Jeuland, reproduzindo uma cerimónia pública de homenagem ocorrida há cinco anos no Forum des Images, em Paris. O próprio realizador entrevista-a num registo empático, dando-lhe espaço bastante para as expressões bem humoradas, mas também para explicitar-lhe o temperamento abrasador.
Jeuland socorre-se do livro homónimo por ela publicado em 2008, cujo título já muito a definia, pois «balagan» em hebreu significa «confuso». Começava com o nascimento em 1928, quando, provenientes da Polónia, os pais haviam julgado ser Paris a capital de um país culto e tolerante. Afinal a Ocupação nazi forçara-os a uma fuga para a zona livre, que também ela lhes não garantiria a desejada salvação.
Capturada com o pai em 1944 foi enviada para Auschwitz-Birkenau, embora a desumanidade nazi se lhe revelasse em Bobigny, quando se vira empurrada para dentro de uma carruagem onde as condições mínimas de sobrevivência estavam muito condicionadas. Tantos anos depois ela ainda se espanta como foi possível canalizar para a morte tatos milhares de pessoas sem que elas se revoltasse. Porque o que se seguiu foi o horror indescritível de viver quotidianamente no fio da navalha, umas vezes desejando morrer, noutras recuperando a genica necessária para lutar pela sobrevivência.
À medida que a conversa progride explicita-se a forte personalidade de Marceline, que se revela ímpar na forte personalidade, no humanismo, na paixão, na irreverência e na indignação. Nomeadamente com essa França pós-Segunda Guerra Mundial, que veio encontrar decidida a esquecer o quão pouco fizera para evitar o Holocausto e, comprometida, impunha que tudo se esquecesse.
Marceline irá partilhar a sua incomparável verve com Joris Ivens vivendo com ele intensas experiências na China, no Vietname e noutros teatros de guerra antiimperialista de cujos combatentes, ambos se fizeram arautos. Desse labor resultaram dezoito filmes, que continuam a ser de visão obrigatória, nomeadamente a «História do Vento» belíssima despedida do cineasta holandês, que através dele nos legou o seu testamento. Já viúva, Marceline regressaria a Birkenau para, através de Anouk Aimée convertida no seu alter ego, manter presente um período da sua vida, que a marcaria para todo o sempre...


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