sábado, dezembro 01, 2018

(DIM) «Porto» de Gabe Klinger (2016)


Não é pelo triângulo amoroso, que constitui a trama do filme de Gabe Klinger, que ele merece atenção. O motivo principal estará no facto de constituir a visão da cidade segundo os olhos de um realizador estrangeiro, mesmo sendo Gabe Klinger luso-americano e fluente no português. Esse testemunho de um espaço, que tem sido muito desigualmente tratado pelo cinema em comparação com os benefícios colhidos pela capital, torna-se ainda mais curioso, porque o realizador tanto optou por mostrá-lo em 35 mm, em 16 mm, e no cada vez mais glamouroso Super 8. Merece, igualmente, elogio o facto de não se tratar de um Porto turístico o que nos é dado a ver, mesmo sendo ele sugerido em plano de fundo. Reconhece-se aquilo que Durrell designou como o espírito do lugar, que o torna genuíno, único na sua identidade.
«Porto» satisfaz, igualmente, a curiosidade mórbida quanto ao desempenho de um ator já falecido quando o filme foi estreado. Morrendo num estúpido acidente na sua casa de Los Angeles, Anton Yelchin associa-se aos nomes célebres desaparecidos na barra fatídica dos 27 anos (Jim Morrison, Janis Joplin, Jimi Hendrix, Amy Winehouse), quando estava em tal ascensão que, depois de associar o nome a obras de Spielberg ou Jarmusch, tinha sete filmes por estrear, quando morreu. Ademais, e apesar de interpretar papéis relevantes nos filmes mais recentes da saga «Startrek», costumava identificar Tarkovski como o seu realizador de referência e o Porto como cidade que muito apreciara enquanto estivera na rodagem deste filme.
A narrativa conta-se em três capítulos: no primeiro ficamos a saber como Jake se apaixonara por Mati ao passar com ela uma noite memorável e inesgotável nos prazeres partilhados. Razão para a procurar por toda a cidade, mesmo anos depois de ela lhe ter desaparecido, obsessivo na esperança de um recomeço. No segundo percebemos como Mati, apesar de a ele se ter oferecido na plenitude, não pode evitar o casamento, mesmo que com fim mais do que anunciado, com o professor, que a fizera vir de Paris para o Departamento de Arqueologia da Universidade do Porto. E, finalmente, no terceiro, temos uma versão mais cor-de-rosa, em que Jake e Mati nunca se chegam a separar.
Pelo meio surge-nos uma sequência francesa para reencontrarmos Françoise Lebrun, que nos passara, entretanto despercebida desde que fora o rosto emblemático de «Le Maman et la Putain» de Jean Eustache em 1973. Dispensável no contexto do que se quer revelar, pode-se questionar se Klinger - ou Jarmusch, seu produtor - não quiseram evocar um filme inspirador dos seus propósitos dando à velha atriz a condição de mãe da protagonista...
«Porto» sugere, pois, muito mais do que nele captamos. A ambição tenderia a querer que ele alcançasse níveis de leitura, que não lhe acabamos por reconhecer. Talvez porque o que Klinger quereria abordar dificilmente se possa traduzir em imagens ou palavras por se conotar com o que de indizível tem o Amor.

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