Em japonês Kodo significa batimento do coração. Aquele que a criança ouve no ventre da mãe. Mas também significa batimento do tambor.
Sadogashima, ou ilha de Sado, é conhecida por ter funcionado durante séculos como lugar de exílio de samurais ou de homens letrados, que não estavam nas boas graças de quem detinha o poder.
Foi aí que, em 1970, um casal de intelectuais fartos da decadente Tóquio, se fixaram para criar uma escola apostada em revigorar as tradições nipónicas. Foi dela que se veio a assegurar o ressurgimento da arte do Kodo.
Todos os anos, quando acaba o Inverno, uma dezena de rapazes e de raparigas são admitidos como aprendizes nessa academia, que possui uma disciplina algo militar ou monacal. Tão só aí instalados os recém-chegados iniciam a exigente formação, que inclui uma corrida diária de dez quilómetros pelas veredas da montanha ainda cobertas de neve e a instrução facultada pelos colegas do 2º ano.
Esses aprendizes vêm de todo o Japão e sujeitam-se a regras espartanas, quer tragam já conhecimentos da arte, quer se disponham a praticá-la pela primeira vez.
A formação tem muito de exercícios físicos e de dança e baseia-se na imitação do que fazem os mais velhos, já que o Kodo é, sobretudo, uma cultura, uma filosofia. Por isso mesmo o quotidiano dos aprendizes também inclui as tarefas da cozinha, da limpeza das instalações e até do fabrico dos paus com que farão os exercícios de percussão.
Há igualmente a ligação aos aldeãos da região: maioritariamente idosos, eles constituem um notável repositório de ideias, que serão utilizadas no reportório. Tanto mais que, para esses anciãos, esses jovens acabam por ser aceites como se fossem os próprios netos.
Ligada à escola funciona a Companhia, que anda em quase permanentes tournées um pouco por todo o mundo. Shogo Yoshii, que a integra, considera que o objetivo não é só interpretar música, mas transmitir energia, estabelecer laços entre os que a ouvem e ficam sugestionados pelas vibrações libertadas pelos tambores.
Há quem considere o som dos tambores de Kodo como paliativos eficazes contra as depressões por gerarem uma certa alegria em viver.
Há muitos anos que Tamasaburo Bando, lenda viva do teatro kabuki, assegura a direção artística da companhia depois de com ela já ter trabalhado anteriormente. Com o profundo conhecimento da estrutura daquelas peças, que costumam durar várias horas, ele procurou adotá-las à curta duração de cada tema de kodo.
Mas a maneira de interpretar cada composição depende muito da personalidade de cada instrumentista: há os que são mais subtis e delicados, mas também se encontram os que denunciam alguma rudeza.
(texto baseado no documentário de Don Kent e Christian Dumais Lvowski «Kodo - Os Tambores do Diabo», de 2012)
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