sábado, dezembro 17, 2011

Livro: «CAMINHAR NO GELO» de WERNER HERZOG

A ideia inicial era aliciante: sabendo que a grande mentora espiritual do novo cinema alemão, Lotte Eisner, adoecera gravemente em Paris, o realizador Werner Herzog compromete-se com uma penitência singular: ir a pé da Alemanha até à capital francesa, esperando por essa via contribuir para a recuperação da amiga.
Ao ler este pressuposto fiquei entusiasmado com o livro de Herzog, tanto mais que dele colhera memoráveis satisfações cinematográficas em títulos como «Aguirre, o Aventureiro» ou «Fitzcarraldo». Esperava, por isso, um relato vibrante, com muita filosofia à mistura e uma recheada sucessão de episódios, se não pícaros, pelo menos pitorescos.
No entanto devo reconhecer que, no final, foi grande a desilusão. Primeiro porque o relato dos dias da sua caminhada lembram o conceito da escrita automática dos surrealistas, que tem o condão de surpreender de início, mas depressa cansa. Depois, porque nada de relevante acontece nos dias de Herzog, a não ser a sucessão de temporais, de assaltos a casas aonde vai pernoitando ou o contacto episódico com pessoas inquietas com o seu ar de vagabundo.
Se a viagem representa uma oportunidade de transformação interior, isso não parece acontecer com Herzog: em quem nada terá mudado nas semanas em que andara a caminhar no gelo.
Vale-lhe, no final, a satisfação de ver Lotte recuperada, quando a visita em Paris, ficando implícito o sucesso do seu esforço, que nenhuma racionalidade poderia explicar. Mas nunca encontraremos uma explicação consistente da importância da especialista em expressionismo alemão na concepção criativa da geração, que com ela se identifica. E essa até nem seria uma questão descabida para ser reflectida por Herzog no seu percurso: o porquê de a considerar tão determinante em tudo quanto fizera e pretenderia fazer a partir de então...

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