terça-feira, junho 07, 2016

DIÁRIO DE LEITURAS: À Descoberta de Salinger (2) - “Um dia perfeito para o Peixe-Banana”

Em 31 de janeiro de 1948 a «New Yorker» publicou este conto de um ex-soldado então com 28 anos, que, a exemplo do protagonista, viera dos teatros de guerra europeus profundamente afetado por quanto vira nas batalhas e nos campos de concentração.
O entusiasmo dos editores foi tal que, além de o publicaram de imediato, fizeram Salinger assinar o direito de preferência quanto ao que, a seguir, viesse a escrever.
Embora a história faça sentido no seu primeiro nível de leitura, muitos estudiosos elaboraram intrincadas teses quanto às suas ideias-força, e sobretudo sobre o final, tido como quase inexplicável.
No início conhecemos Muriel que passou todo o período da Segunda Guerra à espera do marido, Seymour, colocado na Alemanha, donde transitara para um hospital psiquiátrico. Agora que ele teve alta, o casal regressa ao hotel na Flórida onde se passara a lua-de-mel.
Pelo telefone a mãe da rapariga revela-se quase em pânico: um psiquiatra dissera-lhe que o genro poderia voltar a passar-se de um momento para o outro. E os dias vividos em Nova Iorque  assim o pareciam ter confirmado: Seymour tivera um acidente com o carro do sogro, uma conversa desconcertante com a avó e parecia alimentar uma obsessão inescrutável sobre as árvores.
O leitor fica prevenido: o imprevisível pode acontecer de um momento para o outro.
Muriel tenta sossega-la: nas duas noites anteriores ele passara-as a tocar piano no salão do hotel, depois dos dias estendido ao sol da praia, mesmo sem se atrever a dissociar-se do roupão.
Algo de trágico pode acontecer, quando o vemos em diálogo com Sybil, uma rapariguinha, que lhe deturpa o nome para “see more glass” e a quem ele conta a história dos peixes-bananas, tão gulosos, tão gulosos, que são capazes de comer setenta e duas peças de fruta, colhidas num buraco, donde não conseguem voltar a sair por terem, entretanto engordado em demasia.
Levando-a à água para ver se os encontram, tememos o seu eventual intuito de a afogar. Mas sentimos aliviar-se a tensão, quando isso não sucede. Mas, logo, repentinamente ele chega ao quarto de hotel, vê Muriel a descansar, empunha a pistola, aponta-lha à têmpora e dispara.
Temos, de qualquer forma, um testemunho literário sobre uma possível manifestação de stress pós-traumático.

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