sexta-feira, junho 03, 2016

DIÁRIO DAS IMAGENS EM MOVIMENTO: Os escritores e o Festival de Cannes

Porque o Festival de Cannes acabou de decorrer a «Magazine Littéraire» deste mês traz um saboroso dossiê em que diversos escritores abordam, sob a forma de testemunhos atuais ou dos diários pessoais, o que foram as suas experiências ao integrarem o júri incumbido de decidir sobre os prémios.
Orhan Pamuk, que participou no Festival de 2007, reflete sobre a estranheza que sentira ao longo de toda essa vivência, já que não conhecia ninguém e via-se obrigado a conviver com gente tão mediática quanto desconhecida em visionamentos de filmes e cocktails. Os únicos momentos de descontração aconteciam quando podia passear sozinho e, quase anonimamente, pelas ruas da urbe.
A cubana Zoe Valdès esteve no Festival de Cannes de 1998, quando ainda mal se tinha exilado na Europa, e andou todo o tempo a sentir-se uma simplória sem cheta. Algo que nunca deixou de o ser…
Jean Cocteau foi várias vezes presidente do júri entre 1953 e 1957, mas sempre a contragosto, sobretudo pelas pressões incómodas destinadas a favorecer este ou aquele filme em função, não do seu mérito, mas dos interesses políticos do momento. Por isso mesmo teve grandes dificuldades em garantir a Palma de Ouro ao «Salário do Medo» de Henri-Georges Clouzot, que os norte-americanos (então em plena época da «caça às bruxas») consideravam «comunista».
Mas, ainda não tendo chegado sequer a meio da leitura desse dossiê, o testemunho mais interessante até agora foi o de Georges Simenon, a quem coube a presidência do júri em 1960. As tentativas de manipulação dos prémios tomaram tais proporções  que o escritor teve de opor um vigoroso travão a todas elas. Mas, preferindo «La Dolce Vita» de Fellini a todas as demais obras a concurso, Simenon também concentrou o furor da crítica, que defendia «A Aventura» de Antonioni.
Foi graças a Henry Miller de quem se acabara de tornar amigo, que conseguiu desempatar o veredito do júri. Mas quando a atribuição da Palma de Ouro foi anunciada, a plateia reagiu com estridente pateada. Injusta, claro, ou não seja esse um dos títulos maiores na admirável filmografia do realizador italiano... 

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