quarta-feira, setembro 07, 2005

MARGARIDA GIL: «ADRIANA»


Há uma ilha lindíssima, marcada pelas suas origens vulcânicas. Escura nas suas pedras e verde, intensamente verde, nos seus campos aonde se pastoreiam vacas. Um Paraíso primitivo, pois. Mas onde um acontecimento trágico - a morte da esposa de D. Edmundo Bettencourt no parto da sua filha Adriana (Ana Moreira) - vai justificar uma ordem irrevogável: a proibição de qualquer fornicação entre os seus habitantes.
Para garantir o cumprimento dessa ordem existe um miúdo, Odorico, em perpétuo movimento, atirando pedras às janelas e às portas dos prevaricadores.
A ilha torna-se o espaço concentracionário de gente triste, ora resignada à sua servidão, ora tentada pela fuga para o outro lado do Atlântico. Sobretudo, quando se trata de rapazes na força da idade…
As consequências sentem-se, quando Adriana chega à idade casadoira: a população reduzira-se de forma tão drástica, que a única possibilidade de sobrevivência daquela cultura, será enviá-la para o continente, de forma a, aí, conceber um filho por métodos naturais e voltando à ilha com o esposo entretanto conquistado.
Mas a tarefa de Adriana revela-se impossível: logo à chegada a Lisboa, vê-se despojada de todos os haveres, incluindo o do nome, porquanto uma usurpadora far-se-á passar por ela na casa aristocrática para onde se deveria dirigir, acabando por casar com o respectivo herdeiro antecipando-se às expectativas do velho D. Edmundo.
Pelo contrário, os ambientes por onde, nas semanas seguintes, cirandará Adriana nada terão de aristocráticos.
Começa por lhe valer a velha Estela (Isabel Ruth), que a leva para sua casa, quando a encontra exausta ao fim de um dia de desesperada caminhada pelas ruas da capital. E, depois, Saturnino, o filho de Estela, que ganha a vida como travesti numa casa nocturna e alimenta uma admiração superlativa por Amália Rodrigues.
Através de Saturnino, Adriana irá conhecer David, um especialista em sexo tântrico, que nunca o demonstrará na sua hóspede, já que esta continua a aguardar pelos tais métodos naturais.
Quando, enfim, está convicta do fracasso da sua missão, resta a Adriana o regresso à sua ilha. Mas, aí, acontecera o inconcebível: uma mulher engravidara, pondo fim a uma maldição, que pareceria condenar toda a sua população.
Apesar da beleza da sua fotografia, há muitas incongruências no argumento em que a escritora Maria Velho da Costa participa.
Não viria daí mal ao mundo se a própria realização não parecesse errática, incapaz de assegurar um fluxo narrativo consistente.
Fica, então, a ideia de um projecto falhado pela distância a que o espectador logo se coloca pela dificuldade em compreender o sotaque açoriano e pela impossibilidade de garantir uma magia para a qual as paisagens e a própria história tenderiam a suscitar…

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