terça-feira, agosto 09, 2016

(L) Segredo e morte em Henry James

Na continuação de um conjunto de textos sobre um escritor de quem se cumpre este ano o centenário da morte, chegamos à abordagem daquele tipo de personagens das suas novelas e romances, que carregam consigo segredos demasiado pesados para se cingirem a si próprios, mas para as quais não encontram interlocutoras capazes de o compreenderem ou apaziguarem por muito que lhes dediquem o seu amor.
Esta contradição entre uma procura apaixonada e uma oferta inútil está no fulcro de um conjunto de associações (segredo, vício, confidência, recetáculo) que suscitam uma inquietação em quem a constata.
Se a mulher passa a partilhar esse segredo acaba por perder a vida como sucede em «A Fera na Selva» (1903).  Quase sempre a explicação do enigma não chega a ser encontrada, quer por se ter perdido envolta em chamas, quer por ter sido preservada pelo desaparecimento definitivo de quem a possuía.
A morte é um dos grandes temas desta obra elaborada de forma a afirmar mais valores para além dos da vida. A posse carnal, a dos objetos e do dinheiro, são incompatíveis com as das riquezas interiores. “Digo que as pessoas são ricas quando conseguem corresponder às necessidades da sua imaginação!”, escreve James.
Os que pretendam confundir os diversos planos, vivendo em simultâneo os da carne e os do espírito, acabam punidos como ocorre em «Os Espólios de Poynton» (1897), onde se cruzam dois mundos inconciliáveis: o da ligeireza do conforto com os das afinidades secretas baseadas no amor pelo belo.
Há uma contínua inversão dos valores, que ataca sempre a ação e os torna estultos: são os mortos que vivem como sucede na novela «Maud-Evelyn» (1900) ou  em «As Asas do Pombo» (1902). São os excluídos, os que assistem, os que estão doentes ou souberam renunciar quem, fracos na aparência, acabam por triunfar.
O restabelecimento do protagonista serve o propósito de uma vingança secreta contra os que dominam. Quem perde ganha neste mundo onde a carência é sinal de riqueza e o omisso e a ausência são indícios inquietantes de uma presença, em que a renúncia conduz ao conhecimento a exemplo do que sucedia com Emily Dickinson cuja divisa “dizer a verdade, mas de viés” poderia ser a de James.

Sem comentários: